A Câmara dos Deputados virou ringue de telecatch na madrugada desta quinta-feira (17) durante votação do projeto que flexibiliza licenciamento ambiental. A confusão começou quando Kim Kataguiri (União-SP) chamou Célia Xakriabá (PSOL-MG) de “cosplay de pavão”, enquanto a deputada indígena revidou chamando-o de “deputado estrangeiro e reborn”. O presidente Hugo Motta (Republicanos-PB) precisou chamar a polícia legislativa três vezes para “restabelecer a ordem” no plenário por volta das 2h30.
O episódio misturou elementos dignos de novela mexicana com questões sérias sobre racismo e violência política. A discussão escalou rapidamente de provocações verbais para empurra-empurra físico, evidenciando tensões profundas no Congresso.
Round 1: A guerra dos apelidos
A primeira rodada de provocações começou quando Xakriabá questionou o direito de Kataguiri falar sobre questões indígenas. Ela o classificou como “deputado estrangeiro e reborn”, referência à origem japonesa da família do parlamentar.
A resposta veio em forma de ataque ao cocar que a deputada usava. Kataguiri a chamou de “cosplay de pavão”, termo que une referência a fantasias japonesas com crítica ao ornamento indígena.
Round 2: Pavões e licenciamento ambiental
A situação ganhou contornos surreais quando Rodolfo Nogueira (PL-MS) perguntou sobre licenciamento ambiental para “abater pavões” cujas penas seriam usadas em cocares. A provocação misturou deboche com ignorância sobre cultura indígena.
Xakriabá explicou no microfone que usava cocar sagrado do povo fulni-ô e que pavões perdem penas naturalmente. A resposta técnica contrastou com o nível baixo das provocações recebidas.
Round 3: O empurra-empurra
Fora dos microfones, a discussão evoluiu para confronto físico com Xakriabá aos gritos. As imagens da TV Câmara capturaram o momento tenso do empurra-empurra no plenário.
O deputado Coronel Meira (PL-PE) alegou ter ferido a mão com caneta ao tentar conter a parlamentar. A versão dos fatos varia conforme o lado político dos envolvidos.
Solidariedade feminina
Deputadas da oposição prestaram solidariedade imediata a Xakriabá após sua saída do plenário. Erika Kokay (PT-DF) defendeu que a colega foi humilhada durante a discussão.
Taliria Petrone (PSOL-RJ) classificou o episódio como “violência política de gênero” e “ataque à ancestralidade”. As declarações evidenciam dimensão mais ampla do conflito.
Precedentes preocupantes
O episódio se soma a outras confusões recentes na Câmara. André Janones (Avante-MG) teve mandato suspenso por três meses após briga com Nikolas Ferreira (PL-MG).
Gilvan da Federal (PL-ES) também foi suspenso em maio por ofensas contra Gleisi Hoffmann (PT). O padrão revela escalada preocupante de violência política.
Racismo televisionado
Xakriabá denunciou “racismo televisionado” e prometeu tomar “medidas necessárias” contra os ataques. A fala destaca gravidade das provocações recebidas.
O uso de símbolos sagrados indígenas como alvo de deboche revela preconceito estrutural no Parlamento. A situação transcende disputa política e alcança questões identitárias fundamentais.
Hugo Motta e o controle da Casa
O presidente da Câmara lamentou a confusão e afirmou não concordar com violência. Motta enfrenta desafio crescente para manter ordem em ambiente cada vez mais polarizado.
A necessidade de chamar polícia legislativa três vezes em uma madrugada evidencia perda de controle sobre os trabalhos. O episódio questiona capacidade de liderança em momentos tensos.
O telecatch parlamentar brasileiro ganha novos capítulos a cada sessão. Entre provocações e empurrões, questões sérias como racismo e violência política se perdem no espetáculo circense que virou o Congresso Nacional.