O sistema prisional brasileiro vivenciou entre os dias 14 e 18 de julho uma experiência cultural inédita com a realização da primeira Mostra de Cinema e Direitos Humanos em unidades carcerárias. A iniciativa histórica levou arte, reflexão e dignidade para 54 estabelecimentos penais em todo território nacional, beneficiando aproximadamente cinco mil pessoas privadas de liberdade.
A coordenação ficou a cargo da Secretaria Nacional de Políticas Penais do Ministério da Justiça e Segurança Pública, com apoio fundamental do Conselho Nacional de Justiça através do programa Fazendo Justiça. Esta parceria estratégica demonstra comprometimento institucional com humanização do sistema carcerário brasileiro.
O evento integra a décima quarta edição da Mostra Cinema e Direitos Humanos, cujo tema central “Viver com dignidade é direito humano” ressoa especialmente no ambiente prisional. A programação incluiu exibição de curta-metragens, rodas de conversa e dinâmicas educativas focadas em cidadania e pensamento crítico.
Cultura como ferramenta de transformação social
A iniciativa alinha-se perfeitamente ao eixo 2 do plano Pena Justa, voltado para melhoria da ambiência, serviços e infraestrutura nas prisões brasileiras. Além disso, contribui significativamente para construção de um Plano Nacional de Cultura específico para o sistema prisional.
O coordenador do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas do CNJ, Luís Lanfredi, destacou importância transformadora da cultura. “A cultura é fundamental para a transformação do ser humano e do ambiente no qual ele se encontra”, explicou.
Esta transformação mostra-se particularmente necessária considerando que o sistema prisional brasileiro foi declarado em situação inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal. Lanfredi enfatizou que trazer cultura para unidades prisionais representa forma concreta de promover cidadania e reflexão crítica.
Remição de pena incentiva participação
Uma inovação importante foi a possibilidade de remição de pena para participantes ativos. Conforme Resolução CNJ 391/2021, atividades socioculturais podem ser reconhecidas como práticas sociais educativas não-escolares, garantindo benefícios concretos aos detentos.
Pessoas que cumpriram 12 horas de atividades durante a semana cultural conquistaram direito à remição de um dia de pena. Este incentivo estimulou participação engajada e demonstrou que cultura pode ser ferramenta efetiva de ressocialização.
A carga horária cultural pode ser acumulada com outras modalidades já reconhecidas, como trabalho e leitura. Esta flexibilidade permite que pessoas privadas de liberdade construam estratégias diversificadas para redução de suas penas através de atividades formativas.
Parcerias fortalecem humanização carcerária
A articulação entre CNJ, Senappen e tribunais estaduais foi fundamental para viabilizar a mostra em diferentes regiões. Cada unidade da federação adaptou a programação às suas realidades específicas, mantendo qualidade e objetivos educativos.
O programa utilizou metodologia participativa, estimulando diálogo entre participantes e facilitadores. As rodas de conversa permitiram reflexões profundas sobre temas como dignidade humana, direitos fundamentais e perspectivas de futuro.
Os curta-metragens selecionados abordaram questões relevantes para o público carcerário, incluindo temas como família, trabalho, educação e reintegração social. Esta curadoria cuidadosa garantiu que o conteúdo fosse ao mesmo tempo educativo e emocionalmente significativo.
Lanfredi concluiu que essas ferramentas culturais são importantes para preparar o retorno ao convívio social após cumprimento das penas. A experiência pioneira abre precedente para futuras edições e expansão de atividades culturais no sistema prisional brasileiro.