A Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC), órgão do MInistério Público Federal, emitiu nota técnica criticando projetos de lei que limitam o acesso de pessoas transexuais, travestis e de gênero diverso a banheiros e outros espaços. O documento, elaborado pelo Grupo de Trabalho “População LGBTQIA+: proteção de direitos”, aponta que as iniciativas promovem a segregação e a discriminação dessa população e violam princípios constitucionais como dignidade humana e igualdade e tratados internacionais, dos quais o Brasil é signatário.
Uma pesquisa, mencionada pelo documento, identificou que, somente no primeiro trimestre de 2023, havia 60 projetos de lei com potencial discriminatório contra pessoas trans em tramitação nas esferas federal, estadual e municipal. Os temas variam entre a proibição de linguagem neutra, a limitação de acesso a tratamentos médicos de transição para crianças e adolescentes, a exclusão de pessoas trans em esportes e a vedação à instalação de banheiros unissex.
Alerta
Segundo a PFDC, a proibição do uso de banheiros conforme a identidade de gênero acarreta graves consequências físicas e psicológicas. Isso porque, o medo de sofrer humilhações e violências faz com que muitas pessoas trans evitem frequentar banheiros públicos, o que, segundo estudos, pode resultar em problemas de saúde como infecções urinárias, doenças renais e impactos significativos à saúde mental.
A PFDC enfatiza que as pessoas trans têm o direito de serem tratadas conforme sua identidade de gênero, independentemente do sexo atribuído ao nascimento.
Associação indevida
A PFDC rebate o argumento de que as iniciativas visam proteger a integridade de crianças e adolescentes, bem como a defesa da privacidade de mulheres cisgênero. Uma das alegações dos projetos de lei é que a permissão para que as pessoas entrem nos banheiros com base em sua identidade de gênero e não no sexo de nascimento dá aos predadores sexuais a oportunidade de explorar as circunstâncias e cometer ‘voyeurismo’, estupro, assédio e violência sexual.
Para a Procuradoria, associar pessoas trans a riscos ou condutas criminosas é infundado e estigmatizante. “A transgeneridade não pode ser confundida com perversão ou doença. Pessoas trans vão ao banheiro por necessidade fisiológica, como qualquer outro cidadão”, afirmam o procurador federal dos Direitos do Cidadão, Nicolao Dino, e o coordenador do GT, Lucas Dias.
O entendimento é o de que presumir má-fé de pessoas trans viola diretamente os princípios da dignidade humana e da igualdade previstos na Constituição, que também determina como objetivos a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, que promova o bem de todos, sem qualquer forma de preconceito ou discriminação, de forma a garantir a igualdade.
A nota também destaca que a identidade de gênero é uma construção social e que o sexo biológico não deve ser o único parâmetro para definir o acesso a espaços públicos. “As pessoas trans têm o direito de serem tratadas conforme sua identidade de gênero, independentemente do sexo atribuído ao nascimento”, reforça o documento.
A nota ressalta, ainda, que a identidade de gênero é reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal e pela Corte Interamericana de Direitos Humanos como parte do direito à personalidade. Além disso, o próprio Ministério Público da União já garante o uso de banheiros conforme a identidade de gênero de cada pessoa.
*Com informações do MPF