Por Hylda Cavalcanti
Está sendo aguardado com muita expectativa por advogados, entidades sociais e famílias envolvidas, o julgamento marcado para esta quinta–feira (05/06) pelo Supremo Tribunal Federal (STF) sobre os aspectos civis do sequestro internacional de crianças. O tema tinha sido agendado para a última semana, mas terminou sendo adiado. E como o STF tem uma pauta que envolve, esta semana, a votação das bigtechs, corre o risco de ser adiada novamente.
Mas a pressão social começa a se movimentar para, ao menos, impedir que o julgamento fique para o segundo semestre. Isto porque a primeira ação sobre o caso foi ajuizada em 2009 e aguarda até hoje. Na prática, serão analisadas pelo STF duas ações que questionam dispositivos da Convenção da Haia sobre o tema. Os processos discutem se, em situações de suspeita de violência doméstica, o retorno automático da criança ao país de origem deve prevalecer sobre a proteção contra riscos físicos ou psíquicos.
Inconstitucionalidade
Em uma das Ações – a ADIn 7.686 — o PSOL questiona a constitucionalidade da obrigação de retorno imediato da criança ao país de origem quando houver fundadas suspeitas de violência doméstica. O partido político afirmou, no processo, que mesmo que a criança não tenha sido vítima direta, a permanência no Brasil deve ser considerada legítima diante de indícios de risco, sob pena de violação aos princípios da dignidade humana e proteção integral.
A segunda ação, a ADIn 4.245, ajuizada ao STF pelo partido DEM (atual União Brasil), a legenda contesta a ratificação da Convenção da Haia (decretos legislativo 79/99 e presidencial 3.413/00). E enfatiza que diversos artigos da norma internacional estariam em desacordo com a Constituição, por supostamente imporem o retorno automático das crianças ao país de origem sem considerar as particularidades de cada caso.
As duas ações têm como relator o presidente do STF, ministro Luís Roberto Barroso. Barroso chegou a marcar a primeira sessão sobre a matéria em maio do ano passado, para as sustentações orais, e o início do julgamento para 7 de agosto, quando a Lei Maria da Penha completou 18 anos. Só que duas semanas antes, o PSOL apresentou a segunda ação, adiando, assim, a análise do tema.
Violência doméstica
Para a advogada Janaína Albuquerque, coordenadora jurídica da Revibra — rede europeia de profissionais que oferece suporte e assistência para mulheres migrantes vítimas de violência doméstica e/ou discriminação — é justamente a questão da violência doméstica que fez esse debate ser reacendido. “A maioria dos casos hoje são de mulheres que subtraem as crianças para seus países de origem e a motivação mais frequente é violência doméstica”, explicou.
De acordo com muitos advogados que atuam na defesa de famílias envolvidas neste tipo de situação, normalmente elas envolvem mães migrantes que voltam para onde têm familiaridade, alguma facilidade de trabalho e amparo de uma rede de apoio. O problema é que cada país entende o que é violência de uma forma diferente.
Janaína é da opinião que o STF tem todos os elementos necessários para fazer essa readequação da interpretação da convenção. Segundo ela, “a lei brasileira já avançou muito no sentido de entender que a violência doméstica acaba afetando as crianças e que a violência doméstica é uma violência contra as crianças”, afirmou.
Em sua avaliação, a perspectiva para a decisão dos ministros é favorável, mas a discussão sobre as provas da violência doméstica é a mais sensível. “Provar uma violência cometida no exterior é extremamente difícil. Tanto porque não existem leis em todos os lugares como existe no Brasil, quanto porque essas mulheres sofrem muita discriminação. Elas não conseguem angariar provas, não conseguem fazer ocorrência, não conseguem medida protetiva e não montam um dossiê quando voltam ao Brasil”.
Subcomissão no Senado
Enquanto advogados, juristas, organizações da sociedade civil e familiares envolvidos aguardam com grande expectativa o julgamento pelo STF, no Senado Federal aguarda-se a instalação de uma subcomissão temporária que vai debater, no âmbito da Comissão de Direitos Humanos, os aspectos civis do Sequestro Internacional de Crianças.
O colegiado foi criado por requerimento (REQ 2/2025 – CDH) do senador Flávio Arns (PSB-PR). E tem como objetivo, tratar do tema. De acordo com o senador “existem diversos casos em que brasileiras residentes com suas famílias no exterior que passam por esse problema”.
“Ocorre que, considerando-se protegidas em solo nacional, essas mulheres que voltam para fugir da violência dos maridos e trazem os filhos menores, são surpreendidas com demandas judiciais promovidas pela Advocacia-Geral da União, atuando como substituta processual do agressor”, acrescentou o senador.
A composição do colegiado será de cinco titulares e cinco suplentes e já foi formalizada ao presidente do Senado, Davi Alcolumbre. Os titulares são, além de Flávio Arns, os senadores Damares Alves (Republicanos-DF), Ivete da Silveira (MDB-SC), Mara Gabrilli (PSD-SP) e Paulo Paim (PT-RS).