1. Regime de casamento ou união estável: regular ou tácita
No Direito Civil brasileiro, o regime de bens define como se dará a administração e a partilha do patrimônio durante e após a convivência. No casamento, esse regime é eleito no pacto antenupcial ou, na ausência dele, aplica-se o regime da comunhão parcial de bens, previsto no artigo 1.640 do Código Civil.
Na união estável, a lei prevê aplicação do mesmo regime supletivo (artigo 1.725 do Código Civil), podendo os companheiros firmarem contrato escrito para adotar outro. A união estável regular é aquela formalizada em escritura pública; já a tácita se comprova pela convivência pública, contínua e duradoura, com intenção de constituir família, mesmo sem registro formal.
2. Aquisição de bens
A aquisição de bens durante a relação conjugal ou convivencial dependerá do regime de bens:
Comunhão parcial: comunicam-se os bens adquiridos onerosamente durante a união, excluídos aqueles anteriores ao casamento/união ou recebidos por herança/doação com cláusula de incomunicabilidade.
Comunhão universal: todos os bens, presentes e futuros, se comunicam, salvo exceções legais.
Separação convencional: cada cônjuge mantém a propriedade exclusiva do que adquirir.
Participação final nos aquestos: cada um administra seus bens, mas, na dissolução, partilha-se o que foi adquirido de forma onerosa durante a relação.
No plano civil, a titularidade patrimonial tem reflexo direto na possibilidade de disposição do bem, no usufruto e na partilha.
3. Separação e partilha
A dissolução do vínculo, seja por divórcio, dissolução de união estável ou morte, exige a definição do patrimônio partilhável. Na comunhão parcial, por exemplo, a regra é a meação dos bens comuns, com divisão igualitária. Divergências sobre a origem do bem, seu valor e eventuais dívidas associadas são comuns e, muitas vezes, exigem perícia e prova documental robusta.
A partilha não se limita aos bens: inclui direitos, créditos, dívidas e até questões de uso e fruição de imóveis. É nesse momento que, por vezes, surgem conflitos que ultrapassam o âmbito civil e podem tangenciar a esfera criminal.
4. Inexistência de crimes patrimoniais entre cônjuges e filhos
O Código Penal, no artigo 181, inciso I, prevê a isenção de pena para crimes patrimoniais cometidos contra o cônjuge, na constância da sociedade conjugal, ou contra ascendente ou descendente, salvo nas hipóteses de violência doméstica ou familiar.
Esse dispositivo não retira a ilicitude do ato — o que significa que o comportamento continua a ser considerado crime — mas extingue a punibilidade, por razões de política criminal e preservação das relações familiares. O mesmo vale para certas hipóteses de parentesco, estendendo-se a filhos, netos e pais, dentro dos graus previstos.
Entretanto, há exceções importantes: se o crime envolver violência ou grave ameaça, ou for praticado com o rompimento da vida em comum já consolidado (por exemplo, após a separação de fato), a proteção penal não se aplica. Nessas situações, o autor poderá responder normalmente.
5. Intersecção entre o Direito Civil e o Direito Penal
A matéria patrimonial entre cônjuges e companheiros é regida, primariamente, pelas normas do Direito Civil, mas determinadas condutas podem repercutir no Direito Penal. Por exemplo:
Apropriação ou ocultação de bens durante a partilha pode gerar repercussões criminais se envolver terceiros prejudicados (herdeiros, credores).
Danos a bens comuns podem configurar ilícito civil e, em certos casos, crime, quando ultrapassadas as hipóteses de imunidade penal.
Essa intersecção exige do operador do direito atenção redobrada: um conflito patrimonial não pode ser automaticamente “criminalizado”, mas também não se deve ignorar quando há elementos que configuram efetivo crime contra o patrimônio.
6. Conclusão
Em síntese, compreender a relação patrimonial de cônjuges e companheiros exige olhar atento tanto ao regime de bens definido (ou presumido), quanto à legislação civil e penal que protege, organiza e, em alguns casos, limita a atuação jurídica nesse campo. O equilíbrio entre a preservação da autonomia privada, a proteção do patrimônio e a integridade das relações familiares é um desafio constante para o direito contemporâneo.
Rio de Janeiro, 12 de agosto de 2025.
ARAKEM FERREIRA JUNIOR
OAB/RJ 256.705