A juíza Mara Silda Nunes de Almeida, da 8ª Vara da Fazenda Pública do Distrito Federal, suspendeu os efeitos da decisão do Tribunal de Contas do Distrito Federal (TCDF) que autorizou o pagamento retroativo de gratificação aos conselheiros do órgão por “excesso de acervo e de função”. A medida tem impacto estimado em R$ 5,8 milhões para os cofres públicos.
O pagamento foi aprovado na última sessão administrativa do TCDF de 2024, em 11 de dezembro, faltando dois dias para o início do recesso no órgão, em votação que durou menos de um minuto.
A decisão da magistrada é provisória e tem validade até o julgamento definitivo da ação popular que questiona essa gratificação.
O valor de uma primeira parcela já foi pago aos conselheiros, mas novos repasses estão proibidos. No final do processo, dependendo do resultado do julgamento, pode ser determinada a devolução desse dinheiro.
Em sua decisão, a juíza afirmou que “não é possível permitir a realização dos pagamentos antes que haja julgamento de mérito sobre a validade ou não desses montantes”.
O pagamento está sendo questionado em uma ação popular movida pelos advogados Fábio Henrique de Carvalho Oliva e Elda Mariza Valim Fim. Eles defendem que o valor extra não poderia ter sido pago porque não há previsão legal específica para isso.
Em nota, o Tribunal informou que não foi oficialmente notificado sobre a decisão e que tem “compromisso com a legalidade e a transparência de seus atos”. O presidente do Tribunal, Márcio Michel, negou que exista irregularidade na medida e que os pagamentos onerem indevidamente os cofres públicos.
Em reservado, o argumento usado na Corte é de que a gratificação não é creditada como salário e por isso não está submetida ao limite previsto na lei. Os conselheiros do TCDF e procuradores do Ministério Público de Contas (MPC) têm salário de até R$44 mil, valor estipulado como teto constitucional.
Sem precedentes
A “gratificação por acumulação de acervo processual, procedimental ou administrativo” consiste num benefício específico para conselheiros que ocupam cargos administrativos, como presidente, vice-presidente, corregedor e ouvidor.
Quando o benefício foi criado, a previsão era que fossem concedidos até 10 dias de folga por mês aos conselheiros. Até que, em 2023, o TCDF aprovou uma resolução autorizando a conversão dos dias de descanso em dinheiro, até o limite mensal de um terço dos salários.
O Tribunal de Contas do Distrito Federal é composto por sete conselheiros. Como o pagamento foi retroativo, calculado desde 2018, cada conselheiro ganhou de uma vez valores que chegaram, em alguns casos, a R$1,2 milhão. A regra não existe em outros órgãos de controle, como magistrados e membros do Ministério Público
Conforme o ato do TCDF ao qual o HJur teve acesso, o conselheiro Inácio Magalhães foi o que recebeu o pagamento mais alto, de R$1,2 milhão. O procurador-geral do MPC Demóstenes Albuquerque recebeu R$1 milhão. A terceira melhor aquinhoada foi a conselheira Anilcéia Machado, que recebeu R$ 893.531,55.
Os demais integrantes do Tribunal contemplados são o procurador Marcos Felipe Pinheiro Lima (R$ 874.258,35), Paulo Tadeu (R$ 657.208,08); Márcio Michel (R$ 498.478,81); Manoel Andrade (R$ 360.842,25); Renato Rainha (R$ 259.652,90) e André Clemente (R$ 71.847,37).
Em outubro de 2023, uma resolução aprovada pelo Conselho Nacional de Justiça abriu espaço para que fossem implantadas nos tribunais regras vigentes para promotores e procuradores de Justiça, mas não este tipo de gratificação.
No caso do TCDF, o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) informou ser contra os pagamentos aos conselheiros. No parecer elaborado sobre o caso, o órgão informou que a medida “causou graves prejuízos ao patrimônio público”. Acrescentou que “em nenhum outro tribunal, o bônus foi retroativo”.