A presidente do Superior Tribunal Militar, ministra Maria Elizabeth Rocha, recebeu comitiva da Virada Feminina e defendeu a manutenção do Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero. O encontro discutiu temas relacionados à equidade de gênero e representatividade feminina no Judiciário, com foco na Resolução 492 do CNJ.
Ameaça legislativa aos protocolos
A ministra expressou preocupação com o Projeto de Decreto Legislativo 89/2023, que tramita no Congresso Nacional visando sustar efeitos da resolução. “É tão difícil os juristas adotarem protocolos e, no entanto, o Legislativo quer suspender. É lamentável”, afirmou a presidente do STM.
Maria Elizabeth Rocha destacou que o Poder Judiciário precisa se abrir à realidade da população diversificada. “O Poder Judiciário tem que falar para a sociedade, atender uma diversidade multifacetada para mostrar ao jurisdicionado um lado mais sensível”, declarou durante o encontro.
Livro sobre superação feminina
A presidente do movimento Virada Feminina Internacional, Marta Lívia Suplicy, entregou à ministra o livro “Virando Páginas: Um Grito de Superação e Conscientização contra a Violência Feminina”. A obra reúne relatos de mulheres que transformaram experiências traumáticas em histórias de superação.
O movimento reúne mais de 280 grupos espalhados pelo país, trabalhando há 14 anos no fortalecimento da participação feminina na sociedade brasileira. A deputada Greyce Elias destacou o trabalho da Procuradoria da Mulher na Câmara dos Deputados, ressaltando a luta contínua das mulheres por espaços de liderança.
O que é o PDL 89/2023?
O Projeto de Decreto Legislativo (PDL) nº 89/2023, apresentado pela deputada Chris Tonietto (PL/RJ) em março de 2023, busca sustar integralmente os efeitos da Resolução nº 492 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que estabeleceu diretrizes para adoção da perspectiva de gênero nos julgamentos em todo o Poder Judiciário brasileiro.
A Resolução 492/2023 do CNJ, publicada em 17 de março de 2023, institui a obrigatoriedade de capacitação de magistrados e magistradas em temas relacionados a direitos humanos, gênero, raça e etnia, além de criar comitês específicos para acompanhar e promover o julgamento com perspectiva de gênero no sistema judicial.
Os Argumentos da Deputada Chris Tonietto
Vício de Competência
A deputada fundamenta sua proposta em argumentos jurídicos formais, alegando que o CNJ usurpou competências constitucionais. Segundo a justificação do PDL, uma resolução constitui apenas um ato administrativo normativo, que só pode disciplinar matérias já previstas em lei, não podendo criar novas obrigações.
O texto cita o artigo 93, IV, da Constituição Federal, que estabelece que lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, deve dispor sobre o Estatuto da Magistratura, incluindo a previsão de cursos de preparação e aperfeiçoamento de magistrados.
Críticas à “Teoria de Gênero”
A deputada caracteriza a perspectiva de gênero como “produto ideológico”, referenciando o trabalho da filósofa Judith Butler. Segundo o documento, essa abordagem “substitui a realidade por uma motivação política” e não seria adequada para quem busca “promover, genuinamente, a Justiça e o Direito”.
O PDL argumenta que a Constituição Federal de 1988 não menciona a palavra “gênero”, tratando apenas da equidade entre os sexos masculino e feminino como objetivo fundamental da República.
Por que Gera Tanta Controvérsia?
Debate Jurídico sobre Competências
A controvérsia possui uma dimensão jurídica significativa, envolvendo o debate sobre os limites das competências dos diferentes poderes. A questão central é se o CNJ pode, através de resolução, criar obrigações de capacitação para magistrados sem previsão legal específica.
Tensões Ideológicas
O PDL 89/2023 insere-se em um contexto mais amplo de debates sobre questões de gênero no direito brasileiro. A proposta reflete posições conservadoras que veem com resistência iniciativas que buscam incorporar perspectivas de gênero nas instituições públicas.
Separação dos Poderes
A deputada invoca o princípio da separação dos poderes, argumentando que cabe ao Congresso Nacional “zelar pela preservação de sua competência legislativa em face da atribuição normativa dos outros Poderes”, conforme o artigo 49, XI, da Constituição.
Impacto na Magistratura
A implementação da perspectiva de gênero no Judiciário é vista por defensores como necessária para garantir julgamentos mais equitativos e sensíveis às questões de discriminação. Por outro lado, críticos argumentam que isso poderia representar uma forma de “ativismo judicial” ou imposição ideológica.