O procurador-geral da República, Paulo Gonet, manifestou-se parcialmente favorável à Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7686, que questiona uma norma da Convenção de Haia sobre o sequestro internacional de crianças, em julgamento no Supremo Tribunal Federal.
Autor da ação, o PSOL pede que, se houver suspeita de violência doméstica, o STF proíba a repatriação de crianças ao país de origem se elas forem trazidas ao Brasil pela mãe sem a autorização do pai. O argumento é que as exceções de não retorno da criança, previstas no tratado, também deveriam ser aplicadas quando o menor não for a vítima primária direta ou exposta ao perigo.
“Havendo elementos concretos, objetivos, que apontem para a essa realidade hostil, realidade agressiva para os interesses do menor, uma vez que a nossa Constituição exige atenção absoluta, prioritária para a criança, esse fato já seria cenário para uma objeção ao retorno”, afirmou.
Gonet citou como exemplo de indícios que poderiam configurar cenário prejudicial à criança no país de origem,o fato da mulher não poder fazer o registro da violência doméstica no país em que ela se encontrava.
O objeto da ação é a exceção contida no artigo 13 b do tratado internacional, que impede a devolução imediata de crianças transferidas irregularmente quando se provar que existe risco grave de, no retorno, ela ser submetida a perigos de ordem física ou psíquica, ou, de qualquer modo, ficar numa situação intolerável.
Luciene Cavalcante, advogada do PSOL, defendeu que, se houver suspeita de violência doméstica, o STF inclua o retorno dos menores nas regras de exceções do tratado e proíba a repatriação dessas crianças ao país de origem se elas forem trazidas ao Brasil pela mãe sem a autorização do pai.
“São mulheres em vulnerabilidade que possuem o direito de serem acolhidas e protegidas com os seus filhos”.
A advogada chegou a se emocionar na tribuna e fez um apelo aos ministros do Supremo.
“Clamamos por justiça e que a Convenção de Haia seja aplicada a partir dos princípios da nossa Constituição”.
Rodrigo Carmona, que representou a Advocacia – Geral da União, se manifestou pela interpretação conforme a Constituição. No entanto, afirmou que a AGU entende que a violência doméstica só se encaixa nas exceções de não retorno da criança ao país de origem, se for comprovada.
Ele alertou que, se o Brasil adotar a medida baseada apenas em suspeitas, corre o risco de ser exposto internacionalmente como não cumpridor da Convenção.
“ Se o Brasil seguir uma linha isolada correremos o risco de os países entenderem que não estamos cumprindo a Convenção. Se isso ocorrer, deixarão de aplicar a reciprocidade e deixarão de atender os nossos pedidos de cooperação”, afirmou.
A deputada Soraya Santos, representante da Câmara dos Deputados, discordou da AGU. Ela ressaltou que o tratado foi assinado há mais de 40 anos e precisa ser atualizado. E que o simples risco já é um agravante para impedir a repatriação da criança. Segundo ela, a forma como a Convenção está sendo interpretada tem sido algoz para as mães de Haia, que não deveriam ser tratadas como sequestradoras.
“A Constituição é clara, em qualquer conflito que o que se sobrepõe é a vida”.
Depois das sustentações orais, o julgamento foi suspenso e o início da votação ainda será marcado.