A recente eleição do Papa Leão XIV, membro da Ordem de Santo Agostinho, trouxe atenção especial para esta antiga ordem religiosa católica. Conheça a história, as características e a influência dos agostinianos na Igreja Católica e no mundo.
Origens e História
A Ordem de Santo Agostinho (em latim Ordo Sancti Augustini, OSA) é uma ordem religiosa católica de frades mendicantes que seguem a linha de pensamento de Santo Agostinho. Seus membros são denominados frades agostinianos ou simplesmente agostinhos, e podem ser tanto sacerdotes ordenados quanto religiosos não ordenados que fazem apenas os votos de profissão religiosa.
A formação oficial da ordem remonta a 16 de dezembro de 1243, quando o Papa Inocêncio IV emitiu a bula “Incumbit nobis”, convocando numerosas comunidades eremitas da Toscana a se unirem em uma só ordem religiosa. Estas comunidades seguiam a Regra e forma de vida determinadas por Santo Agostinho, bispo norte-africano que viveu entre 354 e 430 d.C. e é um dos mais influentes teólogos e filósofos da história da Igreja.
A consolidação definitiva da ordem ocorreu em março de 1256, em Roma. Por determinação do Papa Alexandre IV, delegados de diversos mosteiros eremitas – totalizando cerca de 360 membros – reuniram-se na igreja de Santa Maria del Popolo. Na presença do legado papal, cardeal Ricardo degli Annibaldi, os frades eremitas aceitaram formar uma única grande Ordem: a dos Eremitas de Santo Agostinho.
Neste momento histórico, os frades elegeram um prior-geral e formalizaram suas constituições. Um importante elemento desta unificação foi a determinação da Santa Sé para que os frades se transferissem dos ermos (locais isolados) para as cidades, onde poderiam construir seus conventos e catequizar a população através do exemplo, da pregação e do atendimento de confissões.
Carisma e Missão
O carisma agostiniano tem suas raízes no lema da ordem: “Uma só alma e um só coração para Deus”. Esta expressão reflete o ideal de vida comunitária proposto por Santo Agostinho, onde os membros buscam viver em profunda unidade e fraternidade.
Os agostinianos têm envolvimento especial com atividades de educação e assistência social. A ordem é mantenedora de diversas instituições educacionais em todo o mundo, com presença particularmente forte na América Latina. Os frades procuram viver unânimes, tendo um só coração e uma só alma para Deus, pois consideram a concórdia como a primeira finalidade da vida em comunidade.
Este foco na educação reflete a própria biografia de Santo Agostinho, que foi um brilhante professor de retórica antes de sua conversão ao cristianismo e posteriormente se tornou um dos mais importantes intelectuais da Igreja primitiva, autor de obras filosóficas e teológicas fundamentais como “Confissões” e “A Cidade de Deus”.
A Família Agostiniana
A família agostiniana é diversificada e se compõe de vários ramos, cada um com seu carisma específico:
- Agostinianos Eremitas (OESA): Originados das congregações de eremitas da Itália central, foram reunidos como frades mendicantes no século XII. Depois passaram a ser chamados Ordem de Santo Agostinho (OSA). Em Portugal, eram conhecidos como Ordem dos Gracianos, por terem sua sede no Convento da Graça, em Lisboa. Neste ramo destacaram-se figuras como São Nicolau Tolentino e, curiosamente, Martinho Lutero antes de sua ruptura com Roma.
- Religiosas Agostinianas: Também conhecidas como Ordem Segunda Agostiniana, representam o ramo feminino contemplativo. Entre suas figuras notáveis está Santa Rita de Cássia, popular santa italiana conhecida como “santa das causas impossíveis”.
- Cônegos Regulares de Santo Agostinho (CRSA): Religiosos que vivem em comunidade seguindo a regra agostiniana.
- Ordem dos Agostinianos Descalços: Surgida de uma reforma em 1592, buscava um retorno a uma observância mais estrita da regra.
- Cônegas de Santo Agostinho: Congregação feminina fundada em 1597.
- Congregação dos Agostinianos da Assunção: Fundada em 1845 pelo Padre Emmanuel d’Alzon, com a finalidade de restaurar o ensino superior segundo os princípios agostinianos, combater sociedades secretas e promover a unidade da Igreja.
- Oblatas da Assunção: Ramo feminino da congregação anterior, fundado pelo Padre d’Alzon e pela Madre Marie-Correnson.
- Ordem dos Agostinianos Recoletos (OAR): Outro ramo reformado da família agostiniana.
Contribuições e Influência
Os agostinianos têm exercido significativa influência na Igreja Católica ao longo dos séculos. A própria teologia agostiniana, que enfatiza temas como a graça divina, o pecado original e a predestinação, moldou profundamente o pensamento católico ocidental e influenciou também o protestantismo.
Além de sua contribuição intelectual e educacional, a ordem também se destacou na evangelização de diversas regiões, especialmente durante a expansão europeia nos séculos XV e XVI. Os agostinianos foram importantes na missão evangelizadora nas Américas, na Ásia e na África.
Na história do papado, antes do atual Papa Leão XIV, a Ordem de Santo Agostinho já havia contribuído com o Papa Adriano IV, que governou a Igreja de 4 de dezembro de 1154 a 1 de setembro de 1159, por um período de 4 anos e 271 dias.
Presença Feminina
A presença feminina na família agostiniana é tão antiga quanto contínua dentro da história do catolicismo. As freiras agostinianas vivem de acordo com a mesma Regra de Santo Agostinho, geralmente em mosteiros de clausura. Entre as religiosas agostinianas que se destacaram na história estão a compositora italiana Vittoria Aleotti, a mística italiana Santa Clara de Montefalco, a mística alemã Anna Catarina Emmerich e a já mencionada Santa Rita de Cássia.
O Papa Leão XIV e o Legado Agostiniano
O Papa Leão XIV, que iniciou seu pontificado em 8 de maio de 2025, é apenas o segundo agostiniano a ocupar a Cátedra de São Pedro. Sua eleição traz para o centro da Igreja o carisma agostiniano, com sua ênfase na vida comunitária, na busca da verdade através do estudo e da reflexão, e no serviço educacional.
O novo pontífice carrega consigo a rica tradição intelectual e espiritual da Ordem de Santo Agostinho, que ao longo de quase oito séculos tem formado gerações de religiosos dedicados à busca de Deus e ao serviço da Igreja.
A formação agostiniana, com seu equilíbrio entre vida contemplativa e ação pastoral, entre estudo e serviço, entre dimensão comunitária e busca pessoal de Deus, certamente influenciará o estilo de liderança e as prioridades do novo papa.
Ao assumir o nome de Leão, o novo pontífice evoca a memória de papas anteriores que levaram este nome, particularmente Leão I (o Grande) e Leão XIII, conhecido por sua doutrina social. A junção deste nome com a tradição agostiniana sugere um pontificado que poderá destacar-se tanto pela profundidade teológica quanto pela atenção às questões sociais.
O carisma educativo dos agostinianos também pode indicar uma ênfase renovada na formação intelectual e espiritual dentro da Igreja, bem como um possível foco no diálogo entre fé e razão, tema caro a Santo Agostinho e à tradição que dele deriva.
A Ordem de Santo Agostinho, com sua rica história e sua influência duradoura, oferece uma janela para compreender melhor o novo líder da Igreja Católica. O Papa Leão XIV, como filho espiritual de Santo Agostinho, traz consigo não apenas a tradição de uma das mais antigas ordens religiosas, mas também o legado de um dos mais brilhantes pensadores da história do cristianismo.