Vinícius Motta

Para Ti, e para nós. O violão de Vinicius Motta

Há 2 meses
Atualizado terça-feira, 4 de novembro de 2025

Por Jeffis Carvalho

Os primeiros acordes no violão solo nos transportam para um sentimento de que estamos a ouvir e compartilhar um momento de muita delicadeza. O ritmo é levado como uma toada que se insinua, de forma rápida,  como se nos convidasse a pegar um caminho ao mesmo tempo desconhecido e com muitas possibilidades de aconchego. Transcorrem menos de dois minutos e a música seguinte se assume, mesmo, com a delicadeza escancarada de um acalanto – e é. Apenas um minuto e meio e nos sentimos acariciados. São duas quase vinhetas que preparam a audição para acompanhar uma história de amor que logo se mostra por inteiro. Será um choro? Talvez uma cantilena? Quem sabe um samba-canção em forma de prelúdio…

A música que nos convida e surpreende é distribuída pelas oito faixas que compõem o álbum Para Ti, do violinista Vinicius Motta. É a trilha sonora de uma história de amor – o amoroso, o envolvente, o paterno e o fraterno.

O próprio Vinicius explica:

– “Quando terminei a Escola Municipal de Música no final do ano passado, após sete anos de formação, foi um ciclo muito longo se encerrando. Nesse mesmo período, estava noivo e prestes a me casar com a Nathaly. O álbum Para Ti surgiu desse encontro entre a provocação do meu professor Daniel Murray – que sempre me incentivava a desenvolver meu trabalho solo – e a inspiração profunda que o relacionamento com a Nathaly me trouxe.”

O resultado é música instrumental  de altíssima qualidade, feita com emoção, muita técnica, apuro e bastante dedicação. Música que canta e conta, sem dizer palavra. E diz tudo. E quando perguntamos a ele como foi esse processo ele nos diz num misto de timidez e brilho nos olhos:

– Comecei a compor de forma espontânea, ligado à minha formação em jazz e música improvisada. Improvisava temas que dedicava para a Nathaly, gravando trechos pequenos, sem pretensão de que virassem músicas de verdade. Mas teve uma música, por volta de março ou maio deste ano, que eu gostei tanto que pensei: ‘vou terminar isso aqui’. Foi quando gravei a primeira, ainda sem ideia de que seria um disco. Chamou-se Uma Pequena Música para um Grande Amor, inspirada na valsa Uma Valsa de Dois Amores, de Dilermando Reis, que sempre toquei para a Nathaly.

A partir dessa valsa, conta Vinicius, ele se viu cada vez mais motivado a compor. O relacionamento intenso com a sua amada continuou sendo a sua maior fonte de inspiração. Estava decidido: ele faria disso o processo para produzir um álbum. E logo as demais músicas que hoje compõem as outras sete faixas do trabalho foram se revelando e contando uma história – quase um poema sonoro, como os românticos Franz Liszt e Richard Strauss criaram no século XIX com a narrativa sinfônica.

A primeira música do álbum atua como um prelúdio, ou seja, o momento inicial dessa jornada sonora. Chama-se exatamente  Abertura (A Chegada). Como diz o compositor, funciona “como se fosse um overture operístico, anuncia que uma história vai começar. Representa a chegada desse amor na minha vida. É uma peça pequena, intimista, que convida o ouvinte a entrar nesse universo”.

Depois que ouvimos Uma Pequena Música para um Grande Amor, que foi a primeira a ser composta, surge uma convite para que entremos numa espécie de transe sonoro. É Um Mantra para Ela. Diz Vinicius, “como a Nathaly pratica yoga e a gente já fez muita meditação juntos, quis criar uma música que tivesse essa pegada de rito meditativo. Ela tem uma repetição, uma circularidade que remete aos mantras. É uma música para respirar junto, para estar presente no momento”.

O amor fraternal (e paternal) de Vinicius se revela em seguida. Para o Gael Ninar é muito especial para ele porque “vem de uma história da Nathaly com o Gael, filho dela, meu enteado. Ela me contou sobre uma melodia que cantava para ele quando era pequeno. Peguei esse pequeno trecho melódico que ela me mostrou e desenvolvi em variações. É de uma delicadeza imensa – muita gente disse que remete à viola caipira, àquele dedilhado tradicional brasileiro. É uma canção de ninar transformada em música de violão”.

Na sequência, temos dois interlúdios, que se caracterizam por separar ou marcar a passagem de uma cena a outra. O primeiro é Pés Descalços. O compositor conta que foi inspirado pela música de Pat Metheny, o grande guitarrista norte-americano. “É uma peça curtinha que serve como respiro, como ponte entre momentos. O título veio depois, quando fomos para San Andrés, na Colômbia, e ficávamos descalços na praia. É uma imagem sonora desse momento de leveza”

O outro interlúdio é Mar Azul. “Foi na lua de mel, no Caribe, vendo aquele mar azul infinito, que o nome se fechou. É uma peça que tenta capturar aquele azul, aquela imensidão tranquila do mar caribenho. Tem algo de contemplativo, de estar diante da natureza e se sentir pequeno e grato ao mesmo tempo”.

Duas Almas surgiu “muito espontaneamente no estúdio. É a única música do disco que tem letra – a Nathaly escreveu e até gravou cantando, mas optei por lançar só a versão instrumental. Foi nossa primeira parceria criativa juntos. A música fala sobre duas almas que se encontram, se completam. Harmonicamente, ela passeia bastante, tem uma riqueza de modulações que representa essa jornada de encontro”.

Primeiro Dia é a última música que Vinicius compôs para o álbum. Ele conta que ela festeja o aniversário de namoro. “É uma rapsódia – não tem repetições, vai se desenvolvendo através de várias seções (parte A, B, C) e vários caminhos harmônicos. Quis representar musicalmente o nosso primeiro dia juntos, que foi intenso – nos conhecemos no almoço, ela veio ver o projeto espetáculo, saímos para jantar, e foi emendando. Foram tipo 28 encontros em um só dia. A música reflete isso: é uma linha contínua que passa por vários lugares, vários climas, várias emoções”.

Da economia à música, uma trajetória entre acordes e partituras

Aos 35 anos, o paulistano Vinicius Motta representa uma história de determinação e paixão pela música brasileira. Economista formado pela PUC, ele trocou a estabilidade dos bancos pela vida de violonista profissional há quase dez anos, consolidando uma carreira que transita entre o repertório clássico, o choro e a música instrumental.

Os primeiros acordes

A formação musical de Vinicius começou no Numa (Núcleo de Música Aplicada), escola de bairro na Sumaré, sob orientação de Thiago Abdala e Beto Vasconcelos. Foi Abdala – hoje integrante do grupo Quaternáglia – quem forneceu as primeiras direções para uma formação estruturada.

O caminho seguiu pela Escola de Música e Tecnologia (MT), onde se formou em guitarra, estudando Jazz Fusion com Mozart Mello. Simultaneamente, cursou o Souza Lima, tendo aulas com nomes importantes da música instrumental paulistana como Lupa Santiago, Carlos Ezequiel, Ciro Visconti e Jorge Shy.

A virada definitiva veio em 2016. Após quase um ano morando na Inglaterra, onde tocou música brasileira em duo, Vinicius tomou a decisão de viver exclusivamente da música. “Foi a partir de 2016 que comecei a viver plenamente de música. Se não tivesse shows, as contas não seriam pagas”, relembra.

O violão como destino

Foi durante essa fase que o violão se tornou seu principal instrumento. Para se especializar, Vinicius ingressou na Escola Municipal de Música, o antigo Conservatório Dramático e Musical na Estação das Artes, fundado por Isaías Sávio. Lá, completou a formação de sete anos com Daniel Murray, período que definiu sua identidade artística.

Durante esses anos, participou da Camerata de Violões com Paulo Porto Alegre e integrou o Atelier Contemporâneo por dois anos com Thiago Gatti. Conquistou também uma bolsa do Instituto Goethe para estudar música contemporânea com David, percussionista do Ensemble Modern alemão. Teve ainda a oportunidade de cantar no Coro Jovem com Mayra Ferreira, atual regente do Coro Paulistano.

Corda e Platinela: o duo que nasceu nos corredores

Na Escola Municipal, Vinicius conheceu a percussionista Beatriz Schmidt. Juntos, criaram o duo Corda e Platinela, inspirados pelo repertório brasileiro – especialmente compositores do movimento armorial como Antônio Madureira – e pelo disco “Baden à Vontade”, de Baden Powell.

Vivendo de música

Hoje, atua como professor de violão na Fábrica de Cultura do Jaçanã, em São Paulo, desde 2020. Mantém um trio voltado para eventos e apresentações em bares, desenvolve trabalhos criativos solo e compõe trilhas sonoras para teatro. São praticamente dez anos dedicados exclusivamente à arte. “É uma conquista, uma vitória poder viver daquilo que amo sem fazer concessões”, celebra.

Para ouvir o álbum Para Ti acesse:

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