Primeira Turma recebe integralmente acusação contra militares e policiais suspeitos de disseminar desinformação sobre as urnas eletrônicas
A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) recebeu por unanimidade nesta terça-feira (6) a denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) contra os sete integrantes do chamado “Núcleo 4” da trama golpista.Os cinco ministros integrantes da turma votaram para tornar os acusados réus pelos crimes de tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, tentativa de golpe de Estado, organização criminosa armada, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado.
O julgamento da admissibilidade das denúncias foi dividido em duas sessões. Pela manhã, os advogados de defesa apresentaram suas alegações preliminares e sustentações orais. À tarde, os ministros votaram pelo recebimento da acusação.
A decisão da Primeira Turma representa mais um avanço nas investigações sobre a tentativa de golpe após as eleições de 2022. Com o resultado, os acusados passam à condição de réus no processo e responderão a uma ação penal no STF.
Sessão matutina: defesas contestam acusações
Pela primeira vez desde o início dos julgamentos relacionados à trama golpista, o Procurador-Geral da República, Paulo Gonet, não participou pessoalmente da sessão. Ele foi representado pela subprocuradora Cláudia Sampaio Marques.
As sustentações orais começaram às 10h15 com a defensora pública federal Érica Hartman, que representou Ailton de Moraes Barros. Ela argumentou que seu assistido fez apenas um único post nas redes sociais, que teria sido irrelevante para os eventos de 8 de janeiro.
Representando Angelo Martins Denicoli, o advogado Zoser Hardman de Araújo questionou o indiciamento, alegando que o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, que teria encomendado o estudo sobre supostas fraudes nas urnas, não foi denunciado.
O advogado Melilo Diniz do Nascimento, que defendeu Carlos Cesar Moretzsohn Rocha, presidente do Instituto Voto Legal, argumentou que seu cliente apenas dizia por telefone que o relatório sobre as urnas era relevante, e que mais informações deveriam ser obtidas junto ao PL.
A advogada Juliana Malafaia representou o subtenente Giancarlo Gomes Rodrigues, alegando que a relação dele com o agente da Polícia Federal Marcelo Bormevet era apenas profissional, e não conspiratória.
Leonardo Avelar fez a sustentação mais breve, em defesa do tenente-coronel Guilherme Marques Almeida. O advogado Hassan Magid de Castro defendeu Marcelo Bormevet, enquanto Thiago Ferreira da Silva, único advogado negro a participar das sustentações orais em todo o processo, representou o coronel Reginaldo Vieira de Abreu.
Às 12h15, o ministro Alexandre de Moraes rebateu, pela terceira vez, o argumento de que havia excesso acusatório contra os denunciados. Segundo ele, o que houve foi “excesso de fatos” e “excesso de documentos”. Em seguida, os ministros votaram para rejeitar todas as preliminares levantadas pelas defesas, como nulidade das delações, suspeição de ministro e excesso acusatório.
Sessão vespertina: votos dos ministros
A sessão foi retomada às 14h40, com o ministro Alexandre de Moraes iniciando a apresentação de seu voto. “Há indícios razoáveis de autoria para dar início à ação penal”, afirmou o relator, que então começou a detalhar as provas contra cada um dos acusados.
Durante a exposição, um momento inusitado ocorreu quando a apresentação de PowerPoint falhou. O ministro brincou: “Perdeu-se na desinformação”.
Moraes destacou que Carlos Moretzsohn Rocha teria elaborado, a pedido do PL, um relatório “totalmente falso” alegando supostas falhas nas urnas eletrônicas. Esse documento, segundo o relator, foi utilizado pelo partido para propor uma ação na Justiça Eleitoral pedindo o cancelamento dos votos em urnas onde Bolsonaro estava em desvantagem.
Sobre Giancarlo Gomes Rodrigues, o ministro afirmou que ele era responsável pela chamada “ABIN Paralela” e pelo monitoramento de autoridades de interesse da organização criminosa golpista.
Ao tratar do coronel Guilherme Marques de Almeida, Moraes citou áudios em que o militar teria dito que “os vídeos da fraude nas urnas foram bons porque mantêm o povo mobilizado” e sugerido “sair das quatro linhas da Constituição” para viabilizar a permanência do governo anterior.
Quanto a Marcelo Bormevet, o relator afirmou que ele orientava Giancarlo Rodrigues sobre quais informações deveriam ser levantadas e como construir ataques às autoridades. Por ordem dele, teria sido utilizado o software espião First Mile para monitorar autoridades, incluindo o próprio Alexandre de Moraes.
Por fim, sobre o coronel Reginaldo Vieira de Abreu, o ministro destacou que ele teria contribuído para manipular o relatório das Forças Armadas sobre as eleições de 2022 e insuflado o sentimento de insatisfação nos manifestantes. Abreu também é investigado na operação Contragolpe por supostamente integrar grupo que planejava sequestrar autoridades.
O ministro Flávio Dino, o mais novo integrante do STF, foi o primeiro a votar após o relator, acompanhando integralmente seu voto. Em seguida, o ministro Luiz Fux iniciou seu voto dizendo-se “perplexo com os elementos apresentados contra os denunciados” e, para surpresa de muitos, também acompanhou Moraes integralmente.
Com os três votos favoráveis, a Primeira Turma formou maioria para aceitar a denúncia, transformando os sete integrantes do Núcleo 4 em réus no processo que investiga a tentativa de golpe de Estado após as eleições de 2022.
A Ministra Carmen Lúcia afirma]ou que estamos no limiar de uma transformação da democracia representativa em democracia “apresentativa”, dada a importância da vida virtual para os cidadãos.
Último a votar, o presidente da Primeira Turma do STF, Cristiano Zanin, recebe a denúncia conforme o relatório de Alexandre de Moraes. “A turma, por unanimidade, verificou estarem presentes os requisitos exigidos (…) pelo Código de Processo Penal e recebeu integralmente a denúncia” da Procuradoria Geral da República.
Após cancelar a agenda marcada para amanhã, quando poderia haver a continuação do julgamento da admissibiidade, Zanin encerrou a sessão. Agora, número de réus chega a 21.