Provas obtidas pela revista VEJA revelam que o tenente-coronel Mauro Cid mentiu ao Supremo Tribunal Federal durante interrogatório sobre o uso de redes sociais. O ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro negou ter utilizado Instagram para conversar sobre sua delação premiada, mas mensagens comprovam o contrário.
Durante audiência no STF, Cid foi questionado pelo advogado Celso Vilardi se havia usado perfil no Instagram para falar sobre delação. O delator negou categoricamente, mas documentos mostram que ele utilizou o perfil @gabrielar702 entre janeiro e março de 2024.
As conversas revelam violação do acordo de colaboração premiada homologado por Alexandre de Moraes. Cid estava proibido de se comunicar com investigados e falar sobre o conteúdo de sua delação, mas descumpriu ambas determinações.
Críticas a ministros do STF
Nas mensagens, Cid faz críticas diretas a Alexandre de Moraes, chamando-o de “cão de ataque”. Segundo o delator, o ministro “já tem a sentença pronta” para condenar Bolsonaro, Augusto Heleno e Walter Braga Netto.
O tenente-coronel também afirmou que Moraes “tem talento” apenas para ser um “grande pensador Netflix” e que “não precisa de prova, só de narrativas”. Além disso, queixou-se de pressões durante os depoimentos à Polícia Federal.
Cid revelou detalhes dos bastidores das investigações, contando que foram “três dias seguidos” de oitivas. Disse ainda que os investigadores “toda hora queriam jogar para o lado do golpe”.
Consequências para o acordo de delação
A mentira ao STF pode resultar na anulação do acordo de colaboração premiada de Cid. Se isso acontecer, ele voltará a responder pelos mesmos crimes dos demais réus, podendo pegar até 40 anos de prisão.
O delator havia pedido perdão judicial ou condenação não superior a dois anos. Como já cumpriu cinco meses de prisão preventiva e dois anos com tornozeleira eletrônica, estaria livre da cadeia.
Os benefícios da delação se estendem ao pai, general Lourena Cid, à esposa e à filha. Todos teriam direito à proteção da Polícia Federal após o processo.
Impacto nas investigações
Gustavo Sampaio, professor de direito constitucional da UFF, explicou que “se a colaboração cair, isso vai ensejar o enfraquecimento geral do conjunto probatório”. A delação de Cid foi fundamental para a denúncia contra o “núcleo crucial” da tentativa de golpe.
O ex-ajudante de ordens foi citado 179 vezes na peça de acusação da PGR. Suas revelações incluíram nove celulares, três computadores, tablets e mensagens que deram dimensão à suposta tentativa de golpe.
A defesa de Bolsonaro pode usar essa descoberta para questionar as provas do processo, que já soma quase 80 terabytes de evidências. O perfil @gabrielar702 foi retirado do ar após o interrogatório.