Do total de divórcios realizados no Brasil, cerca de 30% corresponde aos chamados “divórcios grisalhos”, termo dado ao distrato judicial de casamento formalizado por pessoas com mais de 50 anos e com mais de 10 anos de casados. Para se ter ideia do crescimento dessa tendência, em 2010 o percentual de divórcios na mesma faixa etária era de menos de 10% do total.
Os percentuais levam em conta dados do mais recente censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, que apontam o registro em 2022 de 420 mil divórcios. Mas advogados, juristas e casais que já passaram pela experiência alertam sobre o quanto é importante pensar nas consequências jurídicas e financeiras desse tipo de dissolução do relacionamento. Principalmente quando um dos cônjuges dependeu financeiramente do outro durante o casamento.
Na avaliação de psicólogos e especialistas em comportamento humano, os motivos para a tendência ter crescido em todo o mundo passam pelo aumento da expectativa de vida das pessoas, melhor situação econômico-financeira da mulher, saída dos filhos de casa — em grande parte já adultos para construir as próprias famílias — a chegada ou proximidade da aposentadoria e a vontade de buscar sonhos que não foram realizados.
Mas é preciso ter em mente que esse tipo de divórcio envolve não apenas a divisão de bens como também o valor da pensão e questões como planos de saúde, já que a mensalidade aumenta depois dos 50 anos e, ao se separar, normalmente a pessoa perde a ligação de dependente com o companheiro ou companheira.
Diferença significativa
Muitos advogados ressaltaram que as consequências do divórcio grisalho podem ser bem mais significativas em relação às demais separações, porque os casais mais velhos possuem mais bens acumulados e questões referentes a aposentadorias e pensões para resolver.
Por isso, ambos precisam observar que a partilha de bens, nesses casos, pode incluir imóveis, investimentos, poupança, veículos e outros ativos que não são observados em divórcios entre casais na faixa dos 20, 30 ou 40 anos.
Outra questão é a aposentadoria. No Brasil, a pensão por morte e o benefício de aposentadoria podem ser divididos entre os cônjuges, dependendo do regime de casamento. Além disso, o cônjuge que não contribuiu para a Previdência Social pode ter direito a uma pensão alimentícia.
“Por isso, quando um casal nessa idade se divorcia, é preciso deixar claro para a outra parte que não terá mais direito a uma pensão por morte, e esclarecer que ela precisará calcular as perdas financeiras que terá com a mudança de estado civil. Bem como tentar incluir valores referentes a essas perdas na negociação a ser feita, o que nem sempre é fácil”, destacou o advogado de Família Francisco Fernandes.
Também é importante considerar a questão da herança a ser deixada pelo casal. Após a separação, os bens do cônjuge podem não fazer mais parte da herança do ex-parceiro, o que tende a impactar a vida dos filhos e outros herdeiros.
“Quando há comum acordo entre os ex-casais, muitos deles têm preferido optar por já deixar os bens repartidos entre os filhos, ficando com o usufruto desses bens em vida, para evitar problemas futuros. Mas nem sempre acontece assim”, observou o advogado.
Discussão prévia
A advogada Margareth Zanardini, também especializada em Direito de Família, considera que, apesar de o divórcio grisalho estar muito em alta, muitas vezes, de forma extrajudicial, as partes precisam levar em conta vários aspectos.
“O divórcio extrajudicial, feito em cartório, pode não ser a melhor escolha em muitos casos”, destaca.
Quando há pensão alimentícia, especialmente a chamada ‘in natura’, em que o pagamento é feito em bens ou serviços, o divórcio extrajudicial pode ser desvantajoso para uma das partes e resultar em complicações”, alerta.
Autora do livro “Os Danos do Amor”, Margareth contou que, nos últimos anos, mais de 90% dos casos de divórcio grisalho em que atuou foram requeridos por mulheres. “Os homens costumam agir de forma mais transversal. Muitos acham que o casamento está ruim, mas não querem ficar como os responsáveis pela separação. Enquanto as mulheres que tomam a decisão nessa faixa etária estão mais convencidas”, frisou.
A advogada observa que nem sempre divórcios feitos de forma consensual significam que todas as questões foram discutidas previamente entre as partes. Ela dá um exemplo em relação à pensão de alimentos. “O Judiciário entende que a mulher e o homem possuem os mesmos direitos e obrigações. Por isso, o estabelecimento da pensão vai depender da prova de que o homem sempre foi o provedor da família. E, no caso de filhos maiores de idade, que a mulher não tem condições de entrar no mercado de trabalho para manter seu próprio sustento”.
Margareth contou que já conseguiu ganhar causas em que houve aumento de pensão para mulheres que tinham curso superior mas só se dedicaram à família e nunca exerceram a profissão.
Existem muitas situações, segundo ela, em que, pelo fato de ter escolaridade superior, a mulher não leva em conta o quanto está desatualizada e distante do nível de competição com outros profissionais que atuam no mercado há muito tempo. Daí, se confunde no momento do cálculo da pensão, pois tem a expectativa de voltar a trabalhar e vir a ter um salário cujo valor não conseguirá alcançar.
A advogada reforçou que nas separações de cônjuges com mais idade “todas as decisões devem ser tomadas com o máximo de cautela, de forma a garantir que os direitos de ambas as partes sejam respeitados”.
“O divórcio grisalho traz desafios específicos e, por isso, é essencial contar com orientação jurídica que atenda tanto os aspectos legais quanto às questões emocionais envolvidas”, concluiu.