Por Carolina Villela
O Supremo Tribunal Federal (STF) suspendeu nesta quarta-feira (29) o julgamento que discute a possibilidade de autoridades nomearem parentes para cargos políticos. Até o momento, seis ministros já votaram a favor de uma exceção à Súmula Vinculante 13, que proíbe o nepotismo no Brasil, permitindo que secretários municipais, estaduais e ministros de Estado possam ser escolhidos entre familiares das autoridades nomeantes. A decisão, tomada no Recurso Extraordinário (RE 1133118), tem repercussão geral e deverá ser aplicada a todos os processos semelhantes em tramitação no país.
O adiamento ocorreu logo após o início da sessão desta tarde, quando o relator, ministro Luiz Fux, sugeriu um acréscimo à tese e pediu mais tempo para conversar com os colegas sobre a alteração proposta.
A sugestão feita por Fux é o acréscimo da situação em que alguém não aceite o cargo político. Nesse caso deve prevalecer a decisão do STF permitindo que o Chefe do Executivo nomeie parente para o cargo. Mas Fux disse que deve sempre prevalecer a meritocracia. Apenas o ministro Flávio Dino abriu divergência até agora, defendendo a manutenção integral da proibição ao nepotismo.
Fux distingue cargos políticos de administrativos
Em sessão na semana passada, o ministro Luiz Fux fundamentou seu voto na distinção entre cargos administrativos e políticos. Segundo o relator, a Súmula Vinculante 13 representou “verdadeiro avanço no sentido à moralização” da administração pública ao vedar a troca de nomeações entre autoridades, prática conhecida como nepotismo cruzado. Contudo, Fux argumenta que cargos como ministros de Estado possuem natureza essencialmente política e não meramente administrativa, sendo previstos constitucionalmente como auxiliares diretos do chefe do Executivo.
O ministro ressaltou que a Constituição Federal atribui ao presidente da República a competência para indicar seus auxiliares diretos de governo. Fux enfatizou que essa discricionariedade política justifica o afastamento da vedação ao nepotismo nesses casos específicos. “Não significa, de modo algum, a completa imunidade desses atos aos princípios da legalidade”, ponderou o relator, indicando que a exceção não seria carta branca para nomeações arbitrárias.
A proposta estabelece requisitos para as nomeações: os parentes indicados devem demonstrar qualificação técnica e idoneidade moral para o cargo. Além disso, Fux reforçou a manutenção da vedação ao nepotismo cruzado, prática em que autoridades trocam nomeações de parentes entre si para burlar a proibição. O relator também sugeriu que a exceção não se aplique a membros do Poder Judiciário, do Ministério Público e dos Tribunais de Contas, reconhecendo a necessidade de proteção especial a órgãos de controle.
Ministros propõem limites mais restritos à exceção
Embora a maioria dos votos até agora acompanhe o relator, alguns ministros manifestaram preocupação com a abrangência da proposta. O ministro Cristiano Zanin sugeriu que a exceção seja restrita apenas aos cargos de primeiro escalão do Poder Executivo Federal, limitando significativamente o alcance da decisão. Essa posição foi apoiada pelo ministro Alexandre de Moraes, que argumentou pela necessidade de proteger órgãos de controle de influências políticas indevidas.
Moraes defendeu expressamente que não seria aceitável, por exemplo, que um governador pudesse indicar um irmão para o Tribunal de Contas do Estado. O ministro André Mendonça, apesar de acompanhar integralmente o relator, alertou para a importância de tornar a proposta mais restritiva e clara, evitando situações de conflito de interesses evidentes. “Seria muito cômodo, por exemplo, o governador de Estado ou o presidente da República nomear um filho ou irmão como chefe do Ministério Público”, advertiu Mendonça.
Os ministros Nunes Marques e Dias Toffoli também votaram pelo provimento do recurso, embora Toffoli tenha apresentado uma abordagem diferente quanto à formulação da tese jurídica, sugerindo a inconstitucionalidade superveniente da legislação que impede as nomeações. A ministra Cármen Lúcia trouxe à discussão a dificuldade prática de fiscalizar o cumprimento das regras, lembrando que mesmo com a Súmula Vinculante 13 em vigor, casos de nepotismo continuam ocorrendo no país.
Dino fica isolado ao defender proibição total
O ministro Flávio Dino foi o único até o momento a divergir do relator, defendendo a manutenção integral da Súmula Vinculante 13 sem exceções. Dino argumentou que eventuais exceções deveriam ser incluídas na própria súmula por meio de processo adequado, e não por decisão em recurso extraordinário. O ministro destacou que o Congresso Nacional já se posicionou claramente sobre o tema ao aprovar a Lei 14.230/21, que alterou a Lei de Improbidade Administrativa para proibir expressamente o nepotismo e tipificá-lo como ato de improbidade.
Em seu voto, Dino classificou a nomeação de parentes por presidentes da República como prática “intolerável e insuportável sobre o crivo da soberania popular”. O ministro argumentou que as relações familiares são estritamente pessoais e que permitir nomeações de parentes para cargos públicos fere diretamente o princípio constitucional da impessoalidade. Para ele, o momento é oportuno para o STF reforçar a vedação ao nepotismo e romper com essa forma de concentração de poder que marca a história política brasileira.
“É falsa essa ideia de que administrações públicas não funcionam sem parentes”, concluiu Dino ao fundamentar sua divergência. O ministro propôs que seja mantida a vedação ao nepotismo em todos os casos e que, se necessário, seja discutida pontualmente alguma exceção específica em momento posterior. A posição de Dino alinha-se à recente legislação aprovada pelo Congresso e reflete crescente preocupação social com práticas que possam comprometer a moralidade administrativa.



