Os custos com supersalários de magistrados no Brasil dispararam 49,3% em 2024, passando de R$ 7 bilhões para R$ 10,5 bilhões, segundo estudo inédito do Movimento Pessoas à Frente realizado em parceria com o pesquisador Bruno Carazza. O crescimento ficou dez vezes acima da inflação oficial do período, que registrou 4,83% pelo IPCA, evidenciando um descontrole nos gastos públicos com remunerações que ultrapassam o teto constitucional.
A pesquisa “A corrida além do teto: Supersalários, verbas indenizatórias e a necessidade de resgate da autoridade constitucional” revela que os rendimentos líquidos médios dos magistrados subiram 21,95% apenas entre 2023 e 2024. Os valores passaram de R$ 45.050,50 para R$ 54.941,80, ultrapassando em muito o teto constitucional atual de R$ 46.366,19.
O crescimento se manteve acelerado em 2025, atingindo pico de R$ 66.431,76 em fevereiro. Esse aumento é impulsionado principalmente por verbas indenizatórias e benefícios classificados inadequadamente como “penduricalhos”, que permitem burlar o limite constitucional e evitar o pagamento de Imposto de Renda.
Rendimentos ultrapassam teto desde 2022
Os dados mostram crescimento exponencial nos rendimentos líquidos médios dos magistrados desde setembro de 2022, quando ultrapassaram pela primeira vez o teto constitucional. Atualmente, os subsídios representam apenas 43,67% dos rendimentos totais recebidos pelos magistrados, indicando que mais da metade da remuneração vem de adicionais salariais.
O estudo inicialmente previa análise comparativa com o Ministério Público, mas foi inviabilizada pela indisponibilidade e baixa qualidade dos dados públicos do órgão. A pesquisa abrangeu dados de todos os tribunais do país, com algumas exceções pontuais por indisponibilidade de informações específicas.
Movimento critica descontrole histórico
“Desde a Constituição Federal de 1988 o país tenta estabelecer limites máximos para a remuneração no setor público brasileiro. Ao longo desses quase 40 anos, foram realizadas quatro tentativas por meio de leis, porém sem sucesso”, declarou Jessika Moreira, diretora-executiva do Movimento Pessoas à Frente.
A representante da organização alertou para a urgência da situação: “Não podemos esperar mais 40 anos para finalmente resolver esse desafio estrutural dos supersalários no Brasil. Se considerarmos o aumento que foi identificado entre 2023 e 2024, de 49,3%, em apenas dois anos, esse valor terá dobrado”.
Reforma Administrativa como solução
O Movimento Pessoas à Frente defende que a Reforma Administrativa, atualmente debatida no Grupo de Trabalho da Câmara dos Deputados coordenado pelo deputado Pedro Paulo (PSD-RJ), deve contemplar o combate aos supersalários. A proposta visa uma solução efetiva para os “penduricalhos” que beneficiam apenas 0,06% do funcionalismo público brasileiro.
“Os dados do estudo reforçam que mais uma vez o Brasil se depara com uma corrida para além do teto, talvez a mais acirrada e mais bem estruturada na trajetória recente de nossa democracia”, explicou Jessika Moreira. Segundo ela, é necessário frear o uso inadequado da classificação indenizatória para adicionais salariais dessa pequena parcela de servidores.
Coalizão propõe nove medidas essenciais
Uma coalizão de dez organizações da sociedade civil elaborou o “Manifesto pelo Fim dos Supersalários”, estabelecendo nove medidas consideradas indispensáveis para combater o problema. A coalizão inclui Fundação Tide Setúbal, Transparência Brasil, Instituto Democracia e Sustentabilidade e outras entidades.
Entre as principais propostas estão a classificação adequada entre verbas remuneratórias e indenizatórias, aplicação correta do imposto de renda e estabelecimento de mecanismos robustos de transparência. A coalizão também defende a extinção de verbas indevidamente classificadas como indenizatórias e sua transformação em remuneratórias.
Projeto de lei pode legitimar privilégios
O Projeto de Lei 2.721/2021, em tramitação no Senado Federal, preocupa a coalizão por poder legitimar os “penduricalhos” caso seja aprovado. As organizações defendem critérios rigorosos para verbas indenizatórias: natureza reparatória, caráter eventual e transitório, e criação expressa em lei.
A proposta inclui ainda a vedação da vinculação remuneratória automática entre subsídios, o enquadramento como improbidade administrativa de pagamentos acima do teto sem amparo legal e a criação de barreiras para verbas retroativas. O estudo recomenda também vedar benefícios concentrados no sistema de justiça, como férias de 60 dias e aposentadoria compulsória como punição.