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Vem aí a prescrição em massa de ações de improbidade administrativa – um presente que a lentidão da Justiça dará a centenas de maus políticos

Hylda Cavalcanti Por Hylda Cavalcanti
26 de julho de 2025
no CNJ, Estaduais, STF
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Manifestação contra a impunidade

Por Hylda Cavalcanti

Dentro de exatos três meses, mais de 20 mil ações de improbidade administrativa irão fatalmente prescrever. Por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), os tribunais de Justiça de todo o País, TRF’s e STJ deverão julgar todos os processos iniciados antes de 2021 que ainda estão pendentes de julgamento. Essa, sem dúvida, consiste em uma jornada absolutamente impossível para os tribunais — já que alguns deles levam mais de seis anos para julgar um recurso.

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A impossibilidade material de julgar em massa as ações nestas condições, que estão próximas de prescrever, tem sido criticada por grande número de juristas, acadêmicos e operadores do Direito. A prescrição tem sido vista como um ponto de inflexão negativa para o efetivo controle da probidade na administração pública. 

De acordo com o promotor de Justiça Carlos Fernandes Júnior, do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), ao redefinir o marco temporal a legislação alterou a dinâmica dos processos, especialmente no que se refere à necessidade de julgamentos céleres em um sistema notoriamente congestionado.

Julgamento de mérito

“Apenas desprezando-se a atual realidade dos corredores forenses permite-se admitir como plausível a ocorrência do julgamento de mérito de uma ação de improbidade administrativa em segunda instância, com tramitação processual inferior a quatro anos, a contar da data de sua propositura”, afirmou em artigo sobre o tema. 

Fernandes Júnior destacou que “na literalidade com que é apresentada pela Lei nº 14.230/21, a prescrição intercorrente pode comprometer a confiança da sociedade na efetividade do combate à corrupção e na tutela do patrimônio público”.

“Outro aspecto relevante é o impacto sobre a gestão dos recursos públicos. Ao restringir o tempo disponível para a aplicação de sanções contra agentes ímprobos, a legislação pode fragilizar a efetiva responsabilização — e até desconstituir qualquer efeito dissuasório à prática da ‘sangria’ delituosa dos cofres públicos, alertou o representante do MP.

Ele  chamou a atenção, ainda, para que seja feito um debate aprofundado sobre o mecanismo de prescrição, “para que não se torne motivo de fragilização quanto à defesa da probidade no País, ou um estímulo à impunidade”.

Culpados ilesos

De forma assemelhada pensam o doutorando e mestre em Direito e Políticas Públicas Murilo Laureano Pinto, servidor do Superior Tribunal de Justiça (STJ), e o mestre em Administração Pública Fabiano Angélico. 

“Se tudo se mantiver como está, um número bastante elevado de eventuais culpados por atos de improbidade sairá ileso pela demora do Estado em julgá-los”, afirmou  Pinto, em artigo acadêmico para a Fundação Getúlio Vargas (FGV).

Murilo Pinto e Fabiano Angélico destacaram que a atualização da Lei de Improbidade, em 2021, aumentou nominalmente o prazo para a incidência de prescrição “principal”, que é o prazo para o Ministério Público dar início à ação. A nova lei mudou a forma de contagem desse prazo que antes era de 5 anos para fixar em 8 anos, a partir do cometimento da infração.

Etapas do processo

Mas não foi apenas isso. A nova lei criou hipóteses da chamada “prescrição intercorrente”. Isso significa que o processo não pode ficar 4 anos na mesma instância.

Em outras palavras, depois da sentença proferida em uma ação de improbidade administrativa, são quatro as etapas que precisam ser vencidas, cada uma tendo o prazo de 4 anos. Publicada a sentença condenatória em primeira instância, TJ’s e TRF’s tem 4 anos para julgar o recurso, sob pena de prescrição. A publicação da decisão ou acórdão condenatórios do Tribunal de Justiça ou Tribunal Regional Federal, reinicia a contagem do prazo de 4 anos, mas agora para que o STJ possa analisar e julgar eventual recurso. Com a publicação da decisão ou acórdão condenatórios do STJ, de novo, interrompe-se o prazo de prescrição e começa novamente a contagem de 4 anos para que o STF possa julgar eventual recurso.

Assim, se a sentença, por exemplo, condenar um agente político por improbidade, mas o recurso da defesa não for julgado em quatro anos pelo Tribunal, haverá prescrição intercorrente. “Pior ainda: se a sentença for absolutória, o prazo estará sendo contado desde o início da ação, e mesmo que equivocada, essa ação não poderá mais ser corrigida pelo tribunal”, informaram os dois juristas. 

Ação no STF

O STF pode retomar o julgamento da ação que questiona pontos da Lei nº 14.230/2021 que allterou a Lei de Improbidade Administrativa, Lei n. 8.429/92, o que leva a uma pequena esperança de mudança na norma.  A despeito de a Corte já ter definido o  marco temporal para a prescrição, uma ação da Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp) ajuizada em setembro de 2022 ainda não foi julgada. Entre outros pontos da legislação, ela também questiona os prazos prescricionais. 

Uma esperança pequena: em um período de pauta tão atribulada e de julgamentos emblemáticos a ponto de envolverem generais e um ex-presidente da República, é pouco provável que o Supremo consiga se deter sobre esse assunto antes que as prescrições em massa aconteçam, dentro de três meses, ou seja, até o dia 26 de outubro de 2025.

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Tags: celeridade do JudiciárioEspecial Improbidadeimprobidade administrativaprescrição intercorrenterisco de impunidade

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