O Tribunal Superior do Trabalho condenou duas empresas de cruzeiros marítimos — a Costa Cruzeiros Agência Marítima e Turismo Ltda. e a Ibero Cruzeiros Ltda. — a indenizarem uma trabalhadora por considerar que exerceram “abuso de direito” contra ela, contratada como animadora infantil.
As duas empresas exigiram da profissional exames de HIV e toxicológico na admissão, além de comprovantes de antecedentes criminais sem que a atividade a ser exercida por ela tivesse alguma peculiaridade que justificasse a medida. A autora da ação também relatou que foi humilhada publicamente pelo chefe em frente à tripulação, passageiros e crianças.
Conforme informou a autora da ação, ela trabalhou nos navios das duas empresas de junho de 2016 a janeiro de 2017. Em primeiro grau, o juízo rejeitou os pedidos de indenização. Mas em recurso julgado pelo Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região (TRT-9) a sentença foi reformada e as empresas, condenadas por assédio contra a trabalhadora.
A decisão, conforme destacaram os desembargadores, levou em conta o depoimento de uma testemunha, também animadora, que confirmou a conduta do chefe. Mas o TRT-9 negou o direito a indenização pela exigência dos exames.
O Tribunal acolheu justificativa das empresas de que a medida não foi adotada pela função exercida pela trabalhadora como animadora, mas pelo fato dela trabalhar a bordo de navios em cruzeiros marítimos e de toda a tripulação ter de se submeter a esses exames.
Prática discriminatória
No TST, o relator do processo, ministro Maurício Godinho Delgado, afirmou que a Lei 9.029/1995 proíbe a prática discriminatória e limitativa de acesso ao trabalho. Além disso, o magistrado citou os termos da portaria 1.246/2010 do Ministério do Trabalho e Emprego, que também proíbe a testagem quanto ao HIV.
Conforme a avaliação do ministro, “a exigência do teste decorre da estigmatização do portador do vírus HIV. Por isso, a medida caracteriza discriminação, abuso de direito do empregador e afronta a intimidade, à vida privada e à dignidade da trabalhadora”. Para esse aspecto, foi deferida indenização de R$10 mil.
Em relação ao assédio praticado contra a autora da ação, o ministro ressaltou a evolução da legislação nacional e internacional sobre o tema e citou o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), bem como normas internacionais que buscam evitar que os julgamentos repitam estereótipos e perpetuem tratamentos diferentes e injustos contra mulheres.
Ele apontou, entre outros elementos que compõem o assédio moral sofrido pela animadora, a discriminação específica em razão da sua condição de mulher e o fato de o ofensor exercer cargo de chefia, além do notório desnível entre o poder econômico dela e das empresas e a condição pública e reiterada das humilhações. Assim, a indenização deferida pelo TRT foi elevada para R$ 30 mil.
Os ministros que integram a 3ª Turma do TST votaram por unanimidade conforme o voto do relator. O processo julgado foi o RRAg-2030-90.2017.5.09.0016.