Em julgamento de caso relacionado a medidas de combate à violência doméstica contra a mulher, o Superior Tribunal de Justiça decidiu que os magistrados podem definir um prazo para a duração das medidas protetivas de urgência – no âmbito da Lei Maria da Penha. Mas antes desse prazo encerrar, o juiz terá que chamar a vítima para depor e informar como está cada caso.
Com esse entendimento, os ministros que integram a 5ª Turma do Tribunal resolvem as dúvidas que têm surgido em vários tribunais do país se o juízo de primeiro grau pode reavaliar a necessidade de manter essas medidas. Os ministros defenderam que a reavaliação é necessária, caso a caso, de forma a garantir que as partes envolvidas possam se manifestar antes do fim do prazo das medidas protetivas.
O assunto tende a ser objeto de novos julgamentos no âmbito do Tribunal e tem sido debatido por muitas entidades de direitos humanos e defesa das mulheres — sobretudo em episódios de feminicídio, quando se constata que algumas das vítimas desse crime tinham tido as medidas protetivas contra seus assassinos revogadas dias ou semanas antes do crime.
Proteção sem representação
O caso que suscitou o recurso no STJ foi um pedido de proteção feito por uma mulher em Minas Gerais – para ela e sua família – depois que um ex-namorado ateou fogo no carro de seu marido e o ameaçou de morte. O detalhe é que a mulher pediu a proteção, mas não quis apresentar representação criminal contra o agressor. Diante disso, o juízo de primeira instância encerrou o processo de imediato e não analisou o mérito. O juiz argumentou que as medidas protetivas têm natureza cautelar e, portanto, dependem de representação criminal.
O Ministério Público recorreu ao Tribunal de Justiça de Minas Gerais, que acolheu o recurso, reabriu o processo e concedeu a medida protetiva para a requerente. No julgamento, o TJMG considerou que as medidas protetivas possuem “natureza autônoma e caráter satisfativo”, motivo pelo qual deveriam ser concedidas levando-se em conta o caso da mulher que fez o pedido e os danos que ela e a família sofreram. E estabeleceu prazo de 90 dias de duração para tais medidas.
O MP questionou esse prazo em novo recurso, desta vez junto ao STJ, com a alegação de que “não deve existir previsão legal de limitação temporal para as medidas protetivas de urgência”. Na visão do MP, “a revogação das medidas somente poderia ocorrer quando houvesse mudança nas circunstâncias que motivaram o pedido de proteção”.
Integridade física da mulher
Para o relator da matéria no STJ, ministro Ribeiro Dantas, as mudanças introduzidas pela Lei 14.550/23 reforçaram o caráter inibitório e satisfativo das medidas protetivas.
Essa legislação alterou a Lei Maria da Penha para dispor sobre as medidas protetivas de urgência e estabelecer que a causa ou a motivação dos atos de violência e a condição do ofensor ou da ofendida não excluem a aplicação da Lei.
O ministo destacou que a nova lei “ampliou a proteção imediata à integridade física, psíquica, sexual, patrimonial e moral da vítima ou de seus dependentes, independentemente do registro formal de denúncia”.
O magistrado destacou que, embora o tema ainda comporte decisões divergentes nos julgamentos, tem predominado no STJ o entendimento de que as medidas protetivas sejam fixadas em um prazo específico, desde que as decisões sejam concedidas com base nas peculiaridades de cada caso e se revise periodicamente a necessidade de manutenção das medidas.
Com esse entendimento, o colegiado da turma deu provimento parcial ao recurso.
Manteve o prazo de 90 dias de validade das medidas protetivas, mas, ao mesmo tempo, destacou a necessidade de o juízo competente reavaliar a necessidade de sua manutenção, ouvindo a vítima antes de qualquer alteração na proteção que lhe foi concedida.