Da redação
O Superior Tribunal Militar (STM) decidiu, por unanimidade, acolher representação da Procuradoria-Geral da Justiça Militar (PGJM) e declarar a indignidade de um segundo-tenente do Exército, atualmente na reserva não remunerada, determinando a perda de seu posto e patente.
O militar havia sido condenado pela Justiça Militar da União, em decisão transitada em julgado em junho de 2024, à pena de quatro anos, um mês e dezoito dias de reclusão pelo crime de estelionato. O caso envolveu fraudes no sistema SIAFI durante o exercício da função de chefe da tesouraria no 52º Batalhão de Infantaria de Selva (52º BIS), em Marabá (PA), onde o oficial desviou recursos públicos para sua conta pessoal.
Fraude sofisticada no sistema de pagamentos
A investigação revelou que quando exercia a função de chefe da tesouraria, o tenente manipulou o Sistema Integrado de Administração Financeira (SIAFI), alterando ordens de pagamento originalmente destinadas a fornecedores e inserindo seus próprios dados bancários como beneficiário dos recursos.
Além das fraudes diretas contra fornecedores, o oficial tentou, em três ocasiões distintas, manipular informações em pagamentos de diárias de um soldado subordinado com o objetivo direcionar esses valores para sua conta pessoal.
Base constitucional para julgamento ético
A declaração de indignidade tem fundamento na Constituição Federal de 1988, que estabelece que oficiais das Forças Armadas condenados, na Justiça comum ou militar, a pena privativa de liberdade superior a dois anos devem ser submetidos a julgamento de natureza ética. Nessa avaliação, o tribunal analisa a compatibilidade da permanência do militar no oficialato, podendo cassar a carta-patente como medida extrema.
As cartas-patente representam documentos legais fundamentais no âmbito militar, sendo individuais e definindo a posição hierárquica do oficial, bem como o corpo ou quadro a que pertence. Elas servem como prova oficial dos direitos e deveres previstos em lei, constituindo a base formal da carreira militar.
Ministério Público destaca gravidade da conduta
Na ação penal, a promotoria militar enfatizou aspectos agravantes que transcenderam o mero aspecto financeiro do crime. Embora os valores desviados tenham sido posteriormente restituídos, o Ministério Público Militar destacou que a devolução não ocorreu de forma espontânea, mas apenas após a descoberta da fraude e durante o curso das investigações, o que demonstrou ausência de arrependimento genuíno.
Para o MPM, a conduta representou grave violação ao dever fundamental de fidelidade que todo militar deve às instituições armadas. Mais que isso, a ação atentou contra os princípios basilares de honra e ética das Forças Armadas, expressamente previstos no Estatuto dos Militares como pilares indispensáveis da carreira militar. Após a condenação definitiva, o órgão ministerial apresentou formalmente a representação ao STM solicitando a declaração de indignidade.
Defesa questiona decisão sem sucesso
A Defensoria Pública da União apresentou defesa técnica questionando a possibilidade jurídica de declarar a indignidade de um militar já transferido para a reserva. A defesa argumentou que tal medida poderia violar princípios constitucionais fundamentais como proporcionalidade e estabilidade das relações jurídicas, criando insegurança jurídica para militares inativos.
Além do questionamento processual, a defesa apontou supostos equívocos técnicos na condenação original e ressaltou que os danos financeiros causados ao erário haviam sido integralmente reparados. No entanto, esses argumentos não foram suficientes para sensibilizar o colegiado do STM, que manteve o foco na gravidade ética da conduta praticada.
Unanimidade reforça rigor institucional
O relator do processo, ministro Artur Vidigal de Oliveira, votou pela procedência integral da representação, declarando o oficial da reserva indigno para o oficialato e determinando a perda definitiva do posto e da patente. O voto foi acompanhado unanimemente pelos demais ministros da Corte, demonstrando consenso sobre a necessidade de preservar os padrões éticos militares.
O tribunal deixou claro que a transferência para a reserva não constitui proteção contra a responsabilização por atos incompatíveis com a ética militar, mantendo a possibilidade de sanções mesmo após o afastamento do serviço ativo.