A 1ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo absolveu mulher de suposta falta grave cometida dentro do estabelecimento prisional por insuficiência de provas consistentes da infração disciplinar, reafirmando princípio fundamental da presunção de inocência no sistema carcerário.
A interna se envolveu em uma discussão acalorada com companheiras de cela após encontrar seus pertences pessoais espalhados no chão quando retornava do período de banho de sol. Ao tentar recolher seus objetos, duas detentas a xingaram agressivamente. Ela afirmou ter respondido apenas verbalmente e então foi agredida fisicamente com puxões de cabelo e socos na cabeça.
Uma companheira de cela tentou defendê-la da agressão, mas também foi atacada pelas agressoras. A apenada então revidou as agressões físicas sofridas. As agentes penitenciárias aplicaram falta grave, fazendo-a perder 1/6 do tempo de pena já remido e o lapso temporal necessário para progressão ao regime semiaberto.
Contradições evidentes nos depoimentos colhidos
O relator do acórdão, desembargador Diniz Fernando, explicou que nenhuma das versões apresentadas pelas detentas envolvidas no incidente conseguiu refutar consistentemente a versão defensiva apresentada pela autora do recurso (um agravo em execução penal). Além disso, as agentes penitenciárias não presenciaram o início da discussão.
A autora e a companheira que a auxiliou durante a briga apontaram duas outras apenadas como testemunhas presenciais da discussão, que teriam ouvido claramente os xingamentos iniciais proferidos pelas agressoras. Entretanto, essas testemunhas potenciais não foram convocadas para prestar depoimento durante instrução disciplinar.
Essa omissão probatória comprometeu significativamente apuração dos fatos e caracterizou falha processual grave no procedimento administrativo disciplinar, violando direito fundamental ao contraditório e ampla defesa, aplicáveis também no ambiente prisional.
Aplicação do princípio da presunção de inocência
Por conta das inconsistências evidentes nos depoimentos colhidos e ausência de provas técnicas conclusivas, os desembargadores entenderam que deve-se aplicar rigorosamente o princípio constitucional da presunção de inocência em favor da autora. Concederam provimento ao agravo em execução penal.
“Diante das contradições nos relatos das detentas, inexistência de testemunhas presenciais imparciais com efetivo conhecimento dos fatos e ausência de prova técnica capaz de elucidar dinâmica fática, a decisão recorrida não pode subsistir”, fundamentou Diniz Fernando.
O princípio da presunção de inocência, consagrado no artigo 5º, inciso LVII, da Constituição Federal, aplica-se integralmente ao processo administrativo disciplinar prisional, exigindo prova robusta e inequívoca para imposição de sanções disciplinares.
Direitos fundamentais no ambiente prisional
A decisão reafirma que pessoas privadas de liberdade não perdem direitos fundamentais básicos, incluindo direito ao devido processo legal, contraditório, ampla defesa e presunção de inocência. O ambiente prisional não justifica flexibilização dessas garantias constitucionais básicas.
A jurisprudência brasileira tem evoluído no sentido de exigir rigor probatório similar ao processo penal comum para aplicação de sanções disciplinares graves no sistema prisional, evitando arbitrariedades e protegendo direitos dos apenados.
Importância da instrução probatória adequada
O caso evidencia importância fundamental de instrução probatória adequada e completa nos procedimentos administrativos disciplinares prisionais. A omissão na oitiva de testemunhas relevantes compromete busca da verdade e viola direitos defensivos básicos.
Administrações prisionais devem garantir apuração criteriosa e imparcial de faltas disciplinares, colhendo todas as provas disponíveis e assegurando contraditório efetivo. A punição sem prova suficiente constitui arbitrariedade inaceitável.
Consequências da anulação da falta
Com anulação da falta grave, a apenada recupera integralmente o tempo de remição perdido e restabelece contagem do prazo para progressão de regime. A medida preserva direitos fundamentais e evita prolongamento injusto do cumprimento da pena.
A decisão estabelece precedente importante sobre necessidade de rigor probatório em procedimentos disciplinares prisionais, protegendo pessoas privadas de liberdade contra punições arbitrárias ou baseadas em provas insuficientes.
Impacto para sistema prisional
A decisão orienta administrações prisionais sobre necessidade de aprimoramento dos procedimentos de apuração disciplinar, garantindo respeito aos direitos fundamentais e adequada instrução probatória. O rigor técnico protege tanto direitos dos apenados quanto credibilidade do sistema.
Espera-se que precedente contribua para redução de arbitrariedades disciplinares e fortalecimento do estado democrático de direito no ambiente prisional, onde direitos fundamentais devem ser rigorosamente preservados.