Da Redação
O Supremo Tribunal Federal reconheceu repercussão geral em processo que pode estabelecer definitivamente as regras para compartilhamento de relatórios de inteligência financeira entre órgãos de investigação. A decisão atende pedido da Procuradoria-Geral da República e busca resolver impasse criado por interpretações divergentes do Superior Tribunal de Justiça.
O caso envolve a troca de dados entre o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), o Ministério Público e as polícias. Essa comunicação é fundamental para investigações de crimes financeiros, mas tem enfrentado obstáculos interpretativos que prejudicam o andamento de casos.
Divergência entre tribunais superiores gera insegurança jurídica
O STF já havia estabelecido no Tema 990 que o Coaf pode compartilhar relatórios diretamente com MP e polícia, sem necessidade de autorização judicial prévia. A regra permite o envio tanto por iniciativa própria quanto a pedido dos investigadores, desde que documentado em procedimento formal.
Porém, o STJ tem dado interpretação mais restritiva à decisão do Supremo. O tribunal superior entende que o compartilhamento só pode ocorrer após a instauração formal de inquérito policial, desconsiderando outros tipos de procedimentos investigativos válidos.
Essa divergência tem resultado no trancamento de investigações regulares e anulação de provas em casos de lavagem de dinheiro, corrupção e evasão de divisas. O próprio STF já derrubou várias determinações do STJ nesse sentido, mas as decisões valem apenas para os casos específicos.
Operação Sangue Impuro expõe problema na prática
O recurso extraordinário que motivou o reconhecimento da repercussão geral trata da Operação Sangue Impuro. A investigação apurava esquema de evasão de divisas e lavagem de dinheiro através da importação irregular de cavalos em Campinas (SP).
Após delação premiada e levantamento de indícios, o MPF pediu à Polícia Federal a abertura de inquérito contra um dos envolvidos. Simultaneamente, solicitou ao Coaf relatório de movimentação financeira do investigado, procedimento comum em casos dessa natureza.
Embora a requisição de inquérito tenha sido feita com antecedência, a polícia só formalizou o procedimento 22 dias depois do pedido ao Coaf. Por esse motivo, o STJ determinou o trancamento da investigação e anulou todas as provas obtidas a partir dos relatórios financeiros.
PGR defende ampliação dos procedimentos válidos
O procurador-geral da República, Paulo Gonet, argumenta que limitar a requisição de dados apenas aos inquéritos policiais restringe indevidamente os poderes investigatórios do Ministério Público. Essa interpretação pode comprometer a validade de provas em inúmeros processos criminais.
A PGR defende que outros procedimentos formais também atendem aos requisitos estabelecidos pelo STF. Notícias de fato, notícias-crime em verificação e verificações preliminares de informação cumprem a exigência de documentar os pedidos e evitar a chamada “pesca probatória”.
Gonet destacou que o próprio STF, ao julgar o Tema 990, ressaltou a importância do intercâmbio de informações para combater criminalidade organizada e corrupção. A medida é especialmente relevante em crimes de sonegação fiscal, evasão de divisas e lavagem de dinheiro.
Com o reconhecimento da repercussão geral como Tema 1404, o Plenário Virtual do STF estabelecerá entendimento definitivo sobre a questão. A decisão orientará futuras decisões do Judiciário e encerrará a divergência interpretativa entre os tribunais superiores, trazendo maior segurança jurídica para as investigações criminais no país.
*Com informações da PGR