Da Redação
O Supremo Tribunal Federal (STF) proferiu uma decisão que promete impactar diretamente a vida de milhares de servidores temporários no Brasil. Por unanimidade, a Corte estabeleceu que trabalhadores temporários da administração pública que tiveram seus contratos declarados nulos têm o prazo de cinco anos para cobrar depósitos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS).
A decisão, tomada na sessão virtual encerrada em 29 de agosto de 2024, representa uma vitória significativa para essa categoria de trabalhadores. Anteriormente, havia incerteza jurídica sobre qual prazo deveria ser aplicado: se os dois anos previstos na Constituição Federal para relações trabalhistas ou os cinco anos estabelecidos pelo Decreto 20.910/1932 para ações contra a Fazenda Pública.
O julgamento teve origem em um recurso extraordinário (RE 1.336.848) apresentado pelo governo do Pará contra uma decisão do Tribunal de Justiça local. O caso envolveu um servidor temporário do estado que, após ter seu contrato considerado nulo devido a sucessivas prorrogações, buscava o levantamento dos valores do FGTS.
O Tribunal de Justiça do Pará havia decidido pela aplicação do prazo quinquenal, mas o governo estadual recorreu ao STF, tentando aplicar o prazo mais curto de dois anos. A estratégia do estado, no entanto, foi rejeitada pela Suprema Corte.
O ministro Gilmar Mendes, relator do caso, argumentou em seu voto que servidores temporários possuem vínculo jurídico-administrativo com a administração pública, não sendo regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Portanto, não caberia aplicar a prescrição bienal prevista para relações trabalhistas comuns.
O magistrado destacou ainda que o artigo 39, parágrafo 3º da Constituição Federal é taxativo ao definir quais direitos trabalhistas se estendem aos ocupantes de cargos públicos, e o prazo bienal não está entre eles.
A Tese Fixada
A tese de repercussão geral estabelecida pelo STF foi clara e objetiva:
“O prazo bienal para ajuizamento de ação, previsto na parte final do art. 7º, XXIX, da Constituição Federal, não se aplica aos servidores temporários que tiveram seus contratos declarados nulos, por se tratar de ocupantes de cargos públicos regidos por vínculo de natureza jurídico-administrativa. Nesses casos, incide o prazo prescricional quinquenal, nos termos do art. 1º do Decreto nº 20.910/1932.”
A decisão representa uma ampliação significativa das oportunidades para que servidores temporários recuperem seus direitos. Com o prazo de cinco anos, muitos trabalhadores que antes poderiam ter perdido a chance de cobrar o FGTS por prescrição agora têm uma janela maior para buscar seus direitos na Justiça.
Para estados e municípios, a decisão pode representar um aumento no número de ações judiciais e, consequentemente, nos custos com pagamentos de FGTS a ex-servidores temporários. Isso é especialmente relevante para entes públicos que historicamente recorreram a contratações precárias e sucessivas prorrogações de contratos temporários.
Segurança Jurídica
Apesar dos possíveis custos para a administração pública, a decisão traz o benefício da segurança jurídica. Com a fixação definitiva do prazo, tanto governos quanto trabalhadores passam a ter clareza sobre seus direitos e obrigações, reduzindo incertezas e litígios desnecessários.
A questão dos contratos temporários na administração pública tem sido um tema recorrente nos tribunais brasileiros. Muitos entes públicos, especialmente em períodos de dificuldades financeiras ou necessidades emergenciais, recorreram a contratações temporárias que, posteriormente, foram consideradas irregulares pela Justiça.
Quando esses contratos são declarados nulos, surge a questão sobre quais direitos o trabalhador mantém. O STF já havia consolidado o entendimento de que, mesmo com a nulidade do contrato, o trabalhador tem direito ao salário pelo período trabalhado e aos depósitos do FGTS.
A decisão tem repercussão geral, o que significa que todos os processos semelhantes em tramitação na Justiça brasileira deverão seguir o mesmo entendimento. Isso uniformiza a aplicação da lei em todo o território nacional e evita decisões conflitantes entre diferentes tribunais.
O ministro Luiz Fux foi o único a não participar do julgamento, tendo se declarado suspeito no caso. Os demais ministros acompanharam unanimemente o voto do relator Gilmar Mendes.