Por Carolina Villela
A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) encerra nesta segunda-feira (28) o julgamento na (AP) 14129, no plenário virtual, que analisa as medidas cautelares impostas pelo ministro Alexandre de Moraes contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Com maioria já formada, os ministros Flávio Dino, Cristiano Zanin e Cármen Lúcia votaram para acompanhar o relator, restando apenas o voto do ministro Luiz Fux.
As medidas restritivas incluem o uso obrigatório de tornozeleira eletrônica, proibição de acesso às redes sociais e restrição domiciliar entre 19h e 6h nos dias de semana, além de confinamento integral nos finais de semana e feriados. As cautelares foram impostas após operação da Polícia Federal autorizada por Moraes, que resultou na apreensão de aproximadamente US$ 14 mil, um pen drive encontrado no banheiro e o celular do ex-presidente.
Investigação surge após pressão internacional
A investigação foi instaurada a pedido da Procuradoria-Geral da República após o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anunciar uma taxa de 50% sobre produtos brasileiros, alegando perseguição política contra Bolsonaro. O ex-presidente é investigado pelos crimes de coação no curso do processo, obstrução à Justiça e ataque à soberania nacional.
Na decisão que determinou as cautelares, Moraes justificou que Bolsonaro e seu filho, o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), atuaram contra a soberania nacional para “instigar e auxiliar o governo estrangeiro à prática de atos hostis ao Brasil”. O ministro destacou a tentativa de submeter o funcionamento do STF aos interesses dos Estados Unidos.
A operação da Polícia Federal foi realizada na última sexta-feira (18), com buscas na residência de Bolsonaro e no escritório do ex-presidente na sede do Partido Liberal, em Brasília.
Manifestações intensificam tensão diplomática
Após o anúncio das tarifas americanas, Bolsonaro publicou agradecimento a Trump nas redes sociais, caracterizando o processo judicial como “aberração jurídica” e “perseguição política”. O ex-presidente chegou a sugerir a possibilidade de negociação com Trump em troca de anistia, questionando publicamente se seria “muito pedir”.
Em uma segunda manifestação, Trump reforçou seu apoio direto a Bolsonaro, afirmando que o julgamento deveria terminar imediatamente. O presidente americano expressou preocupação com supostos ataques à liberdade de expressão no Brasil e declarou estar acompanhando de perto a situação brasileira.
O deputado federal licenciado Eduardo Bolsonaro manteve diálogo intenso com autoridades americanas, apresentando documentos sobre a situação judicial brasileira. A articulação culminou com pedido para aplicação da Lei Magnitsky que permite que os Estados Unidos imponham sanções a cidadãos estrangeiros.
Fundamentos jurídicos da decisão
O ministro Flávio Dino fundamentou seu voto de referendo nos pressupostos do artigo 282 do Código de Processo Penal, que exige necessidade para aplicação da lei penal e adequação à gravidade do crime. A decisão considera demonstrado o fumus commissi delicti através das manifestações públicas que questionam a legitimidade do STF.
O periculum in mora foi identificado na possibilidade concreta de fuga, considerando o relacionamento estreito do investigado com governo estrangeiro. Segundo o ministro, a situação representa forma inédita de coação internacional, caracterizada como “sequestro da economia nacional” para exigir que o STF “pague resgate” arquivando processo judicial.
“É explícito que se cuida de intolerável estratégia de retaliação política, que afronta a soberania nacional ao constranger as instituições públicas brasileiras – incluindo este Supremo Tribunal –, a fim de que suas decisões sejam subalternas à vontade pessoal de líder político de Estado estrangeiro”.
O ministro Cristiano Zanin também votou acompanhando o relator, reforçando a importância da defesa da soberania nacional em contexto de pressão internacional.
A ministra Cármen Lúcia também defendeu a apuração dos fatos descritos na denúncia do Ministério Público, na forma constitucional do devido processo legal, em benefício da segurança pública e jurídica e da sociedade, a fim de se guardar a Constituição do Brasil e se garantir o Estado de Direito.
Reação da defesa e do investigado
A defesa do ex-presidente divulgou nota oficial afirmando ter recebido “com surpresa e indignação a imposição de medidas cautelares severas” contra Bolsonaro, ressaltando que ele “até o presente momento sempre cumpriu com todas as determinações do Poder Judiciário”.
No dia em que foi obrigado a usar a tornozeleira eletrônica, o ex-presidente declarou à imprensa que estava vivendo uma “suprema humilhação”. A manifestação ocorreu durante o cumprimento das medidas cautelares determinadas pelo STF.
Jair Bolsonaro defendeu recentemente a permanência do filho Eduardo nos Estados Unidos, mesmo após término do prazo regimental de afastamento parlamentar. O ex-presidente afirmou que o deputado seria “mais útil lá fora do que cumprindo mandato no Brasil”.