Por Hylda Cavalcanti
Conhecido como o equilibrista da delicada relação entre Lula e os militares, o ministro da Defesa, José Múcio Monteiro, pediu para não participar como testemunha das oitivas dos processos da trama golpista. O pedido foi formalizado nesta segunda-feira (13/07) ao ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).
O STF tinha agendado para a próxima semana a participação dele em uma das audiências, no processo que apura a suposta tentativa de golpe de Estado após as eleições de 2022. O pedido de dispensa foi encaminhado pela Advocacia-Geral da União (AGU), que representa o ministro. No documento, ele alegou que não tem conhecimento dos fatos investigados e, por isso, não poderia contribuir com informações relevantes.
Rafael Oliveira
Múcio seria ouvido no dia 22 como testemunha de defesa de Rafael Martins de Oliveira, militar das Forças Especiais conhecido como um dos “kids pretos”, que está entre os réus do núcleo 3 da denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR).
Segundo a acusação, esse grupo foi responsável por planejar as ações da suposta trama golpista. Oliveira está preso desde 19 de novembro de 2023. É acusado de participar da elaboração do plano Punhal Verde e Amarelo para assassinar o presidente Lula, o vice-presidente Geraldo Alckmin e o próprio ministro Alexandre de Moraes. Moraes ainda não decidiu a respeito, mas entre juristas, não há motivos para o depoimento do ministro ser mantido.
Poder de conciliação
Não foi a primeira vez que o ministro da Defesa tentou sair do centro de polêmicas envolvendo a tentativa de golpe. Ele tem conseguido, com razoável sucesso e sempre com muita polêmica, desviar de posições e situações incômodas.
Múcio foi nomeado para o cargo sem indicação partidária, por decisão pessoal de Lula, que o considera um “grande amigo”. E coleciona tantos admiradores dentro do Governo (como o ministro de Desenvolvimento Agrário, Paulo Teixeira, por exemplo) como desafetos, caso do ex-presidente do PT, deputado federal Rui Falcão (PT-SP).
Declarações polêmicas
As críticas e as cascas de banana lançadas pelos desafetos já fizeram com que ele ameaçasse deixar o cargo. Ele se dizia muito cansado — mas acabou permanecendo a pedido do próprio Lula. Uma delas aconteceu quando defendeu a soltura de “inocentes” ou de pessoas com participação mínima nos atos de 8 de janeiro de 2023. O ministro afirmou, na época, que isso poderia “contribuir para a pacificação do país”. Terminou sendo acusado por petistas de estar defendendo a anistia aos presos bolsonaristas.
“Na hora que você solta um inocente ou alguém que teve envolvimento pequeno, isso ajuda a pacificar. O Brasil precisa disso. Ninguém aguenta mais esse radicalismo”, afirmou, durante entrevista ao programa Roda Viva, da TV Cultura — ocasião em que também se explicou melhor e reforçou a necessidade de dosimetria nas punições, diferenciando os envolvidos conforme o grau de responsabilidade.
Sem golpes
Outro enrosco em que se meteu foi quando afirmou que “nunca houve ameaça de golpe de Estado”. Depois ele explicou que não houve ameaça de golpe com uso da Garantia da Lei e da Ordem (GLO) — prerrogativa do presidente da República prevista na Constituição e aplicada em situações de crise na segurança pública ou alguma outra ocorrência que exija assistência federal.
Acrescentou em seguida que “golpista não precisa de Constituição, de livro, de regra”. “Eu acho que a gente tem margem para conversar, sem viés eleitoral, sem viés partidário, sem polarização, porque as Forças Armadas são guardiões do país, do Brasil”, frisou. Mais uma vez, houve quem achasse pertinente e também quem não gostasse da sua fala, dentro do governo.
“Encantador” e “perigoso”
Nessas idas e vindas, o ministro tem recebido apelidos pitorescos, como o de “encantador até de serpentes”, por ser festeiro e hoje próximo de muitos nomes do Palácio do Planalto com quem antes de 2023 tinha pouca ou nenhuma proximidade. E de “perigoso”, pela forma com que toca seu ministério e modela suas relações com os integrantes das Forças Armadas.
O presidente Lula, sempre que perguntado a respeito, desconversa e diz que tem nele um dos seus melhores ministros. Já o próprio Múcio evita conflitos e foge de uma saia justa para outra com habilidades de equilibrista.