Da Redação
A ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, abandonou nesta terça-feira (27) uma audiência na Comissão de Infraestrutura do Senado Federal após uma série de confrontos e manifestações de desrespeito por parte de senadores. O episódio expôs novamente as tensões entre a agenda ambiental do governo e setores do Congresso Nacional que pressionam por flexibilização das regras de licenciamento.
Tudo começou quando o tema do meio ambiente descambou para a polêmica da pavimentação da BR-319, que liga Porto Velho (RO) a Manaus (AM). Marina Silva havia sido convidada pelo senador Lucas Barreto (PSD-AP) para prestar esclarecimentos sobre a criação de unidades de conservação da marinha na Margem Equatorial, no Norte do país. No entanto, a sessão rapidamente se desviou o assunto.
Durante três horas e meia de debates, a ministra enfrentou críticas constantes sobre a demora na liberação de licenças ambientais. O primeiro confronto ocorreu com o presidente da comissão, senador Marcos Rogério (PL-RO), que ironizou a “educação” de Marina e mandou que ela se “colocasse no seu lugar”.
“O senhor gostaria é que eu fosse uma mulher submissa e eu não sou”, retrucou Marina Silva, em um dos momentos mais tensos da sessão.
A gota d’água
O episódio que levou à saída definitiva da ministra envolveu o senador Plínio Valério (PSDB-AM), que protagonizara anteriormente declarações polêmicas contra Marina. “A mulher merece respeito, a ministra não”, declarou Valério durante a sessão.
Marina Silva imediatamente exigiu um pedido de desculpas, lembrando que o senador já havia feito ameaças contra ela em março deste ano, quando disse publicamente ter tido vontade de “enforcá-la”. Como Valério se recusou a se desculpar, a ministra decidiu se retirar.
“Sou ministra de Meio Ambiente, foi nessa condição que eu fui convidada e ouvir um senador dizer que não me respeita como ministra, eu não poderia ter outra atitude”, declarou Marina em coletiva após deixar a audiência.
Histórico de hostilidade
Este não foi o primeiro embate público entre Marina Silva e Plínio Valério. Em março de 2025, durante um evento da Fecomércio no Amazonas, o senador afirmou que participar de uma audiência com a ministra por “seis horas e dez minutos” lhe deu vontade de “enforcá-la”.
A declaração gerou ampla reprovação, levando deputadas de nove partidos a apresentarem uma denúncia contra Valério no Conselho de Ética do Senado por incitação à violência e violência de gênero. Mesmo diante das críticas, o senador se recusou a se retratar, alegando que foi “apenas uma brincadeira”.
Defesa institucional
Senadores governistas saíram em defesa de Marina Silva. Rogério Carvalho (PT-SE) classificou as manifestações de desrespeito como “inaceitáveis” em um debate institucional, enquanto a senadora Eliziane Gama criticou a forma como a ministra estava sendo tratada.
A ministra das Mulheres, Márcia Lopes, também se manifestou, qualificando o episódio como “completo absurdo” e “misógino”, pedindo responsabilização dos parlamentares envolvidos.
A agenda por trás do conflito
A audiência evidenciou as tensões em torno de projetos desenvolvimentistas na Amazônia. Senadores da região Norte têm pressionado pela liberação de obras como a BR-319, considerada estratégica para a logística regional, mas que enfrenta resistência de órgãos ambientais devido aos potenciais impactos em unidades de conservação e comunidades indígenas.
Marina Silva defendeu o trabalho do Ministério do Meio Ambiente, afirmando que entre 2023 e 2025 já foram concedidas 1.250 licenças ambientais, sendo mais da metade para a Petrobras. “Ao defender o meio ambiente eu estou defendendo os interesses estratégicos do Brasil”, declarou.
Consequências políticas
Após a saída de Marina Silva, o presidente da Comissão de Infraestrutura, Marcos Rogério, anunciou que pautará na próxima sessão uma convocação formal da ministra, mecanismo mais rígido que obriga o comparecimento.
O episódio ocorre em um momento de pressão sobre a política ambiental do governo, com o Senado tendo aprovado na semana passada, com ampla maioria, a Lei Geral do Licenciamento Ambiental, conhecida pelos ambientalistas como “PL da Devastação” por flexibilizar regras de proteção ambiental.