O Supremo Tribunal Federal decidiu, nesta quinta-feira (13/02), que a administração pública não tem obrigação de provar que não houve falhas na fiscalização de empresas terceirizadas. A decisão afasta a responsabilidade do poder público em relação ao pagamento de encargos trabalhistas.
A questão foi debatida no Recurso Extraordinário (RE) 1298647, com repercussão geral reconhecida (Tema 1118), em que o estado de São Paulo questionou decisão do Tribunal Superior do Trabalho que o responsabilizou subsidiariamente por parcelas devidas a um trabalhador contratado por prestadora de serviço.
O julgamento começou na quarta-feira (12/02) e foi encerrado nesta quinta(13/02). A maioria do plenário seguiu o entendimento do relator, ministro Nunes Marques, que acolheu o recurso e defendeu que cabe ao autor da ação trabalhista (empregado, sindicato ou Ministério Público do Trabalho) provar falhas no cumprimento dos contratos.
No caso concreto, Marques foi acompanhado pelos ministros Flávio Dino, Luís Roberto Barroso, Cristiano Zanin, Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes e pela ministra Cármen Lúcia. Divergiram os ministros Edson Fachin e Dias Toffoli.
Em relação à tese da repercussão geral, os ministros Cristiano Zanin e Flávio Dino defenderam que fosse incluída a previsão do art. 818 da CLT e art. 373 do Código de Processo Civil, que prevê a possibilidade do juiz distribuir o ônus da prova.
Já o ministro Edson Fachin, que abriu divergência, argumentou que é dever do poder público provar que fiscalizou as contratações. Ele foi acompanhado pelo ministro Dias Toffoli.
Foi fixada a seguinte tese:
1. Não há responsabilidade subsidiária da Administração Pública por encargos trabalhistas gerados pelo inadimplemento de empresa prestadora de serviços contratada, se amparada exclusivamente na premissa da inversão do ônus da prova, remanescendo imprescindível a comprovação, pelo empregado, da efetiva existência de comportamento negligente ou nexo de causalidade entre o dano por ele invocado e a conduta comissiva ou omissiva do poder público. do art. 818 da CLT e art. 373 do Código de Processo Civil
2. Haverá comportamento negligente quando a Administração Pública permanecer inerte após o recebimento de notificação formal e fundamentada de que a empresa contratada está descumprindo suas obrigações trabalhistas, notadamente o pagamento, enviada pelo trabalhador, sindicato, ministério do Trabalho, ministério Público, Defensoria Pública ou outro meio idôneo.
3. Constitui responsabilidade da administração pública garantir as condições de segurança, higiene e salubridade dos trabalhadores quando o trabalho for realizado em suas dependências ou local convencionado em contrato nos termos do artigo 5a, do parágrafo 3, da lei 6.019, de 1974.
4. Nos contratos de terceirização, a Administração Pública deverá: (i) exigir da contratada a comprovação de capital social integralizado compatível com o número de empregados, na forma do art. 4º-B da lei 6.019/74; e (ii) adotar medidas para assegurar o cumprimento das obrigações trabalhistas pela contratada, na forma do art. 121, § 3º, da lei 14.133/21, tais como condicionar o pagamento à comprovação de quitação das obrigações trabalhistas do mês anterior.”
Voto do relator
O relator, ministro Nunes Marques, lembrou que a jurisprudência do STF, firmada no julgamento da Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) 16 e do RE 760931 (Tema 246), afasta a responsabilização automática da Administração Pública e condiciona sua condenação a prova inequívoca de sua falha na fiscalização dos contratos de terceirização.
No entendimento do ministro, a transferência da responsabilidade para a Administração Pública não pode ser baseada apenas em presunção de culpa, mas sim em provas concretas. E a obrigação de provar falha na fiscalização é da parte autora da ação (empregado, sindicato ou Ministério Público do Trabalho).
“A autoridade administrativa não está dispensada do ônus da prova, mas cabe ao autor da impugnação demonstrar as irregularidades alegadas, de modo que a presunção de legalidade prevalece até que se prove de forma idônea e refutável o contrário”, afirmou o relator em seu voto.
Para o relator, caso a administração não tome nenhuma medida após ser notificada de que a empresa contratada está descumprindo suas obrigações, estará caracterizada sua omissão.
Divergência
O ministro Edson Fachin, que inaugurou a divergência, argumentou que o ônus da prova não pode recair sobre o trabalhador e que é dever do poder público provar que fiscalizou as contratações.
“Cabendo à Administração Pública, que detém todos os meios legais e institucionais para isso, o dever legal de fazer prova de que agiu de acordo com a lei no momento da contratação, quanto nos momentos próprios de fiscalização”, afirmou.