Por Carolina Villela
O ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), pediu vista nesta sexta-feira (5) e suspendeu o julgamento que discute a constitucionalidade da regra do Estatuto da Pessoa Idosa (Lei 10.741 de 2003) que proíbe a discriminação nos planos de saúde pela cobrança de valores diferenciados em razão da idade. A decisão também abrange a aplicação da norma aos contratos celebrados e aperfeiçoados antes de sua vigência, tema central da Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) 90.
A sessão virtual estava sendo analisada com previsão de término nesta sexta-feira (5), mas com o pedido de vista de Dino não há data prevista para retomada do julgamento. Antes da suspensão, o relator ministro Dias Tóffoli havia declarado a constitucionalidade da Lei 10.741/2003, porém com interpretação conforme a Constituição Federal, preservando contratos anteriores ao estatuto e evitando aplicação retroativa da norma.
Placar até o momento
O voto de Tóffoli estabelece que o Estatuto da Pessoa Idosa deve ser aplicado apenas aos contratos firmados após sua vigência, em 2003, preservando assim os acordos anteriores que foram celebrados sob outras regras jurídicas.
O relator foi seguido integralmente pelos ministros André Mendonça e Cristiano Zanin no entendimento sobre a constitucionalidade da norma com ressalvas temporais.
O ministro Gilmar Mendes também acompanhou o voto do relator, porém apresentou ressalvas ao posicionamento adotado pela relatoria. Ele defendeu a possibilidade de aplicação do § 3º do art. 15 da Lei 10.741/2003 também aos contratos firmados antes de sua vigência, desde que tenham sido renovados após sua entrada em vigor.
Setor empresarial questiona aplicação retroativa
A Confederação Nacional das Empresas de Seguros Gerais, Previdência Privada e Vida, Saúde Suplementar e Capitalização (CNSEG) moveu a ação questionando especificamente a aplicação do estatuto a contratos celebrados antes de sua vigência. A entidade argumenta que a vedação de reajustes etários em contratos preexistentes viola princípios constitucionais fundamentais.
Segundo a confederação empresarial, aplicar normas posteriores à celebração contratual compromete gravemente a segurança jurídica e atinge direitos adquiridos, atos jurídicos perfeitos e o princípio da livre iniciativa empresarial. O setor defende que contratos firmados sob regras vigentes à época devem ser respeitados integralmente, sem submissão posterior a obrigações não previstas no momento da contratação original.
A argumentação da CNSEG baseia-se no entendimento de que a retroatividade da lei geraria instabilidade no mercado de seguros e planos de saúde, afetando o equilíbrio econômico-financeiro de contratos já estabelecidos. O setor empresarial sustenta que a aplicação retrospectiva criaria precedente perigoso para outros ramos da economia.
Tóffoli fundamenta decisão em princípios constitucionais
O ministro Dias Tóffoli fundamentou seu voto destacando que o Estatuto da Pessoa Idosa consolida disposições já estabelecidas na Constituição de 1988, na Declaração dos Direitos Humanos, na Política Nacional do Idoso e no Plano Internacional para o Envelhecimento. O relator enfatizou que a legislação destina-se especificamente a regular direitos e garantias da população com 60 anos ou mais.
Tóffoli ressaltou que a norma questionada está plenamente de acordo com princípios e valores constitucionais vigentes, desde que sua aplicação seja restrita aos contratos posteriores à vigência legal, resguardando o que foi estabelecido entre as partes e as normas vigentes no período da celebração do ajuste original.
“Isso porque, como exaustivamente demonstrado até aqui, na linha da jurisprudência firmada pela Corte, não se admite a incidência das normas do Estatuto da Pessoa Idosa aos contratos firmados antes de sua vigência – nem mesmo para se alcançarem os efeitos pendentes de tais contratos”, afirmou o ministro em seu voto.
Proteção legal permanece para situações abusivas
A interpretação defendida pelo STF não elimina totalmente a proteção aos idosos portadores de contratos anteriores ao estatuto, conforme esclarecimentos apresentados pelo ministro relator. Segundo Tóffoli, a Procuradoria-Geral da República advertiu que a não aplicação temporal do estatuto não impede beneficiários idosos de questionarem reajustes abusivos das mensalidades por outros fundamentos jurídicos disponíveis no ordenamento.
O entendimento estabelece apenas que, em contratos celebrados antes de 2003, não constitui discriminação etária a cobrança diferenciada por idade, desde que essa prática tenha sido expressamente prevista nas condições contratuais originais. Isso significa que cláusulas abusivas ou práticas discriminatórias não previstas ainda podem ser contestadas.