Da Redação
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu recentemente, por unanimidade, que a pensão alimentícia pode ser mantida por prazo indeterminado mesmo após a exoneração judicial, caso o devedor tenha optado por continuar a pagá-la voluntariamente por diversos anos.
A decisão se dá dias depois de ter repercutido nacionalmente uma decisão da Justiça de Goiás que liberou um homem de pagar pensão à ex-esposa depois de mais de 30 anos de divórcio. E mostra bem as peculiaridades deste tipo de acordo após o fim de casamentos ou união estável, que devem ser observadas pelos magistrados caso a caso.
No processo em questão, a 3ª Turma do STJ deu provimento ao recurso especial de uma mulher para obrigar seu ex-marido a continuar pagando a pensão instituída após a separação.
Acordo após separação
O que aconteceu é que o casal, ao se separar, firmou um acordo para pagamento de pensão e de plano de saúde, homologado judicialmente em 1993, com prazo de um ano. Dois anos depois, foi ajustado novo pacto por prazo indeterminado, mas que não foi submetido à homologação.
O ex-marido continuou fazendo os pagamentos por mais de duas décadas. Até que, em 2018, ele ajuizou ação de exoneração, com o argumento de que sua capacidade financeira mudou e que precisava de recursos para bancar com um tratamento médico, não tendo mais condições de pagar a referida pensão.
A ex-esposa, por sua vez, sustentou que o recebimento da pensão era essencial devido à sua idade avançada. As instâncias ordinárias declararam extinta a obrigação de pensionamento. Foi quando a ex-mulher interpôs um recurso ao STJ.
‘Confiança gera dever’
Para a relatora do processo no STJ, ministra Nancy Andrighi, “a confiança gera o dever jurídico de não frustrar de forma injustificada as legítimas expectativas de terceiros”. De acordo com a magistrada, “no âmbito das relações familiares, a noção de confiança deve ser especialmente protegida, de forma que as condutas contrárias à confiança serão, em regra, também contrárias à boa-fé objetiva”.
“A tutela da confiança tem relevância ética e prática ao reconhecer efeitos derivados da inércia prolongada ou da prática reiterada”, frisou, ainda, a relatora. Nancy Andrighi enfatizou que esses institutos jurídicos funcionam como mecanismos de estabilização das expectativas sociais, ao evitar mudanças abruptas de conduta que frustrem a confiança legitimamente depositada.
Inércia prolongada
“A inércia prolongada do credor de alimentos em promover a execução da pensão em débito pode gerar, no devedor, a legítima expectativa de que a prestação não é mais necessária, conduzindo à estabilização da situação de inadimplemento”, enfatizou a ministra.
“Em sentido inverso, o alimentante que, mesmo exonerado, opta voluntariamente por continuar realizando os pagamentos, conduz ao alimentando a expectativa de continuidade da prestação, a qual pode tornar-se juridicamente relevante, especialmente diante da reiterada e sistemática manifestação de vontade”, afirmou a relatora.
No caso em questão, a ministra destacou que embora a ex-esposa tenha recebido pensão alimentícia por mais de 25 anos, não ficou caracterizada sua inércia em retomar a independência financeira, mas, sim, a do ex-marido, que, ao manter os pagamentos mensais por longo período, mesmo exonerado, gerou na alimentanda a expectativa de que o direito de exoneração não seria exercido. O número do processo não foi divulgado em razão de segredo judicial.
— Com informações do STJ