Por Carolina Villela
A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria para confirmar a decisão do ministro Dias Toffoli que anulou todos os atos praticados em processos e investigações contra o ex-ministro Antonio Palocci na operação Lava Jato. Toffoli foi seguido pelos ministros Gilmar Mendes e Nunes Marques, que desempatou o placar ao votar pela manutenção da decisão.
Já os ministros Edson Fachin e André Mendonça votaram contra a anulação, aceitando os argumentos da Procuradoria-Geral da República (PGR), mas ficaram vencidos no julgamento da Petição (PET) 13460, que ocorre no plenário virtual até o dia 22 de agosto. O julgamento havia sido suspenso em abril após pedido de vista de Nunes Marques.
Conluio entre Moro e Dallagnol fundamenta decisão
Toffoli reconheceu que houve conluio entre o ex-procurador Deltan Dallagnol e Sérgio Moro, então juiz titular da 13ª Vara Federal de Curitiba, contra Palocci. O ministro aplicou os mesmos critérios já adotados pelo STF ao reconhecer a parcialidade do ex-juiz em casos semelhantes.
Para fundamentar sua decisão, o relator utilizou os diálogos revelados pela Operação Spoofing, que demonstraram a atuação coordenada entre magistrado e procuradores da Lava Jato para prejudicar Palocci. “Diante do conteúdo dos frequentes diálogos entre magistrado e procurador especificamente sobre o requerente, em que o juiz chega a sugerir, inclusive, ‘um treinamento’ para que a procuradora do Ministério Público Federal tenha um melhor desempenho nas audiências de instrução envolvendo o requerente, fica clara a mistura da função de acusação com a de julgar”, afirmou Toffoli.
Prisão e ameaças como estratégia coordenada
Segundo Toffoli, os diálogos da Operação Spoofing revelaram “a extrema gravidade dos acontecimentos” e eventuais ilegalidades processuais que se projetam como reflexo da atuação coordenada entre acusação e magistrado. O ministro enfatizou que procurador da república e magistrado traçaram objetivos conjuntos para obter a condenação de seus alvos, passando a combinar estratégias e medidas contra Palocci.
A decisão aponta que “a prisão do requerente, a ameaça dirigida a seus familiares, a necessidade de produzir uma colaboração como condição para obter a liberdade, estão fartamente demonstradas nos diálogos obtidos por meio da Operação Spoofing”. Para o relator, diante dessa atuação conjunta e coordenada, não se pode falar em processo criminal propriamente dito, já que não houve defesa adequada.
Acordo de delação preservado pela decisão
O ministro ressaltou que a anulação dos atos processuais não afeta a validade do acordo de colaboração premiada firmado por Palocci. Toffoli esclareceu que “as nulidades reconhecidas nestes autos (decorrentes do conluio contra o ora agravado verificado perante a 13ª Vara Federal de Curitiba no contexto da Operação Lava Jato) não afetam a validade do acórdão de colaboração firmado pelo agravado, o qual não foi objeto da decisão ora questionada”.
Palocci havia sido condenado por condenado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro e fez acordo de colaboração com os investigadores.
Divergência sobre critérios de extensão
O ministro Edson Fachin, que votou contra a anulação, argumentou que não há identidade fática entre o caso de Palocci e os processos de Lula e Aldemir Bendine, ex-presidente da Petrobras, que serviram de referência para a decisão. Fachin ressaltou que, apesar de todos os casos envolverem a Operação Lava Jato, as provas são diferentes e específicas para cada situação.
“Não se pode, a pretexto de pedidos de extensão, examinar pedidos amplos e genéricos sobre as mais variadas investigações decorrentes da operação Lava Jato, ainda que sob o manto de concessão de habeas corpus de ofício, sob pena de violação ao juiz natural e as regras de competência”, argumentou Fachin. O ministro alertou para o risco de transformar o STF em “juízo universal de conhecimento”, função que não lhe foi atribuída pela Constituição Federal.
Para Fachin, a análise das provas obtidas no contexto da Lava Jato deve ser realizada pelas instâncias competentes, respeitando o devido processo legal, o juiz natural, o contraditório, a ampla defesa e a vedação de utilização de provas obtidas ilicitamente.
O ministro André Mendonça seguiu o mesmo entendimento por entender que o Supremo, com a justificativa de extensão da decisão, não deveria entrar no mérito de ampla gama de pedidos “elaborados por diversas partes e com relação apenas indireta quanto à decisão paradigma, os quais deveriam ser apreciados nas instâncias ordinárias, sob o risco de que se viole o princípio do juiz natural e se transforme este Tribunal em verdadeiro juízo universal”.