Os valores dos investidores depositados na conta de uma corretora falida não pertencem ao patrimônio dessa corretora e podem ser restituidos. O entendimento foi adotado pelo Superior Tribunal de Justiça, durante avaliação de um processo no qual os valores pedidos pelo autor da ação não chegaram a ingressar no patrimônio da corretora.
O julgamento foi realizado na 3ª Turma do STJ, por meio do Recurso Especial (Resp) 2.110.188, no qual os ministros do colegiado mantiveram decisão de segunda instância e autorizaram a restituição dos recursos ao investidor.
O caso que levou ao litígio foi ação ajuizada na origem por um investidor que tentava receber a devolução do dinheiro que havia sido depositado para a compra de títulos e valores mobiliários. De acordo com o autor do processo, quando a liquidação judicial da corretora foi decretada, ela estava de posse do seu dinheiro.
Em primeira instância, o juiz negou o pedido com a justificativa de que o investidor assumiu riscos ao deixar o dinheiro na conta da corretora como se fosse uma conta-corrente. O autor da ação recorreu e, em segunda instância, o tribunal local determinou a restituição dos valores custodiados pela empresa falida, conforme estabelece a Lei 11.101/2005 — que regula a recuperação judicial, a extrajudicial e a falência de empresários e de sociedade empresária.
O caso subiu para o STJ, onde os advogados da massa falida argumentaram, durante recurso ajuizado na Corte, que os casos de restituição de valores na falência são taxativos, razão pela qual a empresa não deveria ser obrigada a fazer essa devolução. A defesa da empresa também afirmou que quando o investidor fez o depósito, o dinheiro foi efetivamente transferido para sua conta e a então corretora passou a ter disponibilidade sobre tais recursos, de modo que o investidor deveria ser incluído na falência como credor quirografário.
Diferenças
Para o relator do recurso no STJ, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, embora as corretoras também sejam consideradas instituições financeiras, elas atuam no mercado de capitais principalmente executando ordens de compra e venda de ativos para seus clientes. E apesar de administrarem fundos de investimentos, essas empresas não agem em nome próprio e não estão autorizadas a realizar financiamentos ou empréstimos.
De acordo com o ministro, “os investidores não podem operar com valores mobiliários diretamente, sendo necessária a intermediação de uma instituição habilitada, que pode ser uma corretora ou uma distribuidora de títulos, para executar a ordem de compra e venda”. Por isso, ressaltou o magistrado, a intermediação feita pelas corretoras de valores no mercado de capitais é diferente da realizada pelos bancos comerciais no mercado financeiro em sentido estrito. Conforme destacou Villas Boas Cuêva, “enquanto os valores depositados integram o patrimônio dos bancos, o dinheiro custodiado pelas corretoras não faz parte de seu patrimônio”.
Segundo o ministro relator, a jurisprudência do STJ considera que, em caso de falência de instituição financeira, os valores depositados em conta integram seu patrimônio e não podem ser restituídos, pois são uma espécie de empréstimo do correntista ao banco. Mas, por outro lado, a Súmula 417, do Supremo Tribunal Federal, admite a restituição de recursos financeiros que estejam em poder do falido, embora tenham sido recebidos em nome de terceiros, ou dos quais ele não possa dispor em razão de lei ou contrato. Sendo assim, “as quantias mantidas em conta de registro podem ser objeto de pedido de restituição na falência, conforme a Lei 11.101/2005”.