Da redação
O ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF), anulou uma decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que havia considerado ilícita a utilização de Relatórios de Inteligência Financeira (RIFs) do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) requisitados sem autorização judicial. O caso envolve investigações da Polícia Federal sobre um esquema de tráfico de drogas em Mato Grosso do Sul. A decisão foi proferida na Reclamação (Rcl) 81994, ajuizada pela Procuradoria-Geral da República (PGR).
A medida reafirma o entendimento consolidado pelo Supremo de que órgãos de investigação criminal podem ter acesso aos relatórios do Coaf de forma oficial, no contexto de investigações em andamento, sem necessidade de prévia autorização judicial. Para Fux, a decisão do STJ contrariou essa jurisprudência, colocando em risco investigações complexas sobre crimes financeiros e organizações criminosas.
Operação Sordidum e esquema internacional de lavagem
O objeto da reclamação foi uma decisão do STJ que concedeu habeas corpus à defesa de A.S., denunciado junto com outras pessoas na Operação Sordidum. O investigado é acusado de dissimular a origem e a movimentação de valores provenientes do tráfico internacional de drogas, além de outros crimes, praticados entre 2020 e 2024. Segundo a denúncia apresentada pelo Ministério Público, o grupo criminoso utilizava uma empresa imobiliária como fachada para ocultar recursos ilícitos.
A organização investigada contava com 16 denunciados e tinha ramificações internacionais. As investigações revelaram operações transnacionais sofisticadas, com transações financeiras realizadas por meio de doleiros no Paraguai. O esquema também incluía o envio de drogas para países da América Central, como Guatemala e Honduras, configurando uma rede complexa de tráfico internacional.
Na Reclamação apresentada ao STF, a PGR sustentou que a decisão do STJ desconsiderou quatro anos de investigações de alta complexidade conduzidas pela Polícia Federal. Segundo a Procuradoria, o entendimento adotado pelo tribunal superior contrariou a jurisprudência do Supremo, que reconhece a validade do compartilhamento de relatórios do Coaf sem prévia autorização judicial quando destinados a órgãos de investigação criminal.
Supremo reafirma Tema 990 da repercussão geral
Ao acolher o pedido da PGR, o ministro Luiz Fux fundamentou sua decisão no julgamento do Tema 990 da repercussão geral, no qual o STF estabeleceu que é permitido o compartilhamento de relatórios do Coaf com órgãos de investigação criminal. A única exigência é que o compartilhamento ocorra de forma oficial e dentro do contexto de uma investigação em andamento, dispensando autorização prévia do Poder Judiciário.
Para o ministro, a decisão do STJ que concedeu o habeas corpus destoa frontalmente desse entendimento consolidado. Fux destacou que a jurisprudência do Supremo busca equilibrar o direito à privacidade dos investigados com a necessidade de instrumentos eficazes para o combate a crimes financeiros complexos, especialmente aqueles relacionados a organizações criminosas e ao tráfico internacional de drogas.
Segundo caso reforça entendimento e preserva recuperação de R$ 120 milhões
O ministro Fux aplicou o mesmo raciocínio jurídico na análise da Reclamação Rcl 82134, proposta pelo Ministério Público do Estado de São Paulo (MP-SP). Neste caso, o MP-SP questionava decisão do STJ que considerou inadmissível a solicitação de RIFs ao Coaf diretamente pela Polícia Federal, sem intermediação judicial.
A investigação objeto desta reclamação buscava apurar crimes de financiamento do tráfico de drogas e lavagem de dinheiro, tendo como crime antecedente um delito contra a ordem tributária. Tratava-se de uma operação complexa envolvendo a atuação do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), braço especializado do Ministério Público paulista.
Segundo informações do MP-SP, a decisão do ministro Fux tem impacto direto na recuperação de ativos da ordem de R$ 120 milhões no âmbito das investigações conduzidas pela Polícia Federal. Os recursos seriam provenientes de atividades criminosas e estavam sendo rastreados por meio dos relatórios de inteligência financeira do Coaf.