Por Hylda Cavalcanti
O ministro Gilmar Mendes, decano do Supremo Tribunal Federal (STF) entrou com tudo no epicentro da crise política e diplomática do país. Mendes declarou nesta quinta-feira (10/07), que o Brasil passa por um “capítulo inédito na história da resistência democrática”. Afirmou que nenhuma outra democracia contemporânea enfrentou “uma tentativa de golpe de Estado em plena luz do dia”. Horas depois, os senadores Eduardo Girão (Novo-CE) e Magno Malta (PL-ES) protocolaram no Senado mais um pedido de impeachment contra o magistrado.
A fala do ministro, que já avisou por meio do seu gabinete que não vai se manifestar sobre o pedido protocolado pelos parlamentares, ressoou entre o Congresso, o Governo Federal e até nos Estados Unidos. As palavras foram proferidas por meio de nota publicada em sua conta na rede social X (antigo Twitter), horas após o presidente daquele país, Donald Trump, ter anunciado a imposição de tarifas sobre produtos vendidos pelo Brasil e ter criticado as decisões do STF.
Campanha de desinformação
Acostumado a expor o que pensa e do tipo que sempre fugiu da máxima de que os magistrados só devem falar pelos autos, Mendes ressaltou, ainda, que nenhum outro parlamento presenciou “uma campanha colossal de desinformação perpetrada por empresas de tecnologia” como o Congresso Nacional. E que “nenhuma outra Suprema Corte sofreu ataques tão virulentos à honra de seus magistrados” como o STF.
O ministro citou a investigação que está sendo feita pelo Supremo sobre a tentativa de golpe, onde se apura a participação na sua organização, do ex-presidente Jair Bolsonaro e seus aliados. Acrescentou que a iniciativa incluiu um plano de assassinato do ministro Alexandre de Moraes, seu colega na Corte. E enfatizou que a ação “foi orquestrada e planejada por grupos extremistas que se valeram indevidamente da imunidade irrestrita das redes sociais”.
“Democracia combativa”
No tocante ao Congresso Nacional, Mendes abordou campanha feita pelas redes sociais contra o Projeto de Lei (PL) conhecido como ‘PL das Redes’, que previa novas regras de responsabilidade para as plataformas. E disse que “as companhias sabotaram o debate democrático sobre modernização dos marcos regulatórios utilizando expedientes de mentiras e narrativas alarmistas”.
“Essas singularidades definem o momento histórico da democracia combativa brasileira: quando a defesa irredutível de preceitos constitucionais se transforma em imperativo civilizatório diante de forças que ameaçam não apenas as instituições nacionais, mas o próprio conceito de Estado de Direito no século XXI. O que se escreve no Brasil hoje é um verdadeiro capítulo inédito na história da resistência democrática”, acrescentou o ministro.
Impulsividade ou acerto?
Em reservado, o que se comentava antes dessas declarações era que os ministros do STF tinham feito um acordo com o presidente Lula no sentido de que somente o Governo Federal se manifestaria em relação às medidas de Donald Trump. Porém, alguns políticos e observadores do Judiciário próximos ao ministro avaliam que pode ter sido combinado posteriormente que, por se tratar do decano da Corte, seria importante ele se posicionar.
Muita gente duvida e acha que as declarações são resultado da personalidade impulsiva do próprio ministro. Até porque o presidente do STF, ministro Luís Roberto Barroso, não costuma abrir mão de suas prerrogativas sempre que precisa passar um recado sobre críticas e ataques feitos ao Tribunal.
Cerca de duas horas após as críticas de Mendes aos grupos de direita, Girão e Malta protocolaram no Senado o pedido de impeachment do ministro.
Parcialidade e irregularidades
Em nota divulgada em seguida pelo Partido Novo, integrantes da legenda fizeram várias acusações ao decano do STF. Dentre elas, a de ter “julgado processos de forma parcial, ter participado de ações políticas e ter agido de forma incompatível com a honra do cargo que ocupa”. Destacaram que todas essas ações do ministro são “irregulares” e configuram “crime de responsabilidade”.
Dentre os casos citados como “irregularidades”, constam a posição de Mendes na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7580 julgada pelo STF, que reconduziu Ednaldo Rodrigues à função de presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) em 2024.
Parceria com a CBF
No documento, o partido Novo e os senadores afirmaram que o ministro deveria ter se considerado impedido no julgamento do caso, uma vez que a CBF possui parceria com o Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP) — entidade fundada por ele e presidida pelo seu filho.
Também mencionaram a participação do magistrado no evento de entrega de uma estrada em Mato Grosso, em dezembro do ano passado, na presença do seu irmão, Francisco Mendes, prefeito eleito do município de Diamantino (MT).