Por Hylda Cavalcanti
A indicação do desembargador federal Carlos Pires Brandão para uma das vagas no Superior Tribunal de Justiça (STJ) feita na noite desta terça-feira (27/05) pelo presidente Lula está sendo analisada por muita gente como repleta de significados, principalmente do ponto de vista político.
O presidente já deixou claro que defende as mulheres e apoia o aumento da presença feminina nos tribunais superiores, mas dentro dos limites estabelecidos por ele. Nunca escondeu, em conversas entre magistrados e integrantes do governo que convivem em seu entorno, que pensava seriamente em escolher Carlos Brandão para uma das vagas.
Por outro lado, como se esperava que o primeiro anúncio fosse de uma mulher, na lista de representantes do Ministério Público, e isso não aconteceu, o presidente parece mandar um recado subliminar para o pessoal do Centrão, que insiste em incluir o tema nas conversas políticas desenvolvidas em Alagoas sobre as eleições de 2026.
Articulações alagoanas
Isto porque, o nome mais cotado para a cadeira é da procuradora Maria Marluce Caldas, de Alagoas. Marluce é considerada uma profissional destacada, competente e detentora de grande conhecimento jurídico, mas sua indicação pode não ser puramente técnica, uma vez que vem de família política. Seu sobrinho é o atual prefeito de Maceió, João Henrique Caldas.
O que se comenta há meses nos bastidores é que seu nome está envolvido nas negociações em curso na política alagoana. Dependendo do acerto a ser feito, João Henrique, que foi reeleito no ano passado, trocará o partido atual, o PL, pelo PSB, e concorrerá a governador de Alagoas na chapa de Lula à reeleição. Mas para isso, o Palácio do Planalto precisa garantir que o atual ministro dos Transportes, Renan Calheiros Filho, senador do MDB, abrirá mão de entrar na disputa.
Renanzinho, como é mais conhecido, é senador até 2030, mas sempre deixou claro que pretende voltar a governar o estado. Uma conciliação entre o grupo do atual prefeito de Maceió, que é ligado ao deputado federal e ex-presidente da Câmara Arthur Lira (PP/AL), e o grupo dos Calheiros, adversários dos Lira em Alagoas, dificilmente ocorrerá, embora esteja sendo costurada por várias lideranças políticas do estado.
Fala-se inclusive, que se a tentativa não for bem sucedida, em vez do PSB, João Henrique Caldas tende a migrar para outra legenda e poderá não integrar a chapa de Lula. No meio disso tudo, está a escolha de Marluce Caldas que, a depender das divergências que o sobrinho venha a ter com o Governo Federal, pode não ser indicada para o STJ.
Outro homem?
O presidente demorou sete meses para fazer a primeira indicação. Muita gente aposta que, em função de todas as questões que envolvem Alagoas e depois das duas listas tríplices aprovadas nesta quarta-feira (28/05) para novas vagas no Tribunal Superior Eleitoral incluindo uma só de mulheres, ele pode optar por outro homem para o STJ.
Até porque a lista tríplice com nomes do Ministério Público a serem escolhidos para a outra vaga ao STJ é formada, além de Marluce, por outros dois homens. E os dois nomes masculinos da lista contam com apoios de parlamentares e de outros ministros de tribunais superiores.
São eles Sammy Barbosa Lopes, do Ministério Público do Acre; e Carlos Frederico Santos, do Ministério Público Federal. Ou seja: o presidente pode enfrentar, novamente, pressão dos coletivos femininos que sempre o apoiaram e pedem por mais representatividade feminina no Judiciário.
Perfil articulado
Carlos Brandão, atual desembargador do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF 1), sediado em Brasília, é do tipo simpático entre os colegas, mas de posições firmes durante as sessões e discreto na mídia. Não é muito afeito a entrevistas, mas é considerado um bom articulador entre políticos e representantes do Judiciário como um todo.
Nascido em Teresina (PI) ele se formou primeiro como engenheiro elétrico e depois cursou Direito, tendo se formado em 1993. Na carreira de juiz federal, foi promovido a desembargador pelo critério de merecimento, há 10 anos, na vaga decorrente da ascensão do então desembargador federal Reynaldo Soares da Fonseca ao cargo de ministro do STJ.
Antes disso, atuou como desembargador federal convocado do TRF 1, o que lhe rendeu, além de mais experiência, uma vasta coleção de amizades. Dentre seus apoiadores está o conterrâneo Kassio Nunes Marques, hoje ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), ex-desembargador federal do TRF 1 como ele.
O desembargador é mestre em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE); especialista em Direito Constitucional pela UFPI/ESAPI/OAB-PI, Brasil e bacharel em Ciências Jurídicas pela Universidade Federal do Piauí (UFPI). Foi diretor do Foro da Seção Judiciária do Piauí (SJPI), juiz membro do Tribunal Regional Federal Eleitoral do Piauí e coordenador dos Juizados Especiais Federais da 1ª Região (Cojef/TRF1).
Atualmente, é coordenador do Sistema de Conciliação da Justiça Federal da 1ª Região (SistCon/TRF1) e da Rede de Inteligência da 1ª Região (Reint1).
Posições jurídicas
Nos julgamentos que relatou até hoje, tem se posicionado de forma favorável à flexibilidade para discordar das conclusões de comissão de concurso quando os documentos apresentados por candidatos mostram claramente que as características fenotípicas se enquadram no conceito de negro.
Também costuma afirmar que contratos de prestação de serviços de advocacia e assessoria jurídica preveem obrigação e que os advogados devem prestar aos clientes “as atividades ali descritas, desatreladas à obtenção de um resultado específico”.
Destaca sempre que a jurisprudência pressupõe que a responsabilidade civil subjetiva do advogado, por inadimplemento de suas obrigações, “depende da demonstração de ato culposo ou doloso, do nexo causal e do dano causado a seu cliente”.
Sensível a causas sociais referentes a estudantes e questões envolvendo entes familiares dos jurisdicionados, Carlos Brandão foi responsável, nos últimos meses, por decisões emblemáticas que resultaram em autorizações para transferências de estudantes de uma universidade pública para outra de estado diferente e em determinação ao Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) para que mantenha bolsas de estudantes que não conseguiram mais arcar com as despesas da universidade.
Assim como por autorizações judiciais sobre situações delicadas, como a que permitiu uma pessoa retirar o FGTS para arcar tratamento de doença grave da mãe. Muitos magistrados mudam de posição depois que sobem para os tribunais superiores, mas essa não tem sido a regra. Em geral, os mesmos entendimentos observados durante suas atuações em segunda instância, seguem para as Cortes superiores. É o que se espera, agora, do futuro ministro.