Presidente brasileiro evita citar Trump, mas denuncia presença militar dos EUA na costa da Venezuela; discurso também abordou criminalidade, integração regional e igualdade de gênero
Durante a cúpula da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac) com a União Europeia, realizada neste domingo (9), em Santa Marta, na Colômbia, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) fez duras críticas à crescente militarização da América Latina e ao que classificou como uma ameaça à paz regional.
Sem mencionar diretamente o ex-presidente norte-americano Donald Trump, Lula condenou o uso da força militar como instrumento político e alertou para o retorno de discursos que justificam ações ilegais sob o pretexto de combate ao crime.
Rejeição à força militar e defesa do direito internacional
O presidente brasileiro destacou a presença de embarcações militares dos Estados Unidos nas águas do Caribe e próximas à Venezuela como exemplos de uma postura intervencionista que ameaça a soberania regional.
“A ameaça de uso da força militar voltou a fazer parte do cotidiano da América Latina e do Caribe”, afirmou. “Velhas manobras retóricas são recicladas para justificar intervenções ilegais.”
Lula reforçou que a América Latina é uma região de paz e deve continuar sendo. Para ele, democracias não podem combater o crime violando normas internacionais.
Pressões internas e cautela diplomática
Segundo apuração do Valor, o presidente foi aconselhado por assessores a evitar manifestações explícitas de apoio à Venezuela neste momento. O objetivo seria evitar atritos com os Estados Unidos, que elevaram tarifas de importação e estão em processo de negociação comercial com o Brasil.
Apesar disso, Lula manteve uma postura crítica ao que vê como unilateralismo e reforçou a necessidade de diálogo multilateral para enfrentar desafios comuns.
Falta de integração e ausência de lideranças
No mesmo discurso, o presidente brasileiro lamentou a estagnação dos processos de integração latino-americanos. Criticou a ausência de chefes de Estado nas reuniões regionais e o que chamou de “rituais vazios” em cúpulas multilaterais.
“Vivemos de reunião em reunião, repletas de ideias e iniciativas que muitas vezes não saem do papel”, pontuou.
Lula avaliou que a América Latina passa por um momento de balcanização, com divisões internas crescentes e uma inclinação maior para agendas externas do que para projetos comuns da região.
Crime organizado como desafio conjunto
Parte importante da fala do presidente foi dedicada à segurança pública. Lula defendeu que o combate ao crime organizado exige ação coordenada entre os países da região.
“Ações conjuntas, intercâmbio de informações e operações coordenadas são fundamentais”, destacou. Citou como exemplo o Comando Tripartite da Tríplice Fronteira entre Brasil, Argentina e Paraguai, recentemente renovado.
Lula ainda afirmou que não há solução mágica para enfrentar a criminalidade, mas que a repressão a lideranças criminosas, o rastreamento financeiro e o combate ao tráfico de armas são prioridades.
COP30 e comércio internacional
O presidente também aproveitou para destacar a importância da COP30, que será realizada em Belém, no Pará. Disse que o evento será uma oportunidade para a América Latina mostrar sua contribuição na preservação ambiental.
Lula voltou a defender o Fundo de Florestas Tropicais para Sempre, mecanismo que, segundo ele, valoriza a manutenção das florestas em pé.
Em relação ao acordo Mercosul-União Europeia, Lula expressou otimismo e disse esperar um desfecho positivo na próxima reunião do bloco sul-americano, em dezembro.
Igualdade de gênero e representação feminina
Por fim, o presidente defendeu a igualdade de gênero e criticou a invisibilidade do trabalho de cuidado, feito majoritariamente por mulheres.
“Ainda não houve uma mulher latino-americana como Secretária-Geral da ONU. É hora de mudar isso”, declarou.



