Da Redação
Quase dois anos após a sanção da Lei nº 14.711/2023, conhecida como Marco Legal das Garantias, o mercado financeiro experimenta transformação significativa com o julgamento do Supremo Tribunal Federal no RE 1.432.027. A decisão reconheceu a constitucionalidade da busca e apreensão extrajudicial de bens móveis dados em garantia por alienação fiduciária.
A mudança permite que credores retomem veículos financiados sem necessidade de processo judicial. Antes, era obrigatório ajuizar ação, obter despacho judicial e aguardar que oficial de justiça localizasse o bem. Agora, todo procedimento pode ser feito diretamente via cartório, baseado no artigo 66-B da Lei nº 4.728/1965.
Modelo similar ao mercado imobiliário
O sistema reproduz o modelo já consolidado no financiamento imobiliário com alienação fiduciária. Quando o devedor deixa de pagar, o credor envia notificação via cartório de registro de imóveis e, se a dívida não for quitada, consolida a propriedade e leva o imóvel a leilão.
Esse procedimento explica por que contratos com alienação fiduciária se tornaram padrão no setor imobiliário. Agora, a mesma agilidade e menor custo devem expandir com força para o financiamento de veículos automotivos.
Redução dramática no risco de inadimplência
Segundo dados da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), atualmente os bancos recuperam apenas 18% das garantias em caso de inadimplência. Em mercados emergentes, essa média gira em torno de 43%. A retomada extrajudicial tem potencial para aproximar o Brasil desse padrão internacional.
Cerca de 57% do spread bancário no país decorre do risco de inadimplência. Quanto mais difícil recuperar um bem, mais oneroso será o crédito para o consumidor. A medida pode estimular oferta de financiamentos com juros mais baixos para contratos com garantia real.
Impacto imediato no setor automotivo
No setor automotivo, os efeitos devem ser imediatos. A previsibilidade jurídica trazida pela legislação deve gerar aumento significativo no número de contratos de financiamento com alienação fiduciária. Inicialmente, espera-se aumento nas apreensões de veículos, mas isso tende a se estabilizar.
Em médio prazo, o mecanismo servirá como estímulo à adimplência. O consumidor saberá que, se deixar de pagar, a retomada do bem será rápida e inevitável, alterando comportamentos em relação ao cumprimento dos contratos.
Nova lógica para escritórios de advocacia
Para escritórios especializados em crédito, a mudança é estratégica. A atuação se desloca da litigância tradicional para estruturação preventiva de garantias, gestão extrajudicial de inadimplência e recuperação de ativos com agilidade.
O Marco Legal representa mudança profunda na lógica da concessão e recuperação do crédito. Se bem aplicada, pode resultar em novo patamar de segurança jurídica, menor judicialização e mais equilíbrio nas relações contratuais no Brasil.