Há seis meses à frente do Tribunal Superior do Trabalho, o ministro Aloysio Corrêa da Veiga se prepara para o julgamento de ações relacionadas a temas polêmicos, como a situação das pessoas que atuam em aplicativos como Uber, Ifood e outras empresas semelhantes. O ministro defende que a solução para esses contenciosos pode ou não implicar na exigência de uma contratação pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). O importante é que as empresas e os trabalhadores paguem a Previdência Social, pois a falta de contribuições nestas áreas tem se transformado em uma grande bomba que explodirá futuramente no país, prejudicando a sociedade como um todo, destacou em entrevista exclusiva ao Hjur.
Veja os principais temas abordados na entrevista.
HJur: O sistema de precedentes ajudará a combater a chamada litigância abusiva observada hoje em todo o Judiciário?
Aloysio Corrêa da Veiga: O sistema de precedentes é importante para a celeridade, a redução da litigiosidade abusiva e a segurança jurídica nas relações de trabalho. O entendimento da maioria será aquele que determinará o comportamento. E isso, se observado por todos, trará duas coisas importantes. Em primeiro lugar, a autoridade da decisão. Em segundo lugar, o fato de que o Judiciário passará a ter maior credibilidade, sabendo-se que a interpretação da lei que se dará é aquela em que a maioria fixou.
HJur: Poderia dar exemplos sobre a efetividade do sistema de precedentes?
Corrêa da Veiga: Atualmente, 86% dos recursos que chegam ao TST são agravos de instrumento. Desse total, somente 6% são providos, ou seja, só esse percentual de recursos vai ser realmente julgado pelo TST. Isso significa que um volume de aproximadamente 400 mil processos não deveriam tramitar no Tribunal Superior do Trabalho.
HJur: E quanto ao impacto no aumento do número de teses vinculantes no TST?
Corrêa da Veiga: Somente este ano, o volume de teses vinculantes (entendimentos que devem ser aplicados pela magistratura trabalhista em todo o Brasil em casos similares) passou de 25 para mais de 90. Desde o ano passado, o TST tem intensificado esforços para fortalecer a sua atuação como Corte de precedentes, adotando mudanças normativas e novos ritos no julgamento de demandas repetitivas.
HJur: Uma de suas metas é o julgamento de questões relacionadas à reforma trabalhista. Quais os demais temas que a Corte está priorizando no momento?
Corrêa da Veiga: O ponto central da reforma trabalhista, que era a aplicação sobre os atuais contratos, já foi julgado. Concluímos com a tese dominante que nos contratos firmados antes da reforma e em vigência se aplicam as regras de 2017. O que está acontecendo é que, diante da cultura de precedentes que nós escalamos, vários incidentes de recursos repetitivos relacionados à relação de trabalho estão sendo apresentados ao TST, como pejotização, uberização e trabalhos por meio de outros aplicativos, por exemplo. É o que precisamos julgar daqui por diante.
HJur: Muitos especialistas chamam relações de trabalho formadas por pejotização, uberização e uso de outros aplicativos de bomba previdenciária. O que o senhor acha?
Corrêa da Veiga: É isso. Uma bomba mesmo. A questão é exatamente a seguinte: a Previdência Social é contributiva e compartilhada com a sociedade, porque se eu percebo como aposentado, como estou recebendo, alguém está pagando. Eu vou pagar para o aposentado hoje. E vou receber como aposentado de alguém que estará pagando a previdência no futuro. Esse é o sistema, então é necessário que a regra seja compartilhada para que todo mundo contribua para a Previdência Social. E é preciso entender o seguinte: seja empregado, não empregado, isso é o de menos. O importante é que cada um tem de contribuir.
HJur: Isso vai obrigar empresas como Uber, Ifood e outras do tipo a contratar seus trabalhadores e prestadores de serviços pela CLT?
Corrêa da Veiga: Vamos ter que avaliar os casos. Eu posso entender que o motorista do Uber não seja empregado, porque o trabalho realizado por ele é outra forma de prestação de serviço, mas tem de haver contribuição para a Previdência Social. E a plataforma tem de contribuir. O que é preciso evitar que aconteça é o que se vê hoje, de um camarada trabalhar 18 horas seguidas por dia para ganhar dinheiro a mais e quando sofre um acidente está desprotegido pela Previdência. Em São Paulo, nós temos atualmente duas pessoas morrendo por dia de acidente de Uber. E essas pessoas não têm qualquer tipo de proteção social.
HJur: A emenda constitucional 45 destacou a necessidade de ampliação da Justiça trabalhista, depois se falou em criação de mais tribunais, só que desde então muito pouco foi feito. Qual a sua opinião a respeito?
Corrêa da Veiga: Eu acho que quem tem que julgar as questões relacionadas ao Direito do Trabalho é a Justiça do Trabalho. E trabalho não é só a CLT. Trabalho é trabalho, nas mais diversas formas de prestação e atividades. Somos nós que precisamos decidir sobre esses temas.
HJur: O TST nem sempre foi tão uníssono. Já tivemos sessões tensas, com muitos debates sobre assuntos como horas extras, terceirização e pejotização. A que o senhor atribui o fato de a Corte estar mais unida atualmente?
Corrêa da Veiga: A uma maior abertura para o diálogo. Estamos muito abertos aos diálogos, às conversas, reuniões e avaliações. E tudo isso é muito importante, sobretudo para a avaliação dos processos e o ritmo dos julgamentos.