Por Carolina Villela
O Supremo Tribunal Federal (STF) iniciou nesta quinta-feira (16) o julgamento de duas Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) que questionam a concessão de benefícios fiscais a agrotóxicos no Brasil. As ações, relatadas pelo presidente da Corte, ministro Edson Fachin, colocam em debate a redução de 60% nas alíquotas do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) incidente sobre esses produtos.
O plenário examina a (ADI )7755, apresentada pelo Partido Verde, e a (ADI) 5553, ajuizada pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), que contestam cláusulas do Convênio 100/1997 do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) e outros dispositivos normativos.
O julgamento deve ser retomado na próxima sessão plenária, com o voto do relator Edson Fachin e demais ministros.
Questionamentos sobre o regime tributário diferenciado
A ADI 7755, relatada pelo ministro Edson Fachin, questiona especificamente cláusulas do Convênio 100/1997 do Confaz e dispositivos da Emenda Constitucional 132/2023. Essas normas estabeleceram um regime diferenciado de tributação para insumos agropecuários, determinando a redução de 60% nas alíquotas do ICMS incidente sobre agrotóxicos.
Os autores da ação argumentam que o benefício fiscal contraria princípios constitucionais de proteção ao meio ambiente e à saúde pública. Para os partidos, a desoneração tributária estimula o uso indiscriminado de defensivos agrícolas, agravando problemas ambientais e de saúde pública no país.
O Partido Verde sustenta que a política fiscal atual funciona como incentivo ao consumo de produtos potencialmente nocivos, contrariando o dever constitucional do Estado de proteger o meio ambiente e garantir condições adequadas de saúde à população brasileira.
PSOL amplia questionamento para IPI
A segunda ação sobre o tema, a ADI 5553, foi ajuizada pelo PSOL. O partido questiona não apenas o Convênio 100/1997 do Confaz, mas também dispositivos do Decreto 7.660/2011, que aprovou a tabela de incidência do Imposto Sobre Produtos Industrializados (IPI).
Segundo o PSOL, o convênio reduz em 60% a base de cálculo do ICMS sobre agrotóxicos e ainda autoriza os Estados a concederem isenção total do imposto. A legenda sustenta que essa política fiscal estimula o uso excessivo de defensivos agrícolas, comprometendo a saúde da população e o meio ambiente.
O partido argumenta que o Brasil já é um dos maiores consumidores de agrotóxicos do mundo e que a desoneração tributária agrava esse cenário, contrariando compromissos internacionais assumidos pelo país em matéria ambiental e de saúde pública.
Partido Verde critica dependência de importações
Lauro Rodrigues, advogado que falou pelo Partido Verde, iniciou a rodada de sustentações orais destacando que o programa de prevenção a agrotóxicos completou 50 anos em 2025, mas o país continua dependente da importação desses produtos. “Ou seja, o erário brasileiro financia diretamente a iniciativa privada estrangeira. Nós continuamos dependentes, um país de joelhos”, afirmou.
Rodrigues argumentou que a desoneração fiscal representa subsídio direto a empresas estrangeiras, sem que haja contrapartida em desenvolvimento tecnológico nacional.
O advogado criticou a ausência de citação da (ADPF) 910, julgada pelo STF há dois anos, que reconheceu os “nefastos efeitos do uso de agrotóxicos” e mencionou estudos que apontam prejuízos e impactos à saúde e ao meio ambiente pela exposição a agrotóxicos. Segundo Lauro, dados da Câmara dos Deputados, da Anvisa, do Ibama e do ministério da Agricultura, indicam falhas históricas na fiscalização e o aumento de 150% na comercialização de agrotóxicos entre 2007 e 2014, além de 84 mil casos de intoxicação notificados no período.
Ao finalizar sua sustentação, o representante do Partido Verde citou precedente da Corte Constitucional da Alemanha sobre a proteção ao meio ambiente equilibrado, defendendo a necessidade de mudança na política fiscal brasileira para defensivos agrícolas.
Agronegócio defende essencialidade dos defensivos
Representando a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), que atua como amicus curiae no processo, o advogado Rodrigo Oliveira apresentou argumentos contrários às ações. Ele defendeu que a discussão em torno da política de desoneração de defensivos agrícolas não viola o princípio da capacidade produtiva nem da seletividade tributária.
Oliveira sustentou que “os defensivos agrícolas não são itens de luxo, mas sim essenciais para a produção agrícola”. Segundo o advogado, o não uso desses produtos pode levar à redução de até 50% da produção agrícola nacional, comprometendo a segurança alimentar do país.
O representante da CNA alertou que uma possível declaração de inconstitucionalidade pelo Supremo pode aumentar em R$ 16 bilhões por ano o custo da produção alimentar no Brasil. O que teria efeito cascata sobre toda a cadeia produtiva, encarecendo alimentos e prejudicando especialmente as camadas mais vulneráveis da população, com o custo sendo repassado ao consumidor final.
A desoneração, portanto, segundo o defensor, tende a estabilizar os preços em patamares razoáveis e contribui para a justiça social e segurança alimentar.
Rodrigo Oliveira também contestou o argumento de que haveria violação ao meio ambiente, ressaltando que o sistema brasileiro de monitoramento e avaliação de defensivos agrícolas é um dos mais modernos do mundo. A entidade argumenta que o Brasil possui legislação específica e mecanismos de fiscalização adequados para garantir o uso seguro de defensivos