Por Carolina Villela
O Supremo Tribunal Federal (STF) adiou mais uma vez a conclusão do julgamento que define se o Estatuto do Idoso pode ser aplicado a contratos de planos de saúde firmados antes de outubro de 2003, quando a lei entrou em vigor. A decisão afeta milhares de beneficiários em todo o país e pode impedir que operadoras apliquem reajustes por faixa etária em contratos antigos.
A análise da Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) 90 foi interrompida após pedido de vista do ministro Alexandre de Moraes, que solicitou mais tempo para examinar o caso. Até o momento, três ministros já votaram seguindo o relator Dias Toffoli, que defende a constitucionalidade do Estatuto, mas com interpretação que exclui contratos anteriores a dezembro de 2003 da proteção legal. Em outubro, o STF já havia formado maioria para rejeitar reajustes abusivos ao julgar o Recurso Extraordinário (RE) 630852, que trata do mesmo tema.
A proclamação oficial do resultado será feita de forma conjunta, considerando que os dois casos tratam do mesmo assunto.
Ministros seguem relator e propõem modulação
Durante a sessão desta quarta-feira (5), os ministros Flávio Dino e Nunes Marques apresentaram seus votos acompanhando o relator Dias Toffoli pela constitucionalidade do Estatuto do Idoso. Dino destacou a importância do debate em um contexto de crescimento da população idosa e reformas previdenciárias que limitam o poder aquisitivo dessa faixa etária.
O ministro enfatizou quatro pontos fundamentais da questão: a natureza continuada da relação de consumo, a ausência de configuração de ato jurídico perfeito, a vulnerabilidade dos idosos como consumidores e o caráter de ordem pública do Estatuto. “Um dos deveres do Judiciário é evitar uma perversa expulsão do mercado”, afirmou Dino, referindo-se à necessidade de proteger os idosos de reajustes que inviabilizem a manutenção dos planos.
Flávio Dino também propôs a modulação dos efeitos econômicos da decisão, para que passem a valer somente após o julgamento final, evitando impactos retroativos.
Decisão de outubro já formou maioria contra reajustes
Em outubro, o Plenário do STF já havia formado maioria ao julgar o RE 630852, decidindo que operadoras não podem aplicar reajustes por faixa etária em contratos firmados antes da vigência do Estatuto do Idoso. Votaram contra a cobrança os ministros Edson Fachin, Cármen Lúcia, Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes, somando-se aos votos anteriores dos ministros aposentados Rosa Weber, Ricardo Lewandowski e Celso de Mello.
Ficaram vencidos os ministros Dias Toffoli e o aposentado Marco Aurélio, que se posicionaram favoravelmente ao recurso da operadora. Os ministros Flávio Dino, Cristiano Zanin e Nunes Marques não puderam participar daquele julgamento por terem assumido suas cadeiras após o início da análise. Luís Roberto Barroso declarou-se suspeito e Luiz Fux estava impedido.
Caso emblemático expõe vulnerabilidade dos idosos
O caso que originou o RE 630852 envolve uma consumidora que contratou plano de saúde em 1999, durante a vigência da Lei dos Planos de Saúde, com cláusula que previa sete faixas etárias com variações percentuais sobre a mensalidade básica.
Em outubro de 2008, ao completar 60 anos, a beneficiária viu sua mensalidade saltar de R$ 151 para R$ 226 – um aumento de aproximadamente 50%. Inconformada com o reajuste, ela recorreu ao Judiciário pedindo a aplicação do Estatuto do Idoso, que proíbe discriminação por idade e reajustes baseados exclusivamente nesse critério.
A Justiça gaúcha acolheu o pedido em primeira e segunda instâncias, considerando abusivos os aumentos em função da idade. O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul fundamentou a decisão no entendimento de que o idoso é consumidor duplamente vulnerável, necessitando de “tutela diferenciada e reforçada”, conforme estabelecem o Estatuto do Idoso e o Código de Defesa do Consumidor.
Entidades empresariais defendem segurança jurídica
A Confederação Nacional das Empresas de Seguros Gerais, Previdência Privada e Vida, Saúde Suplementar e Capitalização (CNSEG) ajuizou a ADC 90 pedindo que o STF restrinja a aplicação do Estatuto da Pessoa Idosa apenas aos contratos celebrados após dezembro de 2003. A entidade argumenta que a retroatividade da norma violaria o princípio da segurança jurídica e o ato jurídico perfeito.
As operadoras sustentam que contratos firmados sob legislação anterior estabeleceram cláusulas de reajuste etário de forma transparente, com conhecimento e concordância dos consumidores. A aplicação retroativa da lei, segundo as empresas, comprometeria o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos e a sustentabilidade do setor.
O Estatuto do Idoso proíbe expressamente que planos de saúde cobrem valores diferenciados em razão da idade do beneficiário, protegendo os idosos de reajustes desproporcionais ao completarem 60 anos ou mais.



