Uma funcionária que trabalhava como operadora de caixa no estacionamento de uma loja do Walmart, em Curitiba (PR), entrou na Justiça pedindo que o supermercado pagasse suas dívidas trabalhistas. Ela não era funcionária do Walmart, mas sim da empresa que administrava o estacionamento da loja (Estacionamento Ortigoza Lobo Ltda.).
A Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou o recurso da operadora de caixa afirmando que o vínculo entre as duas empresas era apenas comercial, e não uma forma de terceirização de mão de obra.
Por que ela processou o Walmart?
A trabalhadora foi contratada em janeiro de 2019 e demitida em março do mesmo ano. Como a empresa de estacionamento não pagou seus direitos trabalhistas (verbas rescisórias, FGTS, horas extras etc.), ela pediu que o Walmart também fosse responsabilizado por essas dívidas.
A estratégia é comum na Justiça do Trabalho: quando a empresa empregadora não tem dinheiro para pagar, o trabalhador pode tentar responsabilizar outras empresas que tenham alguma ligação com ela.
Inicialmente, na Primeira Instância, a Justiça condenou a empresa de estacionamento a pagar tudo que devia à trabalhadora. Como essa empresa não se defendeu no processo, perdeu automaticamente. Além disso, o juiz também responsabilizou o Walmart de forma subsidiária (ou seja, o supermercado teria que pagar caso a empresa principal não pagasse).
O Walmart recorreu e conseguiu reverter a decisão. O Tribunal Regional do Trabalho do Paraná concluiu que o contrato entre o Walmart e a empresa de estacionamento era puramente comercial (apenas aluguel de espaço); não havia terceirização de mão de obra; a trabalhadora não exercia funções relacionadas ao supermercado; e cada empresa tinha sua própria estrutura, funcionários e gestão.
Por isso, afastou a responsabilidade do Walmart.
No TST
A trabalhadora recorreu ao TST, mas a Primeira Turma manteve a decisão do TRT. O ministro Luiz José Dezena da Silva, relator do caso, explicou que o tribunal regional já havia analisado as provas e concluído que não houve terceirização, mas apenas uma relação comercial legítima.
Para mudar essa decisão, seria necessário revisar todas as provas novamente, o que não é permitido nessa fase do processo. O TST só analisa questões de direito (interpretação da lei), não reavalia fatos já decididos.
Qual a diferença entre relação comercial e terceirização?
Essa distinção foi fundamental para o caso.
Na relação comercial, uma empresa contrata outra para prestar um serviço específico usando seus próprios funcionários, estrutura e gestão. É como alugar um espaço ou contratar um fornecedor. Exemplo: o supermercado aluga o espaço do estacionamento para outra empresa explorar.
Na terceirização, uma empresa contrata outra para fornecer mão de obra que vai trabalhar em suas atividades. Nesse caso, pode haver responsabilidade solidária ou subsidiária pelos direitos dos trabalhadores.
No caso julgado, o Walmart apenas cedeu o espaço físico. A empresa de estacionamento tinha seus próprios funcionários, administração e atividades. A operadora de caixa trabalhava exclusivamente para a empresa de estacionamento, não prestava serviços ao supermercado.
O que diz a lei?
A Súmula 126 do TST estabelece que o Tribunal Superior não pode reanalisar provas e fatos já decididos pelas instâncias anteriores. Seu papel é apenas discutir a interpretação e aplicação da lei.
Como o TRT já tinha analisado detalhadamente o contrato e as provas, concluindo pela natureza comercial da relação, essa decisão foi mantida.
Consequências práticas
Esta decisão reforça que nem toda relação entre empresas gera responsabilidade trabalhista. Para que uma empresa responda por dívidas de outra, é preciso comprovar: terceirização de serviços; vínculo com as atividades da empresa contratante; e benefício direto do trabalho prestado.
Quando há apenas um contrato comercial, sem fornecimento de mão de obra ou controle sobre os trabalhadores, cada empresa responde apenas por seus próprios funcionários.



