Volkswagen é condenada em R$ 165 milhões por exploração de trabalho escravo na Amazônia

Há 3 meses
Atualizado segunda-feira, 1 de setembro de 2025

Da Redação

A montadora alemã Volkswagen do Brasil foi condenada em decisão histórica na última sexta-feira (29 de agosto) a pagar R$ 165 milhões por danos morais coletivos. A sentença, proferida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região (TRT-8), responsabiliza a empresa pela exploração de trabalho análogo à escravidão na Fazenda Vale do Rio Cristalino, localizada no sul do Pará, durante as décadas de 1970 e 1980.

A decisão ainda cabe recurso nas instâncias superiores da Justiça do Trabalho.

O maior caso de reparação histórica

Maior indenização da história em casos de trabalho escravo no país, como salientou o Ministério Público do Trabalho (MPT), autor da ação civil pública. A condenação representa um marco na responsabilização de grandes corporações por violações de direitos humanos cometidas durante a ditadura militar brasileira

Além do pagamento milionário, a decisão judicial determina que a Volkswagen deve reconhecer publicamente sua responsabilidade e pedir desculpas formais aos trabalhadores atingidos e à sociedade brasileira como um todo.

As violações documentadas

De acordo com as investigações do MPT, centenas de trabalhadores foram submetidos a condições degradantes na propriedade conhecida como “Fazenda Volkswagen”. As práticas incluíam:

  • Servidão por dívida: trabalhadores eram mantidos em situação de endividamento forçado
  • Vigilância armada: controle rigoroso e violento sobre os funcionários
  • Condições precárias: alojamentos inadequados e alimentação insuficiente
  • Ausência de assistência médica: especialmente grave durante surtos de malária na região
  • Jornadas exaustivas: trabalho em condições degradantes
  • Violência: uso de força para manter os trabalhadores submissos

O juiz Otavio Bruno da Silva Ferreira, responsável pela decisão, destacou que “relatórios oficiais, testemunhos de trabalhadores e documentos de órgãos públicos evidenciam que o modelo de produção adotado incluía práticas de servidão por dívida, violência e submissão a condições degradantes, configurando o núcleo do trabalho escravo contemporâneo.

A história

A Fazenda Vale do Rio Cristalino, operada pela Companhia Vale do Rio Cristalino Agropecuária Comércio e Indústria (subsidiária da Volkswagen), funcionou entre 1974 e 1986, durante a  ditadura militar. A propriedade de 139 mil hectares dedicava-se à criação de gado e extração de madeira.

O empreendimento contou com substanciais recursos públicos e benefícios fiscais da Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia (Sudam), dentro do projeto desenvolvimentista militar que devastou a floresta amazônica. Enquanto lucrava com incentivos do Estado,  a empresa impunha condições análogas à escravidão aos trabalhadores.

Os trabalhadores eram recrutados por intermediários conhecidos como “gatos”, que ofereciam emprego em pequenos municípios do interior de Mato Grosso, Goiás e Tocantins. As promessas incluíam bons salários e vínculo formal com a montadora, mas a realidade era completamente diferente.

Muitos dos trabalhadores aliciados eram adolescentes, que chegavam à fazenda e se viam presos por dívidas crescentes com alimentação, hospedagem e ferramentas de trabalho. O local chegou a ter cerca de 300 funcionários diretos, mas utilizava centenas de trabalhadores terceirizados em condições de escravidão.

A investigação e o julgamento

O caso veio à tona em 2019, quando o padre Ricardo Rezende Figueira, da Comissão Pastoral da Terra, apresentou ao MPT documentos e depoimentos de trabalhadores. A partir daí, foi criado o Grupo Especial de Atuação Finalística (GEAF) “Fazenda Volkswagen”, que conduziu uma investigação exaustiva.

O processo judicial começou em maio de 2025. A Volkswagen tentou acordo em duas ocasiões, mas as negociações falharam. Em sua defesa, a empresa argumentou que os trabalhadores não tinham vínculo direto com ela e que havia sido “absolvida” na época pelas autoridades.

Medidas de reparação e prevenção

Além da indenização, a sentença impõe um conjunto robusto de medidas para prevenir a reincidência:

  • Criação de uma Política de Direitos Humanos e Trabalho Decente com cláusula de “tolerância zero”
  • Inclusão de cláusulas específicas em contratos com fornecedores proibindo trabalho escravo
  • Sistema de auditoria independente e due diligence em direitos humanos
  • Canal de denúncias multiplataforma, anônimo e protegido contra retaliações
  • Treinamento anual obrigatório sobre trabalho escravo para gestores e equipes

A posição da empresa

Em nota oficial, a Volkswagen do Brasil informou que “tomou conhecimento da decisão em primeira instância relacionada à investigação da Fazenda Vale do Rio Cristalino, mas seguirá sua defesa em busca de justiça e segurança jurídica nas instâncias superiores”.

A empresa destacou seus “72 anos de legado” e reafirmou “compromisso inabalável com a responsabilidade social”, defendendo que cumpre “rigorosamente todas as leis e regulamentos trabalhistas aplicáveis”.

Essa não é a primeira vez que a Volkswagen é responsabilizada por crimes do período militar. Em 2020, a empresa assinou um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) reconhecendo sua participação em ações de repressão, perseguição e tortura de trabalhadores em sua planta de São Bernardo do Campo (SP), pagando R$ 36 milhões em reparações.

A decisão estabelece um precedente importante para a responsabilização de empresas transnacionais por violações de direitos humanos cometidas durante a ditadura militar brasileira, quando corporações estrangeiras atuaram com respaldo institucional para perseguir trabalhadores e eliminar direitos sociais.

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