Uma decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) promete transformar o cenário da remuneração advocatícia no Brasil. A Corte Especial do tribunal estabeleceu que honorários advocatícios fixados em valores manifestamente baixos podem ser revisados pelos tribunais superiores, mesmo nos casos tradicionalmente protegidos pela Súmula 7, que impede o reexame de matéria fático-probatória.
O precedente, que tem potencial para impactar milhares de processos em tramitação, nasceu de um caso aparentemente simples: uma ação de produção antecipada de provas no valor de R$ 1 mil, onde os honorários foram fixados em apenas R$ 100 – um valor que o próprio STJ reconheceu como “manifestamente irrisório”.
O caso que mudou tudo
O processo teve início com um pedido rotineiro de produção antecipada de provas, posteriormente extinto sem julgamento do mérito. O Tribunal de Justiça de São Paulo manteve os honorários advocatícios em 10% do valor da causa, totalizando R$ 100, sob o argumento de que se tratava de uma demanda simples.
Em recurso, a 3ª Turma do STJ confirmou a decisão, aplicando a Súmula 7, que tradicionalmente serve como barreira para revisões que demandem novo exame de provas. Parecia ser o fim da discussão – até que a defesa apresentou embargos de divergência à Corte Especial.
“A parte recorrente foi inteligente ao destacar precedentes do próprio STJ que já consideravam valores como R$ 100 insuficientes para remunerar adequadamente a atuação profissional”, explica um advogado especialista em direito processual, que preferiu não se identificar.
A virada jurisprudencial
O ministro relator João Otávio de Noronha acolheu a argumentação e promoveu uma verdadeira revolução conceitual. Sua decisão estabeleceu que a revisão de honorários irrisórios pode ser feita com base em critérios objetivos – razoabilidade e proporcionalidade – sem necessidade de reanálise do conjunto probatório.
“Esta é a chave da decisão”, analisa um magistrado federal com experiência em tribunais superiores. “O STJ encontrou uma forma de contornar a Súmula 7 ao estabelecer que a verificação da adequação dos honorários é uma questão de direito, não de fato.”
Com essa fundamentação, os honorários foram elevados de R$ 100 para R$ 1 mil – valor equivalente ao da causa – e a Corte estabeleceu dois enunciados que terão repercussão em futuras decisões.
Os enunciados que fazem a diferença
A decisão criou duas teses fundamentais. A primeira estabelece que “honorários advocatícios fixados em valor manifestamente irrisório podem ser revistos sem necessidade de reexame de matéria fático-probatória.” Já o segundo enunciado diz que “a revisão de honorários irrisórios não se submete à vedação prevista na Súmula nº 7 do STJ.”
As teses representam uma mudança paradigmática na jurisprudência brasileira. Tradicionalmente, a Súmula 7 funcionava como um escudo quase intransponível para decisões sobre honorários, mesmo quando os valores eram claramente desproporcionais ao trabalho realizado.
O impacto na advocacia
Para a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), a decisão representa uma vitória significativa. “A decisão do STJ reforça a necessidade de observância dos critérios legais na fixação dos honorários e responde a uma preocupação constante da OAB: assegurar que a remuneração da advocacia reflita, minimamente, o trabalho realizado. Honorários não podem ser simbólicos”, declarou o presidente da OAB Nacional, Beto Simonetti.