Por Carolina Villela
O ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou o encaminhamento de relatório que aponta irregularidades na destinação de emenda parlamentar de R$ 10 milhões pelo deputado federal Alberto Fraga (PL/DF) à Secretaria de Saúde do Distrito Federal. O recurso foi destinado à execução do projeto “A Tenda +”, desenvolvido em parceria com o Hospital São Mateus através de Termo de Fomento publicado no Diário Oficial do DF em 23 de outubro de 2024.
A decisão, tomada na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7688, determina que o Relatório do Departamento Nacional de Auditoria do Sistema Único de Saúde (DENASUS) seja encaminhado à Procuradoria-Geral da República, Polícia Federal, Governo do Distrito Federal, Ministério Público do DF e Territórios, Procuradoria-Geral do DF e Territórios e Ministério Público de Contas do DF e Territórios para que tomem as medidas cabíveis.
Flávio Dino também intimou a Advocacia-Geral da União para examinar as providências de ressarcimento aos cofres da União dos valores relativos às práticas irregulares identificadas. O Ministério da Saúde também foi intimado para dar prosseguimento às medidas administrativas sobre os fatos relatados.
Projeto incompatível com diretrizes do SUS
O relatório do DENASUS revela que o Termo de Fomento não é compatível nem integrado com o planejamento da Secretaria de Saúde do DF, além de não se mostrar relevante e alinhado aos princípios fundamentais do Sistema Único de Saúde. A auditoria constatou que o projeto não está nivelado com as diretrizes da Política Nacional de Promoção da Saúde e não considerou os pareceres técnicos das equipes de especialistas da pasta.
Uma das principais irregularidades identificadas refere-se ao comprometimento da integralidade da assistência prestada pelo SUS. Os prontuários dos usuários atendidos no projeto “A Tenda+” não foram disponibilizados tempestivamente no Sistema Trackcare, prejudicando a oportunidade das informações e a continuidade do cuidado.
O documento também aponta que o atendimento na Tenda+ não conduz à inserção do paciente no Sistema de Regulação e não respeita a ordem das filas existentes, ferindo os princípios da equidade e da universalidade que regem o sistema público de saúde brasileiro.
Valores superiores aos praticados pelo mercado
Em relação à economicidade, a execução da emenda parlamentar demonstrou incompatibilidade com os preços de mercado e regulamentares. A auditoria identificou que foram contratados exames e procedimentos com recursos federais por valores superiores aos da tabela SUS, caracterizando possível superfaturamento.
Itens foram adquiridos com valores de referência superiores aos praticados pela Administração Pública no Distrito Federal, revelando falta de critérios econômicos na aplicação dos recursos públicos. A análise também mostrou que não foi considerada a relação custo-benefício entre a locação e a compra de bens móveis como televisão, impressora e notebook.
O valor total da proposição de devolução decorrente das irregularidades constatadas chegou a R$ 6.315.975,96, sendo R$ 1.345.285,00 com recomposição ao Fundo de Saúde Distrital e R$ 4.970.690,96 aos cofres da União.
Falhas nos controles internos
O relatório identifica falhas na atuação dos controles internos da Secretaria de Saúde do DF. Embora a Comissão de Fiscalização (CFPAS-MROSC) tenha realizado visitas técnicas às Tendas, não houve análise parcial do cumprimento das metas nem aprovação dos relatórios produzidos.
A auditoria constatou ainda a ausência de atuação do Conselho de Saúde no acompanhamento da execução do Termo de Fomento e a falta de análise prévia da instrução de celebração do Termo pela Unidade Central de Controle Interno antes da liberação da primeira parcela dos recursos.
A designação da Comissão de Monitoramento e Avaliação, obrigatória para esse tipo de instrumento, também não foi realizada, comprometendo o acompanhamento adequado da aplicação dos recursos públicos.
Execução física e financeira comprometida
As irregularidades se estendem à verificação da execução física e financeira do projeto. Após inspeção física, não foi comprovada a execução de despesas realizadas pelo projeto na Região Administrativa de Santa Maria/DF, levantando questionamentos sobre a real aplicação dos recursos.
Foram constatadas transações bancárias sem comprovação por notas fiscais correspondentes, pagamento antieconômico por serviços de contabilidade e assessoria financeira, e existência de notas fiscais de serviços médicos sem informação do período de execução.
O relatório também identificou transferências sem justificativa entre a conta específica do Termo de Fomento nº 07/2024 e a organização parceira.