Moraes mistura ironia e contundência em voto contra núcleo militar da trama golpista

Há 2 meses
Atualizado terça-feira, 9 de setembro de 2025

Por Carolina Villela

O voto do ministro Alexandre de Moraes no julgamento do núcleo militar da Ação Penal 2669 não se limitou a argumentos técnicos. Ao longo da sessão desta terça-feira (9), o relator intercalou ironia, frases de efeito e duras críticas às defesas e aos réus, chegando a provocar risadas e tensão entre os colegas da Primeira Turma.

Moraes rejeitou todas as preliminares, manteve a validade da delação de Mauro Cid e concluiu pela condenação de Jair Bolsonaro e de sete ex-auxiliares. Mas foram os apartes e observações incisivas que marcaram o tom da sessão, revelando momentos inusitados em meio a um julgamento histórico.

“Samambaia jurídica” e acusações “esdrúxulas”

Logo no início, Moraes rebateu a tese de que teria atuado como inquisidor ao questionar testemunhas. O relator ironizou a expectativa de passividade de um juiz no processo penal. “A ideia de que o juiz deve ser uma samambaia jurídica durante o processo não tem nenhuma ligação com o sistema acusatório”, disparou.

O ministro ainda classificou como “esdrúxula” a alegação de que sua participação teria ferido a imparcialidade. “Não cabe a nenhum advogado censurar o juiz”, completou, arrancando reações discretas no plenário.

A expressão “samambaia jurídica” rapidamente se tornou uma das mais comentadas, pela forma incomum e quase caricata com que Moraes se referiu à postura esperada de um magistrado no caso.

O “querido diário” de Ramagem e a “agenda golpista”

Outro momento que chamou atenção foi a menção às anotações encontradas com o ex-diretor da Abin, Alexandre Ramagem. Segundo Moraes, a defesa tentou tratar os registros como simples reflexões pessoais. “O réu Ramagem confirmou que era titular do documento, mas disse que era só uma espécie de diário, meu querido diário”, ironizou.

O mesmo tom foi usado ao comentar a agenda de Augusto Heleno, que a defesa alegava ser apenas para registrar memórias. “Não consigo entender como alguém pode achar normal numa democracia em pleno século 21, uma agenda golpista”, afirmou Moraes, ressaltando que os escritos falavam até em prisão de autoridades.

As duas passagens ilustraram bem a estratégia de Moraes: ao mesmo tempo em que apresentava provas, o ministro utilizava o sarcasmo para desmontar os argumentos da defesa, tornando-os quase ridículos perante o tribunal.

Frases de Bolsonaro e tensão entre ministros

Ao destacar o papel de Bolsonaro como líder da organização criminosa, Moraes recuperou declarações emblemáticas do ex-presidente. Entre elas, a feita em ligação telefônica para manifestação na Avenida Paulista: “só saio preso, morto ou com a vitória”. Para Moraes, a frase comprova que o líder jamais aceitaria a derrota nas urnas.

Também lembrou o discurso de 7 de setembro de 2021, quando Bolsonaro atacou o Supremo. “Isso não é conversa de bar ou alguém num clube conversando com um amigo. Isso é um presidente da República instigando milhares de pessoas contra o STF”, rebateu Moraes.

Houve ainda um momento de tensão quando o ministro Flávio Dino pediu a palavra. Luiz Fux protestou contra a interrupção, e Moraes respondeu: “Ministro Fux, esse aparte foi pedido a mim e não a vossa excelência”. Dino completou em tom irônico: “Não pedirei de vossa excelência, pode dormir em paz”.

O “barquinho de papel” e o risco de ditadura

Um dos trechos mais curiosos foi quando Moraes comentou o plano “Punhal Verde e Amarelo”, encontrado no Palácio do Planalto. Segundo ele, a defesa tentou minimizar a gravidade do documento. “Não é crível achar que alguém imprimiu no Palácio, foi ao Alvorada, ficou uma hora e seis minutos e fez barquinho de papel com o plano golpista. Isso é ridicularizar a inteligência do Tribunal”, disse.

Em outro ponto, Moraes lembrou que o Brasil esteve perto de repetir uma ditadura. “Estamos esquecendo que quase voltamos a um regime que durou 20 anos, porque uma organização criminosa não sabe perder eleições”, advertiu.

A contundência se manteve até o fim: “Quem pretende dar o golpe, dá o golpe, como se pretendeu aqui”. Para Moraes, o 8 de janeiro foi apenas a conclusão de uma trama que se desenhou em reuniões, agendas e discursos — e não em meros “queridos diários” ou “barquinhos de papel”.

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