Por Carolina Villela
O Supremo Tribunal Federal decidiu nesta quarta-feira (19) admitir a possibilidade de instauração de incidente de assunção de competência (IAC) nas ações que discutem a validade do vínculo estatutário de servidores da Fundação Nacional de Saúde (Funasa). A decisão, tomada no julgamento da Reclamação 73295, envolve casos decorrentes da conversão do regime jurídico de celetista para estatutário de empregados não estabilizados ocorrida em 1990.
O STF determinou, ainda, a suspensão da tramitação de todos os processos pendentes sobre o tema no país, sejam individuais ou coletivos, até o julgamento definitivo pela Corte. A medida atinge ações que tramitam na Justiça do Trabalho em todo o território nacional.
Medidas determinadas pelo STF
Além da suspensão dos processos, foi determinada a comunicação mediante envio de cópia do acórdão aos ministros do Tribunal Superior do Trabalho (TST) e aos presidentes dos Tribunais Regionais do Trabalho (TRTs), que deverão providenciar a comunicação aos juízes de primeiro grau a eles vinculados.
A Procuradoria-Geral da República (PGR) também será intimada sobre a decisão. O STF estabeleceu ainda que, na hipótese de o relator não propor o incidente de assunção de competência, não caberá recurso contra essa decisão, conferindo ao magistrado responsável pelo caso ampla discricionariedade para avaliar a conveniência da instauração do mecanismo.
O incidente de assunção de competência é um instrumento processual previsto no Código de Processo Civil que permite a um tribunal superior assumir o julgamento de determinada matéria quando há questão de direito com grande repercussão social e relevância jurídica, quando não houver multiplicidade de processos. Isso porque, se houver multiplicidade de processos destinados ao julgamento de causas repetitivas, haverá o IRDR, o incidente de resolução de demandas repetitivas ou os recursos repetitivos.
Portanto, o IAC é cabível, para questões relevantes, de grande repercussão social, em processo específico ou em processos que tramitem em pouca quantidade.
Gilmar Mendes defende compatibilidade com regimento interno
Na sessão desta quarta-feira, o relator do caso, ministro Gilmar Mendes, reafirmou o voto que já havia proferido no plenário virtual e defendeu que não há incompatibilidade entre as disposições regimentais do STF e as normas do incidente de assunção de competência previstas no Código de Processo Civil. Para o magistrado, vários fatores distintos e autônomos levam a essa conclusão.
Segundo Gilmar Mendes, o IAC produz efeitos significativos no que diz respeito à gestão processual do acervo da Corte, principalmente devido ao aumento do número de reclamações que chegam ao Supremo. O ministro argumentou que o mecanismo, ao prevenir ou compor divergências internas, contribui para a integridade, estabilidade e coesão jurisprudencial, reduzindo a dispersão de entendimentos.
“Ao prevenir ou compor a referência interna, além de contribuir para a integridade, estabilidade e a coesão jurisprudencial, reduz a dispersão de entendimentos”, afirmou o relator, destacando que a medida aumenta a previsibilidade e desestimula a litigiosidade repetitiva. Para Mendes, o incidente não apenas é compatível com o regimento interno do Supremo, como também reforça a posição institucional do Tribunal na arquitetura do sistema de precedentes.
Maioria acompanha relator com ressalvas
O ministro Alexandre de Moraes apresentou voto-vista acompanhando o relator por entender que não há incompatibilidade entre o regimento interno do STF e o Código de Processo Civil. Segundo Moraes, a norma do Tribunal reserva ao relator a possibilidade ou não de levar a matéria ao plenário, tratando-se de mais uma hipótese excepcional que, respeitadas as competências das Turmas, tem a mesma finalidade jurídica de garantia da segurança jurídica.
O ministro Cristiano Zanin também seguiu o voto de Gilmar Mendes e considerou que a legitimidade para propor a instalação do IAC ao plenário é do relator. A ministra Cármen Lúcia compartilhou preocupações sobre a aplicação do mecanismo, mas acompanhou o relator, sugerindo que sejam adotadas excepcionalidades na utilização da medida para evitar banalização do instrumento.
O ministro Flávio Dino divergiu e defendeu a autocontenção para evitar que, depois de editar o precedente, sejam apresentadas reclamações, agravos e novos IACs, obrigando o debate a voltar repetidamente ao plenário. Os ministros Nunes Marques e Dias Toffoli também aderiram ao mesmo posicionamento, demonstrando preocupação com possível sobrecarga do plenário.
O ministro Edson Fachin, presidente do STF, também divergiu.



