Da redação
O plenário do STF iniciou a sessão plenária desta tarde quarta-feira (19 com o julgamento da Reclamação 73295, que trata da possibilidade de instauração de incidente de assunção de competência (IAC) perante a Corte. O caso envolve a Fundação Nacional de Saúde (Funasa) e o Tribunal Superior do Trabalho (TST), em disputa sobre a validade do vínculo estatutário de servidores da fundação. O julgamento será retomado com o voto do ministro Alexandre de Moraes, após pedido de vista, e tem como relator o ministro Gilmar Mendes.
A discussão central é definir a quem cabe julgar as ações sobre a validade do vínculo estatutário dos servidores da Funasa, decorrente da conversão do regime jurídico de celetista para estatutário de empregados não estabilizados, ocorrida em 1990. A controvérsia envolve o cabimento do incidente de assunção de competência no STF e, como pano de fundo, a própria competência da Justiça do Trabalho para julgar essas questões relacionadas ao vínculo estatutário.
O incidente de assunção de competência é um mecanismo processual previsto no Código de Processo Civil que permite a um tribunal superior assumir o julgamento de determinada matéria quando há questão de direito com grande repercussão social e relevância jurídica. O objetivo é uniformizar a jurisprudência e garantir segurança jurídica em temas que geram múltiplas ações judiciais com resultados divergentes.
Política tributária brasileira para o setor de agrotóxicos
O Supremo Tribunal Federal deve retomar também nesta quarta o julgamento que discute a política tributária brasileira para o setor de agrotóxicos. Em pauta estão as Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) 5553 e 7755, que questionam a concessão de incentivos fiscais para a comercialização desses produtos no país.
As ações contestam dispositivos do Convênio 100/1997 do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), que reduziram em 60% a base de cálculo do ICMS para agrotóxicos, além de normas que estabelecem alíquota zero de IPI para alguns desses produtos. O Partido Verde (PV) e o Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) argumentam que esses benefícios afrontam o direito constitucional ao meio ambiente equilibrado e à saúde pública. O julgamento também analisa trecho da Emenda Constitucional 132/2023, que autoriza regime tributário diferenciado para insumos agropecuários.
Relator propõe tributação para produtos nocivos
O ministro Edson Fachin, relator das ações, já apresentou seu voto contrário aos incentivos fiscais ao setor de agrotóxicos. Para o magistrado, o cerne da questão não é a proibição do uso desses produtos, mas a validade constitucional dos benefícios tributários que os favorecem. Fachin defende que a Constituição Federal impõe que o sistema tributário brasileiro seja “ambientalmente calibrado”, ou seja, que considere o impacto ambiental na definição das alíquotas.
Segundo o raciocínio apresentado pelo ministro, mercadorias ou processos produtivos mais nocivos ao meio ambiente devem ter tributação mais severa, e não o contrário. Essa lógica de tributação diferenciada estimularia, a longo prazo, a inovação no setor e a adoção de práticas menos prejudiciais à saúde humana e à natureza. A proposta representa uma mudança de paradigma na forma como o Brasil trata fiscalmente produtos com potencial de dano ambiental.
Em seu voto, Fachin propôs a inconstitucionalidade das cláusulas primeira e terceira do Convênio Confaz 100/1997, da fixação de alíquota zero para agrotóxicos indicados no Decreto 11.158/2022 e do artigo 9º, parágrafo 1º, inciso XI, da Emenda Constitucional 132/2023. Caso a decisão seja acompanhada pelos demais ministros, não haverá efeitos retroativos, preservando os benefícios já concedidos no passado.
Mendonça diverge e defende política agrícola constitucional
O ministro André Mendonça abriu divergência parcial em relação ao voto do relator. Em seu entendimento, a concessão de benefícios fiscais a insumos agropecuários é plenamente constitucional, uma vez que a Emenda Constitucional 132 optou por constitucionalizar expressamente essa política fiscal. Para Mendonça, o emprego de instrumentos fiscais sempre fez parte do regime constitucional da política agrícola brasileira.
O ministro reconhece que a Constituição identifica a toxicidade dos produtos, mas defende que é necessária uma ponderação entre o incentivo fiscal e outros valores constitucionais, como a proteção à saúde e ao meio ambiente. Essa ponderação não levaria necessariamente à eliminação de todos os benefícios tributários concedidos ao setor.
Mendonça propõe uma solução intermediária: o Estado deve conceder benefícios fiscais aos produtos mais eficientes e com menor toxicidade, e não concedê-los aos menos eficientes e com maior toxicidade. Essa abordagem, segundo o ministro, permitiria conciliar o apoio ao setor agrícola com a proteção ambiental e sanitária, criando um sistema de incentivos que estimule a produção mais sustentável.
Outras pautas do plenário
Além dos casos já mencionados, o plenário do STF também deve analisar a (ADI)7754, que trata da medida cautelar que suspendeu a lei do Estado do Rio de Janeiro sobre transporte gratuito de animais de suporte emocional em aeronaves. A lei estadual obrigava as companhias aéreas brasileiras a transportar gratuitamente esses animais na cabine em rotas nacionais que tivessem o Rio de Janeiro como origem ou destino.
O julgamento será retomado para apresentação do voto do ministro Alexandre de Moraes, que pediu mais tempo para analisar o caso. O processo é relatado pelo ministro André Mendonça, que deferiu a medida cautelar suspendendo a eficácia da norma estadual. A questão envolve a competência legislativa dos estados para regular o transporte aéreo e os limites dessa atuação em face da legislação federal sobre aviação civil.



