O Superior Tribunal de Justiça estabeleceu que operadoras de planos de saúde podem recusar cobertura para medicamentos à base de canabidiol destinados ao uso domiciliar, quando não listados no rol da Agência Nacional de Saúde Suplementar. A decisão da 3ª Turma, proferida no último domingo (13), marca posicionamento importante sobre direitos dos beneficiários e obrigações das operadoras no tratamento com cannabis medicinal.
O julgamento teve origem em recurso de operadora contra decisão que determinava fornecimento de pasta de canabidiol para paciente com transtorno do espectro autista. A beneficiária utilizaria o medicamento em casa, sob prescrição médica, após negativa inicial da empresa.
A mãe da paciente ingressou com ação judicial solicitando cobertura do tratamento e indenização por danos morais. Tanto o juízo de primeiro grau quanto o Tribunal de Justiça de Santa Catarina determinaram que a operadora deveria custear a medicação, fundamentando-se no artigo 10, parágrafo 13, da Lei 9.656/1998.
Interpretação conjunta da legislação
A ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso, explicou que o inciso VI do artigo 10 da Lei 9.656/1998 estabelece exclusão dos medicamentos de uso domiciliar do plano-referência de assistência à saúde. Segundo a magistrada, isso significa que tais medicamentos não integram, em regra, a cobertura obrigatória das operadoras.
Contudo, a ministra destacou que o parágrafo 13 do mesmo artigo impõe às operadoras obrigação de cobertura para tratamentos prescritos por médicos que não estejam no rol da ANS. Essa cobertura depende do cumprimento de requisitos específicos, incluindo recomendação da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde.
Para Nancy Andrighi, os dispositivos devem ser interpretados em conjunto, considerando que o artigo 10, IV, retira a obrigação de cobertura domiciliar, salvo exceções legais. O parágrafo 13 traz requisitos para cobertura de tratamentos excluídos apenas por não constarem no rol da ANS.
Intenção legislativa de exclusão
A relatora apresentou panorama normativo sobre o tema, ponderando que “a intenção do legislador, desde a redação originária da Lei 9.656/1998, é a de excluir medicamentos de uso domiciliar da cobertura obrigatória imposta às operadoras de planos de saúde”. Na avaliação da ministra, foram acrescentadas à lei e ao rol da ANS algumas exceções específicas à regra geral.
A decisão considera que medicamentos de uso domiciliar ficam fora da cobertura obrigatória, mesmo quando prescritos por médicos e com eficácia comprovada. A distinção fundamental reside no local de administração e na necessidade de supervisão profissional durante o tratamento.
Jurisprudência sobre canabidiol
Nancy Andrighi comentou que o STJ tem jurisprudência no sentido de impor cobertura de medicamentos à base de canabidiol pelas operadoras, conforme REsp 2.107.741. Entretanto, a 3ª Turma já havia analisado a questão considerando a forma de administração do medicamento, afastando tal obrigação quando destinado ao uso domiciliar.
A ministra ressaltou exceções importantes à regra estabelecida pelo tribunal. A cobertura será obrigatória se o medicamento, embora de uso domiciliar, for administrado durante internação domiciliar substitutiva da hospitalar, conforme REsp 1.873.491.
Igualmente, ainda que administrado fora de unidades de saúde, será obrigatória a cobertura se exigir intervenção ou supervisão direta de profissional de saúde habilitado, segundo EREsp 1.895.659. Essa distinção preserva direitos dos pacientes em situações específicas de tratamento.