Da Redação
A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabeleceu, em decisão unânime, que depoimentos de policiais que apenas reproduzem relatos de terceiros obtidos durante investigações são insuficientes para fundamentar a pronúncia de um réu. O colegiado rejeitou ainda a aplicação do princípio in dubio pro societate — que favorece a sociedade em casos de dúvida — quando as provas são frágeis.
O caso envolveu um homem acusado de assassinar uma mulher que supostamente vinha ameaçando. Segundo a denúncia, a motivação seria vingança, já que a vítima havia testemunhado contra o réu em outro processo de homicídio. O crime aconteceu na presença do marido da vítima, que sobreviveu ao ataque.
Pronúncia anulada
O réu foi pronunciado pelo juiz de primeira instância exclusivamente com base nos depoimentos do delegado responsável pelo inquérito e dos policiais que atenderam a ocorrência. Durante a instrução processual, esses agentes relataram apenas o que ouviram de outras pessoas na fase investigativa. O marido da vítima, única testemunha ocular disponível, não conseguiu identificar o autor do crime.
A ministra Daniela Teixeira, relatora do caso, inicialmente concedeu habeas corpus para anular a pronúncia. Quando o Ministério Público Federal recorreu à Quinta Turma, ela manteve o entendimento.
“O testemunho de um policial ou de qualquer outra pessoa que apenas relata, mesmo em juízo, aquilo que ouviu de outra pessoa é um testemunho indireto e, portanto, não serve para fundamentar a pronúncia ou a condenação”, explicou a ministra.
Mudança de entendimento
Daniela Teixeira destacou que a jurisprudência do STJ evoluiu nos últimos anos, passando a exigir padrão probatório mais rigoroso para a pronúncia — superior ao necessário para o recebimento da denúncia inicial. A Corte não aceita mais testemunhos indiretos ou “de ouvir dizer” como base para levar um acusado a júri popular.
“O princípio in dubio pro societate não pode ser utilizado para suprir a insuficiência probatória, sendo imprescindível a preponderância de provas que indiquem autoria ou participação do acusado”, declarou a relatora.
A decisão reforça que a pronúncia, embora seja uma etapa intermediária do processo, não pode prescindir de um suporte probatório mínimo, sob pena de violar o princípio da presunção de inocência. Segundo o artigo 209 do Código de Processo Penal, testemunhos indiretos servem apenas para indicar a fonte original da informação, que deve ser ouvida diretamente em juízo.