A corrida contra o tempo para evitar que Rondônia vire a próxima Brumadinho

Há 2 meses
Atualizado quarta-feira, 29 de outubro de 2025

Por Jeffis Carvalho

A Barragem Igarapé Mutum não tem vertedouro. Exatamente o que você leu: uma estrutura que retém milhões de litros d’água, erguida sobre terra amazônica, não possui o dispositivo básico para escoar o excesso de água com segurança. Desde fevereiro de 2024, ela pisca em vermelho no mapa de risco de Rondônia — um sinal de alerta que o procurador do Ministério Público Federal (MPF) André Porreca, do 2º Ofício da Amazônia Ocidental, não consegue tirar da cabeça.

“A estabilidade das barragens não é apenas uma exigência técnica, mas uma obrigação legal e moral com a proteção da vida, do patrimônio e do meio ambiente”, diz Porreca, escolhendo cada palavra como quem carrega o peso de prevenir tragédias que já viraram cicatrizes na memória nacional.

Mariana. Brumadinho. Os nomes ecoam como advertências.

A Batalha de Ariquemes

Em Ariquemes, a CooperMetal se tornou o símbolo de uma queda de braço que se arrasta há quase uma década. Foi em 2016 que o Ministério Público Federal abriu o primeiro inquérito. Irregularidades foram identificadas. Prazos foram dados. Promessas foram feitas. E as correções? Vieram pela metade, em prestações, como quem paga uma dívida sempre adiando o saldo final.

Duas recomendações do MPF em 2023. Junho de 2024 chegou e as irregularidades persistiam, teimosas como a burocracia que parece protegê-las. A Agência Nacional de Mineração (ANM) havia concedido prorrogações, aceitando “justificativas técnicas e econômicas” — o tipo de linguagem que transforma urgências em processos administrativos.

Mas o MPF não estava mais para jogo. Moveu ação civil pública contra a CooperMetal, a NBF Mineração e a própria ANM. Três barragens sob responsabilidade de cooperativas — Igarapé Mutum, Rio Santa Cruz e Jacaré Médio — foram embargadas. A mensagem era clara: não há mais espaço para meio-termo quando se trata de estruturas classificadas como de risco e dano potencial médios desde 2022.

Houve vitória parcial: em 27 de dezembro de 2024, uma das barragens foi descaracterizada. O inquérito foi arquivado. Mas duas ainda permanecem no mapa da preocupação.

O Complexo do Madeira Acorda

No Complexo do Rio Madeira, onde as gigantescas usinas de Jirau e Santo Antônio bombeiam energia para o país, algo começou a mudar. Depois de cinco anos de pressão iniciada em 2019, o MPF finalmente viu seus Planos de Ação de Emergência (PAE) saírem do papel.

Elaborados em 2023, testados em 2024. Protocolos de evacuação, sistemas de alerta, mapeamento de áreas de risco — toda a engenharia burocrática necessária para que, se o pior acontecer, a tragédia não seja amplificada pelo despreparo.

A Declaração de Condição de Estabilidade (DCE) virou moeda de troca: sem ela, interdição e multa. O documento que atesta a segurança das estruturas deixou de ser apenas mais um papel numa gaveta para se tornar condição de operação.

2025: Ano da Prestação de Contas

Este é o ano da COP30 em Belém. Os holofotes do mundo estarão sobre a Amazônia. E Rondônia não quer entrar para a história como o estado que ignorou os avisos.

A proibição nacional de barragens construídas pelo método a montante — aquele mesmo que condenou Brumadinho — veio em 2019 pela ANM e ganhou força de lei federal em 2020. A Política Nacional de Segurança de Barragens foi fortalecida no papel. Agora o MPF a faz valer na prática, barragem por barragem, inquérito por inquérito.

Em Ariquemes, a Igarapé Mutum continua sem vertedouro adequado. Mas pela primeira vez em anos, há quem esteja vigiando cada dia de atraso, cada justificativa técnica, cada prorrogação concedida.

O procurador Porreca sabe que fiscalizar barragens não é apenas sobre concreto e cálculos hidráulicos. É sobre a diferença entre um sistema de alerta que funciona e famílias soterradas pela lama. Entre prevenção e luto coletivo.

A questão agora é simples, direta, inadiável: Rondônia vai aprender com as tragédias alheias ou vai esperar ter as suas próprias?

Autor

Leia mais

Presidente do STM , ministra Maira Elizabeth Teixeira Rocha mulher banca sentada vestindo camisa branca e blazer preto, falando ao micofone

Presidente do STM defende necessidade de um código de conduta para magistrados brasileiros

Há 15 minutos
imagem azul de uma bolinha cheia de espinhos sugerindo um vírus

OMS alerta para avanço da variante K do vírus influenza no mundo e destaca grupo de risco

Há 1 hora
Ministro Antonio Saldanha Palheiro, do STJ, durante sessão da 6ªa Turma

STJ tem rejeitado cada vez mais HCs interpostos antes do julgamento de processos que tramitam em instâncias inferiores

Há 2 horas
A foto mostra o deputado Alexandre Ramagem. Ele é um homem branco com cabelos escuros.

Moraes determina que Ministério da Justiça providencie pedido de extradição de Ramagem dos EUA

Há 2 horas
A foto mostra o ex-presidente Jair Bolsonaro. Ele é um homem branco, com olhos claros e cabelos grisalhos.

Defesa de Bolsonaro pede autorização urgente para cirurgia e reforça pedido de prisão domiciliar

Há 3 horas
Mulher atrás de uma porta de vidro de costas, com a mão para a frente tentando impedir uma violência

Em caso de violência doméstica contra a mulher, dano moral é considerado presumido, decide STJ

Há 3 horas
Maximum file size: 500 MB