Nova norma do MinC abre caminho para sustentabilidade de longo prazo no setor cultural
O setor cultural brasileiro ganhou um novo e poderoso aliado para garantir a continuidade de suas atividades: os fundos patrimoniais culturais agora podem receber recursos incentivados pela Lei Rouanet. A mudança foi oficializada com a publicação da Instrução Normativa nº 26/2025 pelo Ministério da Cultura.
A medida regulamenta o uso de incentivos fiscais para a constituição ou ampliação desses fundos, voltados à manutenção de instituições culturais públicas ou privadas. A proposta é criar uma fonte de financiamento duradoura, menos sujeita às oscilações típicas de doações pontuais e patrocínios esporádicos.
Como funcionam os fundos patrimoniais
Fundos patrimoniais são estruturas privadas compostas por ativos financeiros, geridos por organizações sem fins lucrativos. O capital doado é investido no mercado, e somente os rendimentos dessas aplicações são utilizados para custear projetos e atividades de interesse público — como educação, ciência, saúde e, agora com maior destaque, cultura.
Quando voltados especificamente para o setor cultural, esses instrumentos se tornam fundos patrimoniais culturais. A nova regulamentação permite que projetos sejam apresentados via Lei Rouanet com a finalidade exclusiva de criar ou fortalecer tais fundos, garantindo fôlego financeiro contínuo às instituições beneficiadas.
Incentivos fiscais ampliados
Pelo novo modelo, pessoas jurídicas que operam sob lucro real poderão deduzir até 40% do valor doado ao fundo no Imposto de Renda. Já pessoas físicas poderão abater até 80% da doação em suas declarações anuais. Trata-se de uma aplicação do artigo 26 da Lei 8.313/91, que autoriza incentivos fiscais parciais em projetos culturais.
As propostas podem ser enviadas ao Ministério da Cultura até 31 de agosto de cada ano. Cada projeto poderá ter execução entre 12 e 48 meses e captar até R$ 15 milhões. Os recursos também poderão ser usados para estruturar governança, gestão financeira, planejamento de captação, assessorias técnica e jurídica, além de comunicação, acessibilidade e divulgação.
A norma proíbe, no entanto, o pagamento de comissões ou qualquer remuneração diretamente atrelada à captação de recursos.
Cultura ainda é minoria entre os fundos
Segundo o Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social (IDIS), há hoje 122 fundos patrimoniais ativos no país, com patrimônio total estimado em R$ 137,7 milhões. No entanto, apenas nove têm foco na cultura ou na conservação do patrimônio histórico e artístico.
Entre os exemplos mais conhecidos estão o fundo patrimonial do Museu de Arte de São Paulo (MASP) e o da Fundação da Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo (OSESP). Ambos já atuam com modelo semelhante, mas agora poderão contar com o reforço da política pública de incentivo fiscal.
Especialista vê avanço estratégico
Para Raquel Grazzioli, advogada especialista em Terceiro Setor do escritório Rubens Naves Santos Jr., a medida tem potencial transformador. “A cultura ainda depende fortemente de doações e patrocínios pontuais, o que dificulta uma política contínua. Com os fundos patrimoniais, a tendência é consolidar fontes duradouras”, avaliou.
Ela ressalta que a regulamentação cria um ambiente mais claro e seguro para a criação de novos fundos no setor cultural. “Ainda são pouco difundidos, mas essa mudança pode mudar o cenário. O desafio, agora, está na governança, na capacidade de engajar doadores e em construir uma estratégia de longo prazo”, pontuou.
Caminho para independência financeira
Ao integrar os fundos patrimoniais culturais ao escopo da Lei Rouanet, o governo dá um passo importante para fortalecer a autonomia financeira de museus, orquestras, centros culturais e demais instituições que compõem o tecido cultural do país.
Mais do que um novo mecanismo, trata-se de uma aposta na sustentabilidade e na maturidade do setor. O desafio, daqui para frente, é tornar esse modelo conhecido, viável e atrativo para quem deseja contribuir com a cultura brasileira de forma estruturada e contínua.



