O Supremo Tribunal Federal (STF) definiu de forma clara os limites entre as competências da União e dos estados na regulamentação das compensações financeiras pela exploração de petróleo e gás natural. Em decisão unânime tomada na sessão virtual encerrada em 29 de agosto, a Corte declarou inconstitucionais trechos específicos de uma lei sergipana, mas preservou outros dispositivos fundamentais para a fiscalização estadual.
Desse modo, o Supremo mantém competência da União para regulamentar valores e preserva direito estadual de fiscalizar empresas em tempo real
A Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 6228 foi ajuizada pela Associação Brasileira de Empresas de Exploração e Produção de Petróleo e Gás (Abep), questionando dispositivos de uma lei estadual que disciplinava a fiscalização e cobrança de compensações financeiras no território sergipano. A associação é autora de ações similares contra leis de outros estados produtores, como Rio de Janeiro e Alagoas, evidenciando um conflito federativo mais amplo.
O caso integra uma série de disputas jurídicas que têm se intensificado desde a descoberta do pré-sal, quando as receitas petrolíferas passaram a representar valores cada vez mais expressivos para os cofres públicos.
Divisão clara de competências
O relator, ministro Nunes Marques, estabeleceu uma distinção técnica fundamental entre “obrigações principais” e “obrigações acessórias” no contexto das compensações petrolíferas. Assim, é competência exclusiva da União – consideradas obrigações principais – a definição dos valores das compensações e participações financeiras; o estabelecimento das formas de recolhimento; a condução do processo administrativo de lançamento; a gestão da arrecadação; o julgamento de recursos e controvérsias; e a aplicação de penalidades por inadimplemento.
É competência preservada dos estados – classificadas como obrigações acessórias – a fiscalização das atividades das empresas concessionárias; o acompanhamento da produção em tempo real; o controle das quotas-partes repassadas pelos órgãos federais; e a exigência de fornecimento de dados sobre processos produtivos.
A decisão preserva, também, um aspecto considerado crucial pelos estados produtores: a manutenção da obrigatoriedade de fiscalização em tempo real. As empresas petrolíferas continuam obrigadas a fornecer, instantaneamente, dados detalhados sobre processos de produção; armazenamento de hidrocarbonetos; informações técnicas necessárias para cálculo das compensações; e outros dados operacionais relevantes.
Essa preservação é estratégica para os estados, pois permite o controle efetivo sobre as atividades desenvolvidas em seus territórios e garante transparência nos processos que geram receitas públicas.
Efeitos práticos da decisão
O ministro Nunes Marques determinou que a decisão produz efeitos prospectivos, ou seja, vale apenas a partir de agora, sem afetar situações pretéritas. Essa modulação temporal visa evitar impactos financeiros inesperados para o estado de Sergipe; insegurança jurídica para as empresas do setor; ruptura de relações contratuais já estabelecidas; e necessidade de revisão de arrecadações passadas
Contexto federativo brasileiro
Por fim, a decisão insere-se num contexto mais amplo de conflitos federativos sobre recursos naturais. O STF já havia enfrentado questão similar ao declarar inconstitucionais dispositivos da Lei estadual 5.139/2007 do Rio de Janeiro, que disciplinou o acompanhamento e a fiscalização das compensações petrolíferas, demonstrando a necessidade de uniformização nacional.
Esses precedentes fortalecem o entendimento de que, embora os estados tenham direito constitucional às compensações financeiras, a regulamentação dos aspectos centrais dessa arrecadação compete privativamente à União.
Precedente para outros estados
A decisão do STF na ADI 6228 representa um marco na definição das competências federativas sobre compensações petrolíferas. Ao distinguir claramente entre obrigações principais e acessórias, a Corte estabeleceu limites precisos que preservam a unidade regulatória nacional sem anular completamente a participação estadual na fiscalização.
Por isso, a decisão estabelece também precedente relevante para estados produtores como Rio de Janeiro, Espírito Santo, Bahia e Rio Grande do Norte, que também possuem legislações estaduais sobre o tema. A própria Abep ajuizou ações similares questionando leis de Alagoas e Rio de Janeiro, sugerindo que novas decisões do STF devem seguir o mesmo padrão.
Para o setor petrolífero, a decisão traz maior segurança jurídica ao clarificar quais normas podem ser editadas por cada ente federativo. Para os estados produtores, embora represente uma limitação de competências regulatórias, preserva instrumentos importantes de controle e transparência sobre as atividades desenvolvidas em seus territórios.